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PENSANTES

Outros pensamentos, ideias e palavras que nos fazem pensar...

domingo, março 27, 2005

Numa Palhota


Por JOAQUIM FIDALGO
Quarta-feira, 22 de Dezembro de 2004

Era uma vez, há muitos anos, um menino...

Não. Hoje a história não é assim.

Para começar, não "era uma vez", pois "era muitas vezes". Mas já lá vamos.

Depois, não foi há muitos anos. Foi mesmo este ano, há meses. Ainda está a
ser.

Quanto ao menino, não é um menino; é uma menina. O que até nem parece
muito
mal... Já era tempo de as histórias mais bonitas não serem sempre de
meninos. E não se chama Jesus; chama-se, digamos, A. E não é um bebezinho
de pele branquinha, daquela alvura de neve de que falam as nossas canções,
não, é uma bebezinha de pele negra. O que até nem parece também muito
mal... Já era tempo de as histórias mais bonitas não serem sempre de
brancos como nós.

Quanto à mãe, a coisa não é menos diferente: nem virgem, nem imaculada,
nem
"senhora exemplar"... É uma mulher de apenas 16 anos, mãe solteira, a bem
dizer uma mãe adolescente, mas mulher, sim. Vivendo da prostituição, que
mais não conseguiu arranjar.

Pai, nem vê-lo. Desapareceu. Fugiu depois de ter ajudado a conceber a
menina no ventre da quase menina mãe - ou seja, a menina não tem pai,
nunca
teve, alguma vez terá?...

E de cabaninhas ou estábulos também estamos conversados, isto já não é
como
antigamente, o tal "há muitos anos", hoje ninguém empresta uma cabana a
ninguém. Quer uma palhota?, sim senhor, a palhota custa 500 euros, é
caro?,
não, não é caro por uma casa, não é caro para mim, para ti, mas custa os
olhos da cara à mãe da A., quantas horas e dias e meses teria de
prostituir-se para juntar os 500 euros da palhota, imaginamos lá nós,
europeus, o ordenado mínimo de um moçambicano são 40 euros, sim, 40 euros.
Uma fortuna, 500 euros. E no entanto, para nós, por uma casa...

Vamos então à história.

Era uma vez, este ano, uma menina chamada A., filha de mãe solteira de 16
anos, nascida e criada em Nacala, Moçambique. A pequena A., com um ano e
oito meses, só pesava três quilos e meio, sofria de tuberculose e
subnutrição, a mãe prostituía-se para sobreviver, o pai não havia. E as
meninas foram recolhidas ambas num centro materno-infantil da Obra
Missionária Jesus e Maria, e a menina foi tratada, e por essa altura uns
portugueses passaram por lá e conheceram o caso, e dispuseram-se a ajudar,
e falaram a amigos, e arranjaram 500 euros para comprar uma palhota para
aquela família. Família estranha, bizarra? Talvez não. Uma família das de
hoje...

Agora, regressados, estes portugueses continuam a ajudar A. todos os meses
com algum dinheiro. E se calhar no próximo dia 25 ela já vai estar, com a
mãe, as duas bem juntinhas e bem quentinhas, deitadas não numas palhinhas
mas dormindo numa palhota, sua, delas, simples mas delas, humilde mas
delas, pobrezinha mas delas.

A isto apetece chamar Natal. Natal estranho, bizarro? Talvez não. Um Natal
dos de hoje...

(Não "era uma vez", como disse no início; "era muitas vezes", porque há
muitas meninas e meninos como A., à espera de palhota, de Natal; a madre
Berenice explica a quem quiser, o "e-mail" é 'omjmnacala@teledata.mz').

Sent By: Bruno Martinho

sábado, março 19, 2005

Decadentes mas felizes

Publicado 16 Dezembro 2004
Luis Nazaré
Decadentes mas felizes
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Fustigado pela concorrência internacional, falho de recursos humanos,
desmotivado e mal dirigido, o tecido económico nacional dá sinais evidentes
de exaustão.

1. Na economia, tal como na política, as aparências não iludem. Por mais
que queiramos ser positivos, por muito que mantenhamos a fé neste
rectângulo poético, não há por onde escamotear a realidade. A economia
portuguesa está à beira de uma grave crise estrutural. Fustigado pela
concorrência internacional, falho de recursos humanos, desmotivado e mal
dirigido, o tecido económico nacional dá sinais evidentes de exaustão.

Com a fileira marítima destroçada, a fileira da terra malbaratada, a
indústria transformadora exangue, a construção civil deprimida e a inovação
banida do léxico empresarial, não há crença regeneradora que resista. Ou
demonstramos ser capazes de um extraordinário assomo de clarividência e
ousadia, coisa rara na história lusitana, ou pouco mais nos resta do que um
país de sol e serviços.

Alguns argumentam que esse nem seria um mau destino, se tivéssemos juízo na
oferta turística e revelássemos, nos serviços, qualidade idêntica à
evidenciada no sector financeiro e nas telecomunicações. Acontece que
Portugal não é o Luxemburgo nem as Seychelles. Infelizmente, não somos uma
plataforma de negócios internacionais nem nascem bananeiras nos nossos
quintais. Dez milhões de bocas não se sustentam de intangíveis.

2. Perante a perspectiva mais que provável de empobrecimento do tecido
económico português, o que pode a governação fazer para sacudir a inércia
geral, de que folga pró-activa dispõe perante a realidade crua do mercado e
das insuficiências da nossa sociedade civil? Muito e muito pouco. Tal como
Olegário Benquerença, ao não validar aquele golo do Benfica contra o Porto,
foi o verdadeiro causador (embora involuntário) do despedimento do doutor
Santana Lopes, o acerto na pequena margem de manobra que resta à política
pode fazer toda a diferença.

Em primeiro lugar, restituir a confiança aos agentes económicos, reforçando
as apostas sérias de longo prazo (educação e qualificação dos recursos
humanos) e atacando de frente os custos de contexto, onde a burocracia
estatal ocupa lugar de destaque. Depois, saber dinamizar, como um enzima
activo, plataformas de valorização industrial onde podemos ambicionar a uma
presença competitiva nos mercados internacionais. Por fim, ousar empreender
projectos infra-estruturantes de largo fôlego. A rede TGV, o novo aeroporto
de Lisboa (onde quer que se situe) e a terceira travessia do mar da Palha
são desígnios incontornáveis para um país que ainda não supriu as
desvantagens viárias do passado. Resta saber se o curso da economia real
permitirá tal ambição e se a conflitualidade da política não fará capotar a
vontade (?) da sociedade civil.

3. Mas nem tudo são más notícias. Aos olhos insuspeitos da Intelligence
Unit da revista The Economist, Portugal será em 2005 o 19º país com melhor
qualidade de vida entre os 111 do estudo, logo atrás do Japão.
Surpreendentemente, levamos a melhor sobre a França (25º do ranking), a
Alemanha (26º), o Reino Unido (29º), a Áustria (20º), a Bélgica (24º), a
Coreia do Sul (30º) e todos os dragões e tigres da Ásia e da Europa de
Leste, à excepção de Singapura (11º). A Grécia, nossa eterna rival na luta
pela cauda, fica-se por um honroso 22º lugar.

Ao contrário do que é habitual, este trabalho cuidou de fixar os critérios
de qualidade de vida a partir de uma aproximação bottom-up. Inquiriu
cidadãos de 74 países sobre os factores determinantes do bem-estar e
concluiu que o lugar geométrico da felicidade se encontra no cruzamento de
factores tão diversos como o rendimento (o mais importante, como seria de
esperar), a saúde, a liberdade, o desemprego, a vida familiar, o clima, a
situação política, a segurança ou a igualdade de sexos. O primeiro
classificado, a Irlanda, conjuga alguns dos melhores ingredientes: PIB per
capita elevado, alta taxa de emprego, estabilidade política e valores
tradicionais. Entre os dez primeiros, quatro são países escandinavos
(Noruega, Suécia, Islândia e Dinamarca), dois são placas giratórias da
finança mundial (Suiça e Luxemburgo), outros dois são mediterrânicos
(Itália e Espanha) e um (a Austrália) é o país dos territórios e das
oportunidades sem fim.

Será possível avaliar a qualidade de vida em termos matemáticos? Foi a
pergunta que, nos idos de 1986, o jornal The Times colocou perante as
primeiras tentativas de aferição sistemática do bem-estar entre os súbditos
de Sua Majestade. O que dizer agora deste novo índice e do lisonjeiro lugar
de Portugal? Duas palavras - muito obrigado. É com indicadores destes que
vamos combatendo a depressão colectiva.

Ordem Diz Que Aborto Raramente Se Justifica por Razoes Psiquicas, Publico 041215

Ordem Diz Que Aborto Raramente Se Justifica por Razões Psíquicas
Por CATARINA GOMES
Quarta-feira, 15 de Dezembro de 2004

Não há nenhuma situação em que a gravidez seja causa directa e inequívoca
"de lesão grave e duradoura para a saúde psíquica" - logo o aborto por
razões psíquicas previsto na lei portuguesa raramente se justifica. É este
o conteúdo do primeiro parecer oficial produzido sobre o assunto pela Ordem
dos Médicos (OM), que vai ser aprovado pelo conselho executivo deste órgão
até ao final do mês.

A lei portuguesa permite o aborto no caso de violação da mulher,
malformação do feto e se "se mostrar indicada para evitar perigo de morte
ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a saúde física ou
psíquica da mulher grávida", desde que seja feita nas primeiras 12 semanas
de gestação, lê-se no artigo 142 do Código Penal.

O que os dez médicos do colégio de especialidade de psiquiatria vêm fazer é
clarificar a aplicação da lei quanto à questão da saúde psíquica, esclarece
o bastonário, Germano de Sousa, que pediu o documento há dois meses.

E o parecer, que foi suscitado por um questionário de uma jornalista do
"Diário de Notícias", é claro: "Não se estabeleceu nenhuma relação causal,
directa e inequívoca entre o estado de gravidez e qualquer grave e
duradoura lesão para a saúde psíquica que permita fundamentar a interrupção
da gravidez em critérios médicos absolutos", adianta ao PÚBLICO o
bastonário.

Ou seja, esclarece, não há nenhuma situação provada em que se possa
estabelecer uma relação entre gravidez indesejada e mal psíquico, salvo "em
situações isoladas que devem obedecer a um exame pericial caso a caso". O
parecer não define qualquer doença ou forma de sofrimento que, por si só,
se enquadre na definição prevista na lei, acrescenta Germano de Sousa.

Clarificando o que se entende por "grave e duradoura lesão para a saúde
psíquica", os médicos que redigem o documento excluem abortos por
"ocorrências banais da vida" e "estados patológicos não graves,
transitórios e/ou tratáveis", enuncia o bastonário. Refere-se, por exemplo,
o caso da depressão, que, por ser tratável na maioria dos casos, não é
considerado motivo lícito para um aborto nos termos da lei.

Os psiquiatras consideram mesmo que não é a gravidez que é passível de
causar danos psíquicos; a existirem, estes podem mesmo ser agravados pela
própria interrupção da gravidez, explicita o bastonário, que afirma
identificar-se com o parecer que é assinado pela presidente do colégio de
psiquiatria, Maria Luísa Figueira.

"A interrupção voluntária da gravidez como forma de preservação da saúde
psíquica não só pode não garantir a resolução do problema como até
induzi-lo ou agravá-lo", refere o bastonário.

Tendo em conta este pressuposto, qualquer intervenção que implique risco
para a mulher só deve ser considerada "depois de esgotadas outras
intervenções terapêuticas alternativas e com melhor relação risco/
benefício" na preservação da saúde psíquica, continua, dando como exemplo a
terapia medicamentosa ou psicoterapêutica.

No parecer, que será tornado público aos clínicos portugueses através do
boletim da OM, conclui-se que a aplicação da lei nos serviços públicos tem
sido correcta e "corresponde às práticas seguidas pelos médicos
portugueses", informa o bastonário.

Em 2003 houve 37 em 137 interrupções de gravidez por doença materna
reportadas pelos serviços de saúde que foram devidas a doença mental; em
2001 tinham sido 21 num total de 126, lê-se num relatório da Direcção-Geral
da Saúde (DGS).

Críticas a Espanha

As patologias físicas justificaram os restantes abortos na categoria de
doença materna, com as patologias infecciosas no topo, seguidas das
cancerígenas e crónicas graves. Os episódios de internamento por aborto dão
conta de um total de 699 interrupções legais realizadas em 2003, informa a
DGS.

No parecer, os médicos especialistas comparam também o caso português com o
espanhol. Na legislação deste país, prevêem-se as mesmas situações que em
Portugal - nomeadamente para "evitar um grave perigo para a vida ou a saúde
física ou psíquica da grávida" - mas a esmagadora maioria dos casos (97 por
cento) é justificada por motivos ligados à saúde materna, sendo invocados
sobretudo motivos psicológicos.

A grande diferença, consideram os clínicos portugueses, está no sistema
privado espanhol, onde é feita a maioria das interrupções: 97,5 por cento
do total de 80 mil abortos ali realizados anualmente são-no numa rede de
clínicas privadas só dedicadas à prática de aborto, referencia Germano de
Sousa.

Segundo o bastonário, os especialistas da Ordem apontam o caso espanhol
como "uma prática negligente e abusiva da lei", afirmando que em Espanha
é-se "mais permissivo, mas tal acontece mais por motivos sociais"; em
Portugal os "critérios são científicos".

Beneficiários do Rendimento Social de Inserção Recebem em Média 38 Euros/pessoa


PUBLICO - Beneficiários do Rendimento Social de Inserção Recebem em Média
Por ANDREIA SANCHES
Sexta-feira, 17 de Dezembro de 2004

pouco mais de um euro por dia

O valor médio da prestação de Rendimento Social de Inserção (RSI) por
família era em Outubro de 279,20 euros mensais, o que corresponde a 37,94
euros por pessoa.

Pela primeira vez desde que há ano e meio o RSI entrou em vigor,
substituindo o modelo socialista de Rendimento Mínimo Garantido (RMG), as
estatísticas publicadas no "site" da Segurança Social incluem números sobre
o valor médio da prestação que está a ser processada.

Em Dezembro de 2002, um relatório de execução do RMG dava conta de que a
prestação média por cada família era de 150 euros - menos 129 do que
actualmente. O montante "por beneficiário" atingia 51. Ou seja: mais 13 do
que agora.

Desde o dia 2 deste mês que o PÚBLICO tenta procurar uma explicação, junto
do Ministério da Segurança Social, da Família e da Criança para esta
diminuição da prestação "per capita". Mas sobre este ponto não foi
facultada qualquer resposta.

Havia, em Outubro passado, 21.238 famílias abrangidas por esta medida
destinada a atenuar situações de grave carência económica, num total de
57.948 pessoas. Quase metade dos beneficiários eram ou menores de 18 anos
ou maiores de 65.

Os valores médios da prestação de RSI por família oscilam bastante conforme
a zona do país. Por exemplo, nos centros distritais com mais famílias
abrangidas, como o Porto (2379 famílias) e Santarém (2290), a prestação
média é, no primeiro caso, de 369,98 euros e no segundo de 179.

Os Açores, segundos da lista de centro distritais que abrangem maior número
de famílias beneficiárias (1852), e Lisboa (1641 famílias) apresentam
médias de prestação de 278,67 e 406,67 euros, respectivamente.

Na Madeira, a prestação média por família atinge os 848,30 euros (bem longe
da média nacional). Mas, paradoxalmente, a Segurança Social faz saber que
nenhuma família com processamento de RSI em Outubro de 2004 nesta região
autónoma recebe mais do que 600 euros de prestação.

Sobre esta contradição a tutela limitou-se a explicar, por escrito, que "a
Região Autónoma da Madeira apresenta 65,2 por cento de famílias sem
qualquer rendimento, o que consequentemente implica a atribuição valor de
RSI na sua totalidade". Quanto menores forem os rendimentos das famílias,
conclui, "maior será o valor da prestação de RSI a atribuir ao agregado".

Fórmula de cálculo

O RSI está em vigor desde Junho de 2003, tendo substituído o modelo de RMG.
A fórmula de cálculo para apurar o valor a atribuir a cada caso (que, de
resto, tem sido criticada, por deixar de fora pessoas que não têm fontes de
receita no momento em que concorrem a esta ajuda) tem em conta os
rendimentos dos agregados nos últimos 12 meses. Outros factores, como o
número de menores, a existência de uma gravidez ou de crianças com menos de
um ano, influenciam o valor.

Os números não permitem ver qual a dimensão média das família com
processamento de RSI em Outubro. Mas mostram outras características dos
agregados. Por exemplo: mais de um terço (6971) não tinham quaisquer
rendimentos; 23 por cento tinham rendimentos que oscilavam entre os 50 e os
200 euros mensais e 31 por cento declararam viver com entre 200 e 400 euros
por mês. Os restantes (11,7 por cento) apresentavam rendimentos superiores,
havendo 316 que declararam mesmo possuir mais de 700 euros mensais.

A confirmar o que há muito é uma tendência identificada, as estatísticas
mostram que há mais homens do que mulheres a beneficiar de RSI e que os
grupos com mais peso são as famílias nucleares com filhos e os isolados.

O 'Case Study' Buttiglione II e I, Mario Pinto, Publico 041122 (Texto Longo)

Continuando o meu artigo anterior, nada melhor do que alguns excertos da
audição de Rocco Buttiglione na comissão das liberdades civis do Parlamento
Europeu. A que acrescentarei apenas breves notas minhas.

1. Deputada Buitenweg (Verde, Holandesa). "Senhor Buttiglione: Algumas das
suas opiniões estão em directa contradição com a lei europeia. Por exemplo:
a discriminação com base na orientação sexual é interdita e o Senhor disse
que a homossexualidade é um pecado e é sinal de desordem moral. Gostaria de
saber directamente de si, agora, como é que nós poderemos esperar que o
Senhor combata por esse direito e se poderia dar-nos um exemplo de como
espera alcançar o seu objectivo."

Resposta de Buttiglione. "Posso recordar um filósofo, já antigo, mas talvez
não completamente esquecido, de Könisberg - um tal Emmanuel Kant -, que fez
uma clara distinção entre moralidade e direito. Muitas coisas, que podem
ser consideradas imorais, não devem ser proibidas. Quando fazemos política,
não renunciamos ao direito de ter convicções e eu posso pensar que a
homossexualidade é um pecado e isso não ter efeito na política, o que só
sucederia se eu dissesse que a homossexualidade é um crime. Da mesma
maneira, a Senhora é livre de pensar que eu sou um pecador em muitas coisas
da vida, e isso não tem nenhum efeito nas nossas relações como cidadãos.

"Direi por isso que considero uma abordagem inadequada do problema
pretender que toda a gente concorde em questões de moralidade.

"Nós podemos construir uma comunidade de cidadãos mesmo que em algumas
questões de moralidade tenhamos opiniões diferentes. A questão é, isso sim,
da não discriminação. O Estado não tem o direito de meter o nariz nessas
questões de moralidade e ninguém pode ser discriminado com base na sua
orientação sexual ou qualquer orientação de género. É isto o que está na
Carta dos Direitos Fundamentais, na Constituição, e eu tenho defendido esta
Constituição."

2. Deputado Cashman (socialista, Inglês): "não creio que o devamos julgar
pelas suas palavras, mas antes pelas suas acções. Disse-nos hoje que o
Estado não tem o direito de se envolver nas questões que têm a ver com a
orientação sexual. Como explica então que tenha apresentado, na Convenção
para o Futuro da Europa, uma proposta que visava eliminar da Constituição a
referência à orientação sexual no combate às discriminações?"

Resposta de Buttiglione: "Quando definimos o princípio da não
discriminação, pretendíamos que ele fosse aplicado não apenas a um número
limitado de casos que estavam enumerados. O princípio é universal,
expansivo. Deve ser aplicado em muitas e variadas áreas e não creio que
constituísse um reforço para a sua aplicação referir em especial o caso dos
homossexuais. Mas, em qualquer circunstância, esse debate está encerrado.
Não tenho dúvidas de que se o Senhor Deputado Cashman a tivesse escrito
sozinho, teríamos uma Constituição ou uma Carta dos Direitos Fundamentais
diferente. E se fosse eu a fazê-lo, teríamos também uma Carta e uma
Constituição diferentes. Mas esta é a Constituição que escrevemos em
conjunto e esta é a Constituição que nos liga, sob a qual estou disposto a
viver e esta é a Carta dos Direitos que eu quero defender."

3. Mais alguns exemplos do tipo de inquirição-insinuação que alguns
deputados fizeram a Buttiglione.

Deputado Alvaro: "...como é que as suas estreitas relações com os Estados
Unidos e o Vaticano vão afectar as suas decisões?" Buttiglione respondeu:
"Eu sou amigo dos Estados Unidos, mas não sou americano. Tenho divergências
com os americanos como todos os europeus têm tido. Acredito que a Europa
tem de viver numa comunidade transatlântica com dois pilares, sendo a
Europa um deles. Temos de estar preparados para trabalhar com os
americanos, como parceiros iguais, sobre o futuro do mundo, com
responsabilidades conjuntas pelo futuro da humanidade. ...não é segredo que
eu sou católico, mas isso não tem a ver com o Vaticano mas com a minha fé,
com as minhas pessoais convicções; e penso que se pode ser um bom católico
e um bom europeu ao mesmo tempo ... como Adenauer, De Gasperi, Schuman ou
Helmut Kohl."

E ao deputado In't Veld, reafirmou: "sou contra a discriminação. Penso que
todas as pessoas devem ter os mesmos direitos, homossexuais, heterossexuais
ou o que forem. Estou comprometido a defender os direitos de todos os
cidadãos europeus, incluindo o direito de não discriminação. O Senhor quer
que eu seja pro-activo, mas eu não sei o que entende por isso. Penso que os
direitos dos homossexuais devem ser defendidos na mesma base dos demais
cidadãos europeus. Se houver específicos problemas para os homossexuais,
estou pronto a considerá-los. Se por exemplo me disser que há uma especial
violência contra os homossexuais, então eu estou pronto a considerar a
hipótese de legislação específica em ordem a protegê-los dessa violência e
a dar melhores garantias do direito à igualdade".

Já depois do tempo da audição, a uma insinuação de Cashman, Buttiglione
teve de responder: "Tenho de negar, enfaticamente. Já disse claramente que
esta é a Carta dos Direitos Fundamentais que fizemos conjuntamente, que eu
defendo e que eu estou determinado a defender. No que respeita às razões
pelas quais eu fiz propostas de alteração, já expliquei essas razões. O
Senhor pode estar, ou não, de acordo com as minhas razões, mas penso que a
minha resposta foi clara".

4. No Parlamento Europeu, não havia memória de que as opiniões pessoais dos
seus membros pudessem ser um obstáculo para alcançar postos de relevo. Há
bem pouco tempo, deu-se o caso do socialista espanhol Borrell, que, tendo
declarado que "as práticas sexuais dos católicos lhe pareciam aberrantes",
opinião assaz grosseira e intolerável, nem por isso foi vetado por qualquer
voz ou qualquer partido na sua candidatura à presidência do Parlamento.

O conhecido "Wall Street Journal" classificou a oposição do Parlamento
Europeu a Buttiglione como "a Inquisição Laica da Europa". Este veto violou
a não discriminação política por razões de ideologia, consciência e
crenças, que está garantida na Convenção Europeia dos Direitos Humanos. É
por isso que o caso Buttiglione é um sério "case study".

5. Mais ou menos ao mesmo tempo que sucede isto em Bruxelas, com o sentido
ideológico que tem, aconteceu em Roma a Conferência Mundial das Mulheres
Parlamentares para a protecção das crianças e dos jovens, com representação
de mais de cem países, incluindo Portugal. Aí foi aprovada por unanimidade
esta conclusão: "definir e defender uma visão da família como unidade
fundamental para o desenvolvimento equilibrado dos filhos". Está aqui a
básica ideia de que é a geração dos filhos e o desenvolvimento equilibrado
das crianças e jovens que pede uma política pública de definição e de
defesa da família.

ADENDA: Creio que há que ponderar acerca do voto que merece a ratificação
do Tratado que aprova a Constituição Europeia. Não tanto por motivos de
arquitectura política e perda de soberania. Mas sobretudo por este
autoritarismo cultural-pós-modernista que tem penetrado em várias decisões
do Parlamento Europeu (este não é o primeiro episódio). Pelo crescendo de
clara inimizade contra o cristianismo e as religiões (visível em certas
potências dominantes). Pela Carta dos Direitos Fundamentais, que é sonsa e
cheia de viezes ideológicos. Já votei muitas vezes pelo mal menor. Desta
vez, o mal maior nem o consigo ver. A Europa precisa de deter esta
tendência demagógica obcecada pela simples fractura de todos os padrões e
referências, que é verdadeiramente suicida. Professor universitário
Dada a importância deste caso que já parece ter caído no esquecimento
nacional, junto, para quem não leu, o primeiro artigo, publicado no dia 8
de Novembro

O "Case Study" Buttiglione (1)
Por MÁRIO PINTO
Segunda-feira, 08 de Novembro de 2004

Não é para mim uma questão muito importante que A ou B, por serem
católicos, sejam ou não comissários na União Europeia. Devo dizer com toda
a franqueza que, ao longo da minha vida, já tenho tido grandes desgostos
com políticos católicos e justas alegrias com políticos não católicos.

Porém, o caso Buttiglione não foi apenas um caso político parlamentar, como
alguns querem fazer passar. Porque esteve irrecusavelmente em causa saber
se um "católico conservador e amigo do Papa" (por sinal Papa já distinguido
pela defesa dos direitos humanos) é digno de confiança para comissário
encarregado da defesa dos direitos fundamentais e do princípio da não
discriminação, independentemente das suas declarações em comissões
parlamentares e do seu programa político.

De nada serviu que Buttiglione, acusado de ter dito que a homossexualidade
é um pecado, tivesse respondido que uma coisa é a moral, outra coisa a
legalidade; e que dizer que a homossexualidade é (moralmente) pecado não
significa dizer que seja (juridicamente) ilícito. De nada serviu declarar
que defende o princípio da não discriminação. De nada serviu explicar que o
seu conceito de casamento não afecta o exercício das suas funções. De nada
serviu que tivesse afirmado expressamente que sempre tem defendido a
Constituição europeia, que a considerava apoiada nos direitos humanos de
acordo com uma evolução que vinha já da filosofia grega, passando pelo
cristianismo e pelo iluminismo até ao ponto actual. E que estava por isso
disposto a cumprir e fazer cumprir essa Constituição. Nada! Eu tive o
escrúpulo de ler na íntegra as actas das comissões, que quem quiser pode
obter com facilidade.

2. Bem sei que pessoas ilustres, por quem tenho consideração, vieram entre
nós declarar em público que este episódio devia resumir-se a um acto
parlamentar de confiança política - portanto, questão de maioria
parlamentar, questão política. E que outros acharam que Buttiglione poderia
ter omitido as formulações correspondentes às suas convicções pessoais -
portanto, questão de fórmulas.

Respondo que estes argumentos não convencem. Pois se as convicções pessoais
expressas e as formulações utilizadas foram decisivas para a decisão da
Comissão, como é que agora nós as poderemos deixar de lado para apreciarmos
a decisão da Comissão? Buttiglione foi directamente interrogado acerca das
suas opiniões sobre o casamento e sobre o princípio da não discriminação. E
ainda sobre declarações suas anteriores. Ele respondeu (e aliás com
superior qualidade, em minha opinião) a tudo o que lhe perguntaram, e não
acrescentou nada para além do que lhe perguntaram. Com base no que
respondeu, nunca poderia ser considerado indigno de confiança.

3. Em vez de as análises dos debates se aterem aos textos oficiais das
comissões, fez-se correr uma campanha orquestrada internacionalmente. Na
Internet, o conhecido motor de busca que usei, o Google, deu-me há dias
95.800 "sites" para Rocco Buttiglione. Abri-os até 170. Desisti. Eram
esmagadoramente uma acusação insultuosa contra o famigerado comissário
"católico conservador e amigo do Papa". Hoje, quarta-feira, o número de
"sites" do Google já é de 130.000. E aparecem muitas opiniões indignadas
pela exclusão de Buttiglione. Mas agora... Inês é morta!

Até o prof. Prado Coelho, por quem tenho estima e apreço, embora com
grandes divergências, tratou assim o prof. Buttiglione na sua coluna no
PÚBLICO: "Sabem certamente quem é Buttiglione? Trata-se de uma curiosa
personagem, ao que parece muito próxima do Vaticano. E ao mesmo tempo de um
professor universitário." Para quem é doutor nas ciências da linguagem,
excelente escritor e crítico literário, vê-se logo que Prado Coelho
desenhou assim uma imagem caricatural e quase ridícula de Buttiglione. Com
efeito, é injusto apoucá-lo como uma "curiosa personagem". Ser "amigo do
Papa" é irrelevante para o caso. E dizer que é... "ao mesmo tempo
professor"... é um tanto malicioso e presta-se a muitas ambiguidades.

Buttiglione é um professor digno, culto e poliglota excepcional. Exprime-se
com notável qualidade de saber e de elegância. Mostrou excelente
conhecimento dos "dossiers" e das questões europeias. Pede meças aos nossos
deputados. Respondeu directa e imediatamente aos que o interrogaram falando
em várias línguas, conforme a sua nacionalidade: italiano, francês, inglês
e alemão. Exprimir-se assim numa ocasião de interrogatório difícil, e não
em conversa informal, é digno de nota. Não foi essa capacidade posta a
crédito do comissário Vitorino? E de Barroso? Então por que é regateada a
Buttiglione?

4. O escândalo contra Buttiglione é feito de ignorância e facciosismo. Ele
mostrou que sabe muito bem separar as suas convicções pessoais da autonomia
e legitimidade da esfera pública. Quando Buttiglione explicou que a palavra
latina matrimónio tem na origem um sentido de protecção da maternidade,
"matrimonium", isso é verdade e só o não sabe quem é ignorante. Ele (e eu
também) pensa que esse sentido é essencial (embora não exclusivo) e deve
ainda hoje valer, no novo contexto da cultura e da civilização actuais.
Porque um simples contrato de vida em comum entre duas pessoas homossexuais
é outra coisa que não matrimónio, porque não tem a função natural de gerar
e criar filhos. Esse contrato pode merecer protecção em nome da liberdade e
legítimos interesses reconhecidos às partes; mas não tem a mesma natureza e
relevância de interesse público, porque não tem exactamente os mesmos fins
- faltam-lhe os fins naturais da procriação. O que sobretudo dá importância
maior à instituição do casamento heterossexual e monogâmico, e exige
estabilidade e exclusividade, é a geração e a criação dos filhos - embora
esta não seja a única finalidade do matrimónio. Ao longo dos séculos, a
sociedade sempre esteve altamente preocupada com a protecção da maternidade
e da criação das crianças: esse interesse é comum de toda a sociedade e tem
carácter público; não é apenas interesse das partes casadas. Mais: são
impostos aos cônjuges (sujeitos do mesmo jugo) direitos e deveres
fundamentais em nome dos nascituros e crianças, e servindo o interesse da
sociedade pela reprodução e criação de novos seres humanos, interesse que
vai muito para além do que seria necessário se as partes fossem apenas
sócios de uma sociedade de vida comum e relação sexual recíproca, sem
função reprodutiva. Se a sociedade se organizasse agora na base do
casamento homossexual, só duraria a presente geração. Isso não é evidente?
E se se organizar na base duma plena igualdade de casamentos, quando só os
heterossexuais podem gerar, há uma evidente assimetria igualando coisas com
fins desiguais - e não basta que os homossexuais queiram adoptar crianças,
porque se querem adoptar crianças estas só podem ser os filhos dos
heterossexuais. Isto pelo menos enquanto se não separar a geração da
relação heterossexual. Se um dia a geração vier a ser questão de
laboratório, então a coisa muda, e será seguramente dramático. Entretanto,
como Buttiglione bem frisou, a definição do que é casamento é da
competência dos Estados nacionais, e não da União Europeia; e em 22 dos 25
Estados membros só o casamento heterossexual é reconhecido.

Outro dia vi na televisão uma notável reportagem de uma gentil senhora
americana, bonita, saudável e muito harmoniosa de corpo (qualidades que a
reportagem expressamente enunciou), que vendia por alto preço os seus
óvulos para reprodução de filhos comprados por outros casais. Pagavam-lhe
muito caro - dizia ela. E parecia muito contente da vida. Não foi porém
muito esclarecedora, e até se lhe toldou o semblante visivelmente, quando
lhe perguntaram se nunca pensava na quantidade de bebés que eram seus
filhos biológicos e que ela não conhecia. Chegada aqui, faltou-lhe a
alegria com que até ali tinha falado.

5. Já vou longo e não esgotei o assunto. Prometo continuar, até porque não
acabei a resposta para que o prof. Prado Coelho me desafiou.

Professor da Universidade Católica

O povo sem futuro, JCdasNeves, 041129

A Europa está em vias de extinção. Esta afirmação não é uma acusação,
profecia ou aviso. É simples extrapolação das tendêncisa recentes. Não é
para já nem será súbito, mas no remanso do nosso quotidiano seria bom
saber que estamos envolvidos numa linha de decadência. Perante os
bizantinos decretos da Comissão e os palavrosos debates do Parlamento
Europeu, talvez fosse conveniente conhecer este «pequeno» detalhe.

A primeira dimensão da extinção é quantitativa: a população europeia está
em queda absoluta. Num mundo em crescimento, esta perda constitui uma
força decisiva. Nas previsões da ONU (State of World Population 2004,
UNFPA), constata-se que os 25 países que constituem a actual União
Europeia (UE25) vão perder mais de 23 milhões de pessoas até 2050.
Portugal perde um milhão, mais que a média. Como o globo no mesmo período
aumentará mais de 2500 milhões de pessoas, o peso demográfico da Europa
cairá acentuadamente.

Actualmente, a UE25 representa 7,1% da população do mundo e descerá para
4,8% a meio do século. Isto tem consequências sérias face aos vizinhos. Os
Estados Unidos, ganhando 112 milhões de pessoas no período, mas caindo
ligeiramente em percentagem de 4,7 para 4,6%, vão, apesar disso,
ultrapassar em importância os 15 países da recente União Europeia (UE15),
reduzidos dos 6% do mundo hoje a 4,1% em 2050. O mundo árabe, que
representa agora só 4,9%, irá ultrapassar não só a UE15 mas também a UE25,
atingindo 7,1% do planeta daqui a 46 anos.

O problema é elementar: os europeus desistiram de ter filhos. Isso, só por
si, condena-os à irrelevância. Para mais, porque a reduzida dinâmica de
população que ainda temos vem sobretudo dos imigrantes.

Assim, esta Europa será, não só muito mais pequena, mas crescentemente
árabe, africana e oriental. Os europeus do futuro serão decididamente
estranhos à tradicional cultura europeia. Goste-se ou não, assim será.

O facto quantitativo é agravado pela confusão ideológica e estratégica de
que padecem os europeus. A União parece ser a única zona do mundo que não
sabe o que quer, ou que quer coisas inconsistentes.

Enquanto os outros blocos lutam por afirmação civilizacional,
desenvolvimento produtivo e influência político-militar, a Europa está
apostada em debates conceptuais e abstractos que, mesmo se resolvidos, só
confirmarão o crepúsculo.

A cultura europeia é a única que renegou as suas origens civilizacionais e
se esgota em controvérsias axiais. O que excita os europeus é discutir a
liberdade do aborto, droga e tabaco, a redução do horário de trabalho, a
defesa do prazer livre e «famílias alternativas», a ambiguidade nas
alianças geostratégicas. Não admira que daí resulte a estagnação, o
desnorte, a corrupção. A desorientação é a causa da referida queda
demográfica e cultural. Num mundo que será em breve muito diferente, com
China, Índia e Islão em florescente influência político-económica, não
valerá a pena perder tempo com a velha, gorda e pequena Europa, cuja
relevância apela a hegemonias extintas.

Estes sintomas, já os vimos em tantas civilizações e impérios que não são
difíceis de diagnosticar. Quem envereda por esta estrada encontra no termo
a triste vacuidade. O processo ainda será longo, atribulado, doloroso.
Mas, se os europeus não mudarem drasticamente o rumo, serão extintos. O
Papa explicou a razão em 1996: «Um povo que mata os seus filhos não tem
futuro.»

naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt

Sent By: [Povo]

Fw: Ironia do destino

A ironia destino ditou que uma das maiores figuras que lutou no pós
25 de Abril de 74,contra o comunismo(que o diga o senhor Alvaro
Cunhal)venha agora admitir(de forma camuflada)que o neoliberalismo
(que ele deu uma mão ao negar a outra mão ao comunismo)está a
destruir a sociedade portuguesa e a pôr em causa o próprio sistem
democrático.Mas há mais,ao dizer que teria havido já um golpe de
estado não fosse estarmos na União Europeia(novamente o mesmo senhor
Mário Soares esteve em grande na adesão de Portugal a este
clube,tendo mesmo assinado no «livro do destino»)está evidente que
estamos todos de mãos atadas e entregues ao tal destino europeu e
neoliberal,em que para o qual não há alternativa segundo os advogados
do capitalismo neoliberal,que em portugal são os partidos
admnistradores(leia-se administradores dos interesses capitalistas)
do poder actual mais o partido socialista,sim o partido socialista!O
qual apoia a constituição europeia,a qual não é mais que uma
introdução para o Federalismo à americana,e que as elites politicas e
económicas europeias tanto procuram,subjugando povos e recursos
naturais.Que ironia!Bem vindos adentro do livro de Orwell(1984).Pois
meus amigos,aqui está mais uma ironia do destino(ou será da agenda
neoliberal?)no mesmo dia em que o senhor Soares dizia estas
palavras,saíu a entrevista ao senhor professor de Filosofia da
Universidade de Lyon III,Jean Claude Beaune,no DN,e em que dizia
entre outra coisas o seguinte:
"Não estou persuadido de que vivamos num mundo global.Temos redes que
nos permitem a comunicação entre diferentes pontos do globo,mas isso
não é globalização.Oque permanece mais universal é a guerra,e neste
momento há inúmeros exemplos disso.O século XX,à medida que a técnica
se desenvolveu,foi abominável nesse aspecto.Infelizmente isso ainda
não terminou.É necessário que o humanismo se repense,para uma
representação do homem positiva e fiel aos valores da
universalidade.O homem pode eliminar-se a si próprio e sobre isso sou
mais pessimista que optimista.
DN-Qual será a utopia para este século?
O que me pergunta é se há esperança para o homem de século
XXI.Gostava que houvesse.Se as utopias de século XIX eram
positivas,as do século XX foram negativas.Huxley e Orwell intuiram de
forma genial,a programação dos indivíduos e das sociedades.Basta
olhar à volta,estamos dentro do livro de Orwell(1984).Os actuais
poderes politicos fazem tudo para despolitizar as pessoas e desviar a
noção de democracia da sua verdadeira função.O excesso securitário
que nos propôem passa por aí."

From: "rick197020002000"

Histórias do Telemóvel?

Enviado por: Bruno Martinho

Histórias do Telemóvel? Por JOSÉ PACHECO PEREIRA Quinta-feira, 11 de
Novembro de 2004

A namorada - Onde estás?

O namorado da namorada - Estou aqui.

- Aqui aonde?

- Aqui... estou a estudar em casa.

- A estas horas, em casa? Mas que barulho é esse?

- A televisão.

- Parece o mar, estás-me a mentir. Põe lá a televisão mais alto, para eu
saber se estás em casa e não na praia.

- ...

*

O marido - Parabéns! Tenho um presente para ti...

A mulher - O que é ?

- Um telemóvel destes mais modernos.

- Que bom! O que é que ele faz?

- Tem tudo, tira fotografias, filma, tem GPS.

- O que é isso do GPS?

- Assim pode-se sempre saber onde uma pessoa está, ninguém se perde. Sei
sempre onde tu estás...

- Sabes o quê?

- Assim se te atrasares eu não fico preocupado, sei que foi o trânsito, ou
os miúdos.

- Não confias em mim?

- Confio. Sei que não me escondes nada. É por isso que te dou este
telemóvel.

- ...

*

O patrão - Então você já começou o arranjo do motor?

O empregado - Já. Já cá estou.

- Já chegou? É que você atrasa-se sempre. Veja lá...

- Esteja sossegado que já estou a trabalhar.

- Mostre-me lá a peça que está a compor.

- Mostro como?

- Então, o seu telemóvel do serviço mostra imagens, mostre lá a peça para
eu a ver no meu.

- ...

*

Todas estas histórias são de mentiras, as mais comuns das mentiras. Mas
seria errado vê-las apenas como histórias de mentiras - são também
histórias dos efeitos de um pequeno instrumento que os portugueses
compraram em massa nos últimos cinco anos e que entrou de repente no seu
quotidiano e na sua sociabilidade.

O telemóvel é a peça singular de tecnologia que mais transformou a vida
social dos portugueses nos últimos dez anos. Pode-se pensar que foi o
computador, mas não foi. O computador acrescenta uma nova forma de trabalho
a quem tem as literacias necessárias para o usar. É verdade que também
acrescentou alguns comportamentos sociais novos, como os que se manifestam
no correio electrónico, nos "chats" e nos blogues, que revelam
virtualidades sociais até então inexploradas - os "chats", com o seu jogo
virtual de "personae" e os blogues como nova forma de diário intimista ou
ficcional, ou como locais de debate e expressão não editados, acrescentados
ao espaço público. O correio electrónico, por sua vez, fez regressar à
escrita muito do que tinha passado para a voz. Apesar de todas estas formas
de utilização do computador e da Internet estarem a mudar o conjunto da
realidade, não têm para já o impacto social que têm tido os telemóveis num
espaço de tempo muito pequeno.

O telemóvel, em conjunto com outras alterações associadas à comunicação
pelo telefone, como a generalização dos gravadores de chamadas, os SMS, e
as tecnologias da nova geração, como os telefones com câmaras, vídeo e GPS,
está a ter um impacto profundo nos comportamentos sociais de uma parte
significativa da população portuguesa. Este impacto é desigual em termos de
classe social, idades e literacias, mas até por via dessas diferenças
revela o seu efeito de mudança. São os mais novos, adolescentes em
particular, a ponta-de-lança destas mudanças. Foram eles que revolucionaram
o SMS, dando origem a uma linguagem "telefónica" original e que mais
rapidamente usam as novas incorporações de funcionalidades nos telemóveis.
São também os primeiros que são cobaias dos seus efeitos.

Os efeitos na sociabilidade são vários. Os gravadores de chamadas tornaram
socialmente inaceitável não se responder às mensagens enviadas ou gravadas.
Passou a ser quase impossível estar incomunicável, a não ser que não se
tenha telefone. A incomunicabilidade, total ou parcialmente desejada,
tornou-se uma nova forma de má educação.

Com o telemóvel, as pessoas estão sempre presentes, ou espera-se que
estejam sempre presentes. Existe um efeito de "presencialidade" em tempo
real contínuo. O número de chamadas diárias entre as pessoas cresceu
exponencialmente, aumentando a promiscuidade dos quotidianos. Muitas das
mentiras referidas acima são o resultado dessa dificuldade de vivência do
quotidiano sem promiscuidade, sem intrusão.

A aceitação sem reservas das novas funcionalidades, fotografias, filmes,
transmissão directa de imagens e vídeo, localizadores activos ou passivos,
colocam sérios limites à privacidade e à identidade de uma vida própria.
Como muitas vezes acontece, essa intrusão começa por ser desejável, até
incentivada, e acaba a prazo por se tornar num incómodo ou numa agressão.

Claro que, como em quase todas as coisas, tudo se pode aceitar ou recusar,
mas estas tecnologias vão colocar novos problemas em sociedades em que cada
vez mais a "confiança" é testada num quotidiano espectacular, observado em
tempo real ou quase real, sem fugas para espaços que não tenham sobre eles
olhares, sem silêncios, nem discrições, obcecadas com uma falsa
transparência que impede a espessura e o sentido. Já não é o Big Brother a
olhar para nós, somos todos a olhar para todos. É a "aldeia global",
mesquinha, pegajosa, que sabe tudo e espia tudo, toda contente com os
aparelhos mágicos que tudo transmitem e tudo recebem.

Historiador

A Pata (Sublime)

Por FERNANDO ILHARCO fmilharco@hotmail.com
Segunda-feira, 20 de Setembro de 2004

No rodopiar do tempo sobre o mesmo, as novas guerras e a vertigem da
barbárie, as sinistras imagens de amoralidade e de ausência de humanidade
em Beslan foram um afogar colectivo, nosso, na náusea da impotência, da
vergonha e da ignorância. De uma impotência que irrompe na consciência de
quem tudo vê e nada pode, de uma vergonha pelo que os homens, o homem, pode
fazer, fez e faz, e de uma ignorância, vasta, que cultivamos nas
desconhecidas implicações e consequências de um certo tipo de progresso, de
tecnologia e de cultura cujos últimos gritos todos os dias festejamos. No
seu niilismo irónico, ecoam as interrogações de Nietzsche sobre o
conhecimento: "Aquele pequena parte de estupidez por causa da qual um dia
toda a nossa espécie desaparecerá?..." A náusea é funda, porque fundos são
também os contornos do modo humano de ser.

Qualquer cultura humana sobrevive, se for capaz de manter, de desenvolver e
de expandir um determinado número de tabus, sobre os quais assentam as suas
possibilidades comportamentais enquanto comunidade. Quando essa comunidade
é global, porque comunica e por isso age globalmente, essa cultura também
ela global deve igualmente assentar em tabus globais. Em Beslan como em
muitos outros locais, tanto hoje como ontem, é gritante o desafio fundo,
não apenas político, económico e social, mas sobretudo cultural,
civilizacional, humano numa palavra. O projecto humano que somos faz-se
todos os dias no trabalho, na fé, no amor e na certeza de que a dignidade
dos homens, de todos os seres que vivem com o seu próprio destino nas mãos
se encontra no perdão, no diálogo e na promessa.

Durante milénios e milénios os homens foram abandonando aquilo que lhes era
mais essencial e os unia aos outros seres vivos: o estar vivo para estar
vivo, a sobrevivência simples. O salto ontológico do homem - e se somos
descendentes do macaco ou não, é aqui irrelevante - dá-se quando o tipo de
ser que tinha a possibilidade de ser humano repara no mundo, repara que
reparou e reparando cuida, protege, ajuda, guarda, ensina, educa. Ao
erguer-se física e espiritualmente, deixando a selvajaria para um outro
mundo, o dos animais, marcado pelo agora, pela força, pelo instinto e pela
ausência - pelo menos, tendemos a acreditar nisso... - de auto-observação,
o homem abriu para si o mistério da vida, do ser e o futuro como o tempo
primordial. Esta dádiva de dignidade e de amor, o ser humano como ser
modelado por Deus, abriu-se a todos os homens, quando esta Terra recebeu
Jesus.

O primeiro livro a ser impresso na era de Gutenberg, conforme à
classificação da história da humanidade proposta por McLuhan, o mais citado
patrono da revolução da Internet, a Bíblia, é hoje o livro mais lido em
todo o mundo. Em boa parte e em rigor, o que fez do homem o homem
contemporâneo, o ser que repara que reparou, que pensa usando a razão, cuja
história e textura são descritas na Bíblia, foi a própria escrita, as
cartas, as missivas, os livros. Foi sobretudo a alfabetização do mundo:
saber ler e saber escrever é saber pensar de uma certa forma. Quando essa
forma tem a primazia numa dada civilização, a nossa, o pensamento
sequencial, analítico e lógico tende a predominar e a estabelecer os
códigos através e no âmbito dos quais surge a realidade. Foi este quadro
cultural que, ainda conforme a McLuhan, proporcionou, primeiro, o
aparecimento da própria Grécia antiga, da matemática, das artes e das
letras, e, mais tarde com a invenção da imprensa, enfatizando a
sequencialidade, a linearidade e a repetição, o surgir da revolução
industrial. O cruzamento da matemática com a revolução industrial é a
origem da moderna ciência exacta e por isso do mundo tecnológico
contemporâneo. É precisamente o mundo tecnológico, esta era electrónica
assente na instantaneidade, na abundância e na imaginação, que, desde a
invenção do telégrafo, em 1850, tem estado a minar a cultura da escrita e
dos livros, com particular intensidade nesta nossa era da Internet.

Na televisão, ou seja, por todas as televisões do mundo, e na Internet,
isto é, em qualquer secretária ou telemóvel ligado à rede das redes, vimos
e sentimos a tragédia de Beslan a acontecer. E que vimos entre tanto de
impensável? Vimos o horror, mas vimo-lo na televisão. Em imagens captadas
nos confins da Rússia, difundidas em tempo real para todo o mundo pelas
redes globais de comunicação, experimentámos a barbárie enquanto ela
acontecia, longe fisicamente mas emocionalmente muito mais perto do que nos
tempos em que só dali a dias ou meses líamos as notícias de outros tantos e
incontáveis crimes, terrores e guerras.

A tecnologia electrónica, a televisão e a Internet, envolvendo-nos
intensamente, porque sensorial e estruturalmente é um apelo à nossa
participação, protagonizou numa história de horror a destruição de valores
assentes numa civilização de escrita, de imprensa e de livros. No directo
electrónico a distância é esmagada pelo instante, o contexto desaparece
perante o inimaginável, a lógica e a ponderação cedem à velocidade e ao
acaso, a sequência capitula perante o caos, a racionalidade é vencida pela
emoção, e a escrita e a fala caem perante o silêncio e os gritos. Numa
escola, onde se aprende a ler e a escrever e assim, em boa medida, se
aprende a ser humano no mundo dos seres humanos, a besta mostrou-se de
novo. Um dos assassinos pisava um livro, entretanto armadilhado. Mas na
civilização humana há algo de errado no facto de um homem pisar um livro.
Na nossa cultura um homem não pisa livros, nem de resto um animal. Um cão
em cima de um livro não o está a pisar, porque para ele um livro não é um
livro, um receptor da civilização humana, mas antes é um simples objecto.
Um animal só pisaria um livro, se este estivesse debaixo da pata e esta
deliberada, intencional e conscientemente em cima do livro, pisando. Em
1996 nos Balcãs, um chefe de uma das milícias do terror daquelas terras
comentou orgulhoso a um repórter estrangeiro: "Nunca li um livro!"

Numa escola cheia de crianças, de seres humanos, cada um deles com o futuro
nas mãos e toda a humanidade na alma, em directo na televisão, a bota
pisava um livro. Com alguma distância, no estranho esfumar de tudo que o
tempo sempre vai proporcionando, hoje, quando nos passam nos olhos as
imagens e no espírito o significado de Beslan, por vezes, lembramo-nos de
Orwell em "1984": "Se queres ter uma ideia do futuro, imagina uma bota a
pisar a face de um homem - para sempre."

Qual o sentido da vida?

Tudo o que vive não vive sozinho, nem pra si mesmo.
"Dizem que a vida é curta, mas não é verdade. A vida é longa para quem
consegue viver pequenas felicidades. E essa tal felicidade anda por aí,
disfarçada, como uma criança traquina brincando de esconde-esconde.
Infelizmente às vezes não percebemos isso e passamos nossa existência
colecionando nãos: a viagem que não fizemos, o presente que não demos, a
festa que não fomos, o amor que não vivemos, o perfume que não sentimos. A
vida é mais emocionante quando se é actor e não espectador; quando se é
piloto e não passageiro, pássaro e não paisagem, cavaleiro e não montaria.
E como ela é feita de instantes, não pode nem deve ser medida em anos ou
meses, mas em minutos e segundos. Esta mensagem é um tributo ao tempo.
Tanto àquele tempo que você soube aproveitar no passado quanto àquele tempo
que você não vai desperdiçar no futuro. Porque a vida é agora..."
"Não tenha medo do futuro, apenas lute e se esforce ao máximo para que ele
seja do jeito que você sempre desejou".

"A morte não é a maior perda da vida.
A maior perda da vida é o que morre dentro de nós enquanto vivemos."
(Norman Cuisins)

OCDE diz que Portugal tem de reforçar apoio aos pais que trabalham

Relatório hoje apresentado mostra que sete em cada dez casais trabalham a
tempo inteiro
OCDE diz que Portugal tem de reforçar apoio aos pais que trabalham

Bárbara Wong
PÚBLICO 28/10/2004
Em Portugal, duas em cada três mulheres trabalham e, destas, a grande
maioria (85 por
cento) fá-lo a tempo inteiro. Entre os casais, sete em cada dez estão
integrados no
mercado laboral. A OCDE está preocupada e recomenda que o Governo reforce
as políticas de
apoio às famílias. O estudo "Babies and Bosses" traça o retrato de
Portugal, Nova
Zelândia e Suíça.

Embora neste último país a percentagem de mulheres trabalhadoras seja mais
elevada do que
em Portugal, é cá que elas trabalham a tempo inteiro. Quer as suíças quer
as
neozelandesas optam pelo trabalho a tempo parcial, sobretudo depois de
serem mães e nos
primeiros anos de vida dos filhos. Contudo, poucas portuguesas podem dar-se
ao luxo de
fazer o mesmo, já que o seu vencimento é essencial para o equilíbrio do
orçamento
familiar - 70 por cento dos casais portugueses trabalham a tempo inteiro.

Segundo diz o relatório, na Suíça apenas um em cada oito casais trabalha.
Não é de
estranhar, já que se trata de um dos países mais ricos da OCDE, por isso,
um dos membros
do casal pode suportar as despesas familiares.

As mulheres suíças escolhem trabalhar em "part-time", assim como as
neozelandesas, mas
por cá ainda não é muito comum; além disso, é vulgarmente mal pago,
acrescenta o estudo.
Nos três países, as mulheres recebem menos do que os maridos. Mas as
portuguesas estão
mais bem posicionadas: recebem menos 20 por cento do que os cônjuges. Na
Suíça e na Nova
Zelândia as mulheres têm salários inferiores a 40 e a 60 por cento,
respectivamente, em
relação aos dos maridos.

Depois de os filhos nascerem, os pais nem sempre têm onde os deixar.
"Babies and Bosses"
defende que os Estados apostem na criação de soluções para que os pais
possam regressar
ao trabalho. Por cá, a grande dificuldade com que os pais se confrontam é o
custo deste
serviço.

A OCDE aponta que, em Portugal, o apoio às famílias se fica por 1,1 por
cento do PIB. E,
embora existam algumas medidas, muitas famílias prescindem delas para não
perderem uma
fatia do ordenado. Portanto, as medidas sociais têm pouco impacto,
sobretudo nas famílias
com rendimentos mais baixos.

A OCDE recomenda que Portugal invista em mais e melhores cuidados para as
crianças,
durante e após o período escolar. As famílias devem ter oportunidade de
escolher qual o
serviço mais adequado para o seu caso e, se quiserem, um dos membros do
casal escolher
ficar em casa, sem que tal prejudique o orçamento familiar.

Por isso, o relatório defende que o Governo subsidie directamente os pais,
para
escolherem a melhor opção para os filhos, em vez de apoiar as instituições.
Quando o
Estado opta pela segunda hipótese, como tem vindo a fazer, a mensagem que
passa é que os
pais devem pôr os meninos na creche ou no jardim de infância.

Apesar da política de apoio às famílias ir no sentido de equilíbrio entre
os géneros, são
as mães que continuem a beneficiar mais dessas iniciativas. Em Portugal, em
2003, apenas
entre 30 a 40 por cento dos pais gozaram os 15 dias de licença de parto a
que têm direito
por lei.

O estudo sugere que o Estado apoie também as empresas, para que estas
possam propor
horários mais flexíveis aos pais, de modo a que ambos os progenitores
possam gozar o
crescimento dos filhos. Estado e empresas devem ainda promover o trabalho a
tempo
parcial, dando-lhe dignidade, de maneira a que mais pessoas possam optar
por ele, sem pôr
em risco o orçamento familiar.

O "Babies and Bosses" é um estudo do departamento de políticas sociais da
OCDE e vai no
seu terceiro volume.

God Bless America! Por MIGUEL SOUSA TAVARES

Sexta-feira, 05 de Novembro de 2004

Quem me lê regularmente sabe que desde há muito, creio
que mesmo desde antes do 11 de Setembro de 2001, fui
antevendo a reeleição de Bush. Na verdade, só tive
algumas ligeiras dúvidas na própria terça-feira,
quando os números inabituais de afluência às urnas nos
Estados Unidos pareciam indiciar uma recuperação de
última hora do campo democrata - se, como o previam os
analistas, novos eleitores significassem mais
eleitores democratas. Mas os analistas estavam
errados: os novos eleitores votaram, afinal,
maioritariamente nos republicanos, confirmando a
tendência nacional a que Nixon chamou "a maioria
silenciosa" que, quando fala, fala à direita.

O que se passou terça-feira nos Estados Unidos foi a
consumação de um lento mas seguro deslizar da América
para longe dos valores liberais que durante mais de
duzentos anos foram responsáveis pela construção do
mito da "land of the free". Desde que visitei pela
primeira vez os Estados Unidos, em 1976, numa longa
viagem de automóvel e "roulotte", costa a costa,
muitas coisas mudaram no coração desse país que então
me fascinou e seduziu. Mesmo nos estados do Sul, hoje,
como tradicionalmente, bastião dos valores
conservadores, respirava-se uma atmosfera de espaço,
de liberdade e de respeito pela identidade e diferença
alheia, que reflectiam afinal um outro valor
intrínseco ao "cowboy country" e com o qual o Sul foi
desbravado e construído: o direito de cada um escolher
o seu caminho e a sua forma de estar e de viver, não
incomodando os outros e sem que os outros o
incomodassem. Julgo que o que mudou essencialmente,
desde então, foi isso mesmo: uma maioria, dita "moral"
e reclamando-se de uma legitimidade concedida por
Deus, decretou um catálogo de pretensas virtudes a que
chamam "valores" e que, aos poucos, foram impondo a
toda a América e pretendendo impor a todo o mundo.

Essa revolução subterrânea da direita americana foi
transformando os Estados Unidos num Estado
confessional, exigindo do governo federal ou dos
governos estaduais um papel de vigilante da moral e
das virtudes que têm como boas e únicas aceitáveis.
Lembro-me de, perante a ironia condescendente, começar
a escrever sobre isto a propósito da perseguição aos
fumadores - que, sob a capa de um caso de saúde
pública, era, de facto e como o declarou sem
subterfúgios uma comissão de inquérito do Congresso,
"a moral issue". O problema não estava no facto de o
maior produtor e vendedor de tabaco no mundo
pretender, contraditoriamente, perseguir o consumo de
tabaco. O problema principal era e é o carácter de
cruzada da virtude contra o vício de que essa política
se revestiu. Seguiu-se a cruzada igualmente moralista
contra o "sexual arressment", uma e outra campanha
conseguindo a perversão cívica de converter multidões
de cidadãos banais em vigilantes da "moralidade"
alheia. Uma nação de gente tolerante e liberal tem
vindo lentamente a evoluir para uma nação de fiéis
intransigentes, comandados por pregadores evangélicos.
Não deixa de ser preocupante constatar que este é o
sentido inverso em que tem evoluído, por exemplo, a
sociedade civil do Irão dos "ayatholahs" - não há
muito tempo atrás, no tempo de Jimmy Carter, visto
como o país cujos valores e fundamentação religiosa do
poder mais contrariavam os valores da democracia
americana. Hoje, em 2004, as multidões que assistiam
aos comícios de George Bush não gritavam "bravo!" nem
"viva!", mas sim "amen" e "aleluia". Num momento de
maior entusiasmo, o próprio Bush sentiu-se autorizado
a declarar que às vezes "falava com Deus". Não admira
que o Papa e Buttiglione, assim como os dirigentes
teocráticos do Irão e a Casa de Saud, fossem seus
apoiantes.

Com o "affaire" Lewinsky (para o qual os próprios
democratas se deixaram arrastar sem medir as
consequências da gravidade do que, antes de mais,
estava em jogo - o direito à intimidade da vida
pessoal de cada um, seja Presidente ou emigrante
clandestino), a "maioria moral" dos Estados Unidos
sentiu-se já suficientemente forte e incontestada para
ditar as suas virtudes e leis ao próprio Presidente,
castigando-o e humilhando-o aos olhos do mundo
inteiro, com o autêntico apedrejamento em praça
pública que foi a colocação na Internet dos mais
íntimos detalhes da sua relação sexual com a jovem
Lewinsky.

Em 2000, essa "maioria moral" - que, aritmeticamente,
estava quase a sê-lo mas ainda não o era - teve de
recorrer à batota na contagem de votos e à colaboração
da maioria de extrema-direita do Supremo Tribunal para
conseguir eleger o seu Presidente. Em quatro anos de
mandato, o seu Presidente revelou-se o mais
incompetente de toda a história americana. Pôs a
economia num caos, perdeu centenas de milhares de
empregos, desfez o sistema de segurança social e
ameaça transformar o direito ao ensino e à saúde num
privilégio de ricos, meteu os Estados Unidos numa
guerra e ocupação do país errado, sem saída à vista e
apenas com benefício para os amigos e família do
Presidente envolvidos nos negócio de armas e de
petróleo e, como o provou eloquentemente a provocadora
aparição de Bin Laden quatro dias antes da eleição,
não conseguiu qualquer progresso visível na luta
contra o terrorismo, muito embora, para o tentar,
tenha subvertido a lei internacional e a própria
Constituição americana, em Guantanamo, nas prisões do
Iraque, e mesmo em território americano, graças ao
regime de suspensão de direitos civis instituído pelo
"Patriot Act". E, sobre tudo isto, que são os
resultados práticos da sua administração, confirmou
ainda a sua imensa ignorância, o seu desnorte e
paralisia em momentos de crise como o 11 de Setembro,
a sua incapacidade de ter qualquer ideia que vá além
da extensão de uma frase que caiba numa linha de
teleponto, e a sua falta de escrúpulos em mentir olhos
nos olhos, forjar provas, deturpar informações,
censurar ou falsificar relatórios científicos, sempre
e quando isso convier aos seus "valores". E foi por
esses "valores" e nada mais que a crescente sociedade
civil americana, que faz deles profissão de fé, o
reelegeu - agora sem precisar sequer de fazer batota.
Porque, hoje sim, eles são a maioria que vai
desenhando a nova face da América, outrora liberal, e
refazendo um mapa político que remete preocupantemente
para o mapa anterior à Guerra da Secessão.

Ao contrário do que jubilosamente se apressou a dizer
essa jovem secretária de Estado do PP, que era para
ser da Defesa e acabou por ser da Cultura, a vitória
de Bush não implica que "a esquerda americana e
europeia tenham de rever os seus valores". Porque quem
tem valores, quem verdadeiramente tem valores, não os
revê por contingência ou conveniência eleitoral - e,
ao menos nisso, Bush foi mais coerente do que nossa
apressada secretária. Acontece, sim, é que os valores
hoje dominantes na América não são os nossos - não
apenas os da esquerda europeia, mas os de uma maioria
substancial, sólida e antiga, de europeus que são
tributários da história de Atenas e não da de Esparta.
Perceba-o ou não a senhora, na Europa em que nos
revemos, não discriminamos os homossexuais, não
colocamos o aborto na clandestinidade, não defendemos
que os ricos paguem os mesmos impostos que os pobres,
não defendemos a liquidação da função social do
Estado, não misturamos a política com Deus, não
aceitamos o sistema penal de Guantanamo, não
defendemos a pena de morte e, além do mais, não
invocamos nenhum mandato moral ou divino para impor
estes valores aos outros.

Em 1976, entre mim e o homem que comigo bebia um café
numa bomba de gasolina junto a Flaggstaff, no Arizona,
havia a crença comum de que a liberdade não era apenas
aquela de que cada um de nós gozava, mas também a de
que os outros, quaisquer outros, podiam gozar: a minha
liberdade só existe enquanto existir a liberdade do
outro. Hoje, seguramente que entre mim e o americano
anónimo de Flaggstaff existem muito poucos valores
comuns. Ele mudou os dele, eu não faço tenções de
mudar os meus. Apenas, e embora seja parte ilegítima
na matéria, anseio pelo dia em que a América volte a
ser a pátria da liberdade. Porque tenho saudades de
Flaggstaff