/* Commented Backslash Hack hides rule from IE5-Mac \*/

PENSANTES

Outros pensamentos, ideias e palavras que nos fazem pensar...

segunda-feira, novembro 26, 2018

# Sobre Saramago e Deus

Padre Anselmo Borges

O Centro de Literatura Portuguesa da Universidade de Coimbra e a
Câmara Municipal de Coimbra organizaram nos passados dias 8, 9 e 10 de
Outubro, no Convento de São Francisco de Coimbra, um Congresso
Internacional: "José Saramago: 20 anos com o Prémio Nobel". Carlos
Reis e Ana Peixinho pediram-me uma intervenção sobre Saramago e Deus.
O que aí fica é uma breve síntese da minha fala nesse Congresso.

1. Numa entrevista dada a João Céu e Silva, uma das últimas, se não a
última, Saramago referiu-se-me com admiração por ter lido e gostado do
seu livro Caim. "Até fiquei surpreendido quando ouvi um teólogo - uma
coisa é um teólogo e outra um padre -, Anselmo Borges, dizer que tinha
gostado do livro." Mas na net também se diz, e é verdade, que fui
crítico por causa de alguma unilateralidade com que Saramago leu a
Bíblia. Assim, a minha intervenção quer ser essencialmente um
esclarecimento sobre essa minha dupla visão.



2. Saramago foi à Academia Sueca dizer, no dia 7 de Dezembro de 1998,
logo na primeira frase: "O homem mais sábio que conheci em toda a
minha vida não sabia ler nem escrever."

Quando me expresso sobre o diálogo inter-religioso, digo sempre, com
escândalo de alguns, que desse diálogo também fazem parte os ateus, os
ateus que sabem o que isso quer dizer - os crentes também só o são
verdadeiramente se souberem o que isso quer dizer. Fazem parte, porque
são eles que, estando de fora, mais facilmente vêem as superstições,
as inumanidades e até as barbaridades que tantas vezes infectam as
religiões. Assim, à maneira de Saramago, também digo: foi com dois
ateus que aprendi do melhor da Teologia: Ernst Bloch e o nosso
homenageado, José Saramago. Mais com Bloch, porque, dada a situação da
Teologia na universidade alemã - em todas as universidades, há duas
faculdades de Teologia, uma católica e outra protestante -, ele tinha
profundos conhecimentos bíblicos. Neste enquadramento, refiro três
pontos.

2. 1. Também sou ateu em relação ao deus denunciado por eles. Porque é
isso que se deve ser, se se quiser manter a dignidade humana face a um
deus brutal, irresponsável, ciumento, mesquinho, tirânico, cruel,
sádico, sanguinário... Neste sentido, estou de acordo com Ernst Bloch,
quando escreveu que "só um bom ateu pode ser um bom cristão, só um bom
cristão pode ser um bom ateu".

Previno que a boa exegese mostra que nem sempre está no texto bíblico
aquilo que o puseram a dizer e que passou à tradição. Por exemplo, o
caso de Isaac, cujo significado é o contrário daquilo que
frequentemente se ensinou: ao aparecer o cordeiro, Deus está a
proclamar que não quer o sacrifício de seres humanos. Mas, de facto,
muitas vezes foi a outra tradição que passou, aquela a que se referiu
o prestigiado biblista católico do século XX Norbert Lohfink quando
constatou que a Bíblia judaica é "um dos livros mais cheios de sangue
da literatura mundial".

Como aceitar um deus que castigasse a humanidade inteira por causa de
os primeiros pais terem comido uma maçã? De qualquer modo, no quadro
da evolução, quem foram os primeiros e como é que poderiam ter um acto
de liberdade tal que arrastasse consigo todos os males do mundo,
incluindo a morte? Que sentido pode ter um pecado original herdado, de
tal modo que todas as crianças seriam geradas em pecado, do qual só o
baptismo pode libertar?

E Jesus não foi enviado por Deus para ser morto e com a sua morte
pagar a dívida infinita da humanidade para com Deus e Deus aplacar a
sua ira e reconciliar-se com a humanidade. Que pai decente imporia
isso ao seu filho querido, condenando-o à morte?

Caim, segundo Saramago, vai, castigado, pelo mundo, não sem perguntar
a deus porque é que o não impediu de matar o irmão, Abel. Deus é,
pois, co-responsável por esse acto...

Trata-se de um deus arbitrário, irresponsável, ciumento, pior do que nós.

Ficamos arrepiados, quando lemos que Deus exigiu de Abraão que matasse
o seu filho Isaac. O próprio filósofo Sören Kierkegaard, que propunha
Abraão como modelo da fé incondicional, viu o horror da situação e diz
que o miúdo voltou para casa e deixou de acreditar em deus e Abraão
nunca disse uma palavra a Sara sobre o acontecido.

Sodoma e Gomorra. Lá também havia crianças inocentes. E deus não se
lembrou delas?

Babel. Deus, em vez de castigar os homens pelo seu feito, deveria
honrar-se com o êxito das suas criaturas. É ciumento, invejoso.

Também no Dilúvio, deus não teve compaixão para com os inocentes. A
mesma acusação vale para a situação dos filhos primogénitos dos
egípcios.

Ah, e, aquando do nascimento de Jesus, houve a matança dos inocentes
e José não se preocupou. No regresso do Egipto nem sequer perguntou às
mães pela sua dor...

Do pior: as guerras religiosas, pois é deus contra deus, e as vítimas
são os homens e as mulheres e as crianças... Como é possível deus
mandar matar, haver guerras em nome de deus?

2. 2. Ernst Bloch foi mais longe. Sabendo Teologia e exegese,
distinguiu muito bem duas camadas na Bíblia: a do deus dos senhores,
do deus dominador, tirânico, imoral e opressor e a do Deus da
libertação e dignificação de todos. Em conexão, viu também dois tipos
de Igreja: a Igreja dos senhores, a Igreja do poder inquisitorial,
opressora, e a Igreja dos pobres, do bem, da justiça, da paz. Para
Bloch, há um duplo fio condutor na Bíblia: o sacerdotal, em que domina
o deus opressor, dos senhores, e o profético-messiânico-apocalíptico,
que anuncia o Reino de Deus, a herdar meta-religiosamente como Reino
do Homem: "Esta vida no horizonte do futuro veio ao mundo pela
Bíblia."

Jesus agiu como um homem bom, escreve Bloch, "algo que ainda não
tinha acontecido". Ele personifica a bondade e o amor e nele
exprime-se e realiza-se o melhor da esperança, o ainda não do que a
humanidade pode e deve ser. Ele não foi morto por Deus seu Pai, mas
pelo religião do Templo, a religião dos sacerdotes, que viviam da
exploração dos crentes.

O que devemos ao cristianismo? O próprio conceito de pessoa foi dentro
dos debates à volta da tentativa de compreender Jesus Cristo que
surgiu. Sabemos que nenhum homem pode ser "tratado como gado": foi
através de Jesus que o sabemos, porque nele, por ele e com ele, se
proclama a dignidade infinita de todo o ser humano.

Onde é que nasceu a Declaração dos Direitos Humanos? Foi na China? Na Arábia?

Jürgen Habermas, o filósofo mais influente da actualidade, agnóstico,
escreveu que a democracia não é senão a tradução para a política da
ideia cristã de que cada homem e cada mulher são filhos de Deus. Isso,
politicamente traduzido, dá um homem um voto, uma mulher um voto.

Não haveria o horror da pedofilia, também na Igreja, se se ouvisse a
maior proclamação de sempre feita por Jesus sobre a dignidade das
crianças: "Deixai vir a mim as criancinhas, porque delas é o Reino de
Deus", acrescentando logo a seguir: "Ai de quem escandalizar uma
criança: mais valia atar-lhe uma mó de moinho ao pescoço e ser lançado
ao mar."

Tudo isto para repetir o que disse logo no início da minha fala: estou
grato, muito grato, a Saramago, mas não aceito a sua afirmação: "A
história dos homens é a história dos seus desentendimentos com deus,
nem ele nos entende a nós, nem nós o entendemos a ele." A sua leitura
foi unilateral.

3. O que é ser ateu? Quando se diz que se é ateu, é preciso começar
por perguntar o que se entende por isso e concretamente em relação a
que Deus se é ateu.

Há dois modos de negação de Deus: a negação real e a negação determinada.

Por negação determinada entende-se a negação de um determinado deus,
de uma certa imagem de deus. Foi o que Saramago fez. Como podia ele ou
alguém intelectualmente honesto aceitar um deus cruel e sanguinário?
Daí a inversão da oração de Cristo na Cruz, no Evangelho segundo Jesus
Cristo. Onde no Evangelho se diz: "Pai, perdoa-lhes porque não sabem o
que fazem", lê-se em Saramago: "Homens, perdoai-lhe porque ele não
sabe o que fez."

A negação determinada não significa negação real. A pergunta é,
portanto, se Saramago negou realmente Deus ou se, pelo contrário, na
negação do deus arbitrário e sanguinário não está dialecticamente
presente o clamor pelo único Deus verdadeiro, o do amor incondicional,
o do Antimal.

De qualquer modo, segundo Saramago, "Deus é o silêncio do universo, e
o ser humano o grito que dá sentido a esse silêncio". "Esta definição
de Saramago é a mais bela que alguma vez li ou ouvi", escreveu o
teólogo Juan José Tamayo. "Essa definição está mais perto de um
místico do que de um ateu."

4. No final da minha intervenção, a viúva de Saramago, Pilar del Río,
aproximou-se, agradeceu e disse-me: sabe qual foi o contexto desse
diálogo entre o meu marido e Tamayo? Íamos os três pela Plaza de la
Giralda, em Sevilha, e os sinos da catedral repicaram, e Saramago: "Os
sinos tocam porque está um teólogo a passar." E Tamayo retorquiu:
"Não, os sinos repicam porque um ateu está prestes a converter-se ao
cristianismo."

Padre e professor de Filosofia
in DN 24.11.2018

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.

quarta-feira, novembro 21, 2018

# Reino Unido tem no governo ministra para a Solidão

https://observador.pt/especiais/como-os-britanicos-querem-acabar-com-a-solidao-um-ministro-e-um-programa-com-medicos-empresas-e-ate-carteiros/

Como os britânicos querem acabar com a solidão: um ministro e um
programa com médicos, empresas e até carteiros /premium

18 Novembro 2018 Mariana Béu

Em janeiro, o governo britânico nomeou o seu primeiro ministro da
solidão. Agora, lançou um plano para a combater. Estudos dizem que a
solidão pode ser tão mortal como fumar 15 cigarros por dia.

A sociedade toda para atacar um problema
O primeiro compromisso: estudar e medir o problema
Receitas médicas com atividades sociais, carteiros atentos a idosos e
mais apoio a cuidadores
Investimento em espaços comunitários, transportes e tecnologias digitais
Uma cultura que facilite a integração social
Portugal pode aprender com o exemplo britânico?

"Triste realidade da vida moderna". Do stress diário à falta de tempo
livre, das horas perdidas no trânsito à dependência da tecnologia, a
expressão podia encaixar em muitas coisas. Theresa May,
primeira-ministra britânica, usou-a para falar de solidão. E usou-a em
janeiro deste ano, no dia em que apresentou Tracey Crouch como
ministra da solidão. Sim, leu bem: uma pessoa destacada no Governo
especificamente para combater algo muitas vezes encarado como um
estado de alma natural, mas que, sabe-se hoje, levado ao extremo, pode
causar danos severos à saúde — e não apenas mental. No limite, a
solidão pode até acelerar a morte.

Crouch foi entretanto substituída por Mims Davies (demitiu-se em
desacordo com o Governo, a 1 de novembro, por causa de uma lei de
combate ao vício do jogo), mas com aquela nomeação — da primeira
ministra da solidão em todo o mundo –, May deu continuidade ao
trabalho da deputada trabalhista Jo Cox, assassinada em 2016 por um
militante de extrema direita enquanto fazia campanha contra o Brexit.
Jo Cox dedicou grande parte da sua vida ao estudo da solidão e chegou
mesmo a criar uma comissão para o tema, que, não só estudou o
fenómeno, como avançou com sugestões para o debelar — entre elas a
necessidade de designar um ministro para o tema, que fosse capaz de
gizar uma estratégia global de ataque ao que é já tratado como uma
epidemia dos tempos modernos.

Tracey Crouch tornou-se, em janeiro, a única ministra da solidão no
mundo. Em novembro, foi substituída por Mims Davies (Foto: GETTY
IMAGES)

No último relatório publicado pela comissão de Jo Cox, traça-se um
enquadramento negro da solidão no Reino Unido. Os dados mostram que
nove milhões de britânicos estão, ou de vez em quando, ou sempre sós,
que cerca de 200 mil idosos não tiveram uma conversa com um amigo ou
familiar em mais de um mês e que, para mais de 3,6 milhões de pessoas
com mais de 65 anos, a televisão é a principal forma de companhia. Mas
os dados vão mais longe e mostram que o problema é transversal e não
afeta apenas os idosos: 43% dos jovens que beneficiam dos serviços da
Action For Children (instituição de solidariedade infantil que ajuda
crianças e jovens negligenciados no Reino Unido) sente solidão, 50%
das pessoas com deficiência vão sentir-se sós em algum momento da vida
e 8 em cada 10 cuidadores também se sentem isolados, como resultado de
tratar de algum familiar próximo.

Os dados mostram que nove milhões de britânicos estão de vez em quando
ou sempre sós, que cerca de 200 mil idosos não tiveram uma conversa
com um amigo ou familiar em mais de um mês e que, para mais de 3,6
milhões de pessoas com mais de 65 anos, a televisão é a principal
forma de companhia.

Os efeitos da solidão podem ser devastadores para a saúde. A
investigadora norte-americana Julianne Holt-Lunstad (que é citada pela
comissão de Jo Cox) fez acender o alerta vermelho quando, em agosto de
2017, avançou com conclusões perturbadoras durante a 125.ª Convenção
Anual da Associação Americana de Psicologia. Disse a professora da
Universidade Brigham Young que a solidão pode ser tão mortal como
fumar 15 cigarros por dia. Holt-Lunstad conduziu duas investigações, a
primeira delas envolvendo 148 estudos em que participaram mais de 300
mil pessoas, e a segunda englobando 70 pesquisas e uma amostra de três
milhões de cidadãos. As conclusões mais surpreendentes? Aqui vão elas:
as pessoas com boas relações sociais têm menos 50% de risco de morte
prematura e a solidão é um fator de maior risco para a saúde do que a
obesidade.

Parece assustador, mas ainda há mais. É que não é apenas no plano
individual que o cenário se traça em tons negros. O relatório de Jo
Cox leva a questão mais longe e reforça as consequências do fenómeno
no plano social. A comissão que estuda o tema pegou na calculadora e
fez as contas (alarmantes): a solidão custa, atualmente, 2,8 mil
milhões de euros anuais às empresas britânicas — sobretudo devido à
quebra na produtividade que origina — e as comunidades desligadas
socialmente podem fazer com que a economia britânica saia prejudicada
em 36 mil milhões de euros por ano. Do lado da solução há mais um
dado: por cada libra investida (1,14 euros) a combater a solidão, a
sociedade poupa 1,26 libras (1,43 euros).

Segundo a investigação da norte-americana Julianne Holt-Lunstad, a
solidão pode ser tão mortal como fumar 15 cigarros por dia e é um
fator de maior risco para a saúde do que a obesidade.

A sociedade toda para atacar um problema

E foi do lado da solução que o governo britânico se posicionou. Nove
meses depois de nomear a ministra da solidão, publicou a estratégia de
combate ao problema. Um plano que assenta em dois pressupostos
enfatizados por Jo Cox: primeiro, que a solidão não escolhe idades nem
estratos sociais; depois, que é preciso um esforço conjunto de todos
os setores da sociedade para a combater.

Para o governo britânico, construir uma sociedade coesa do ponto de
vista social exige que todos sejam convocados a desempenhar o seu
papel. Desde logo o governo, através dos seus mais variados
departamentos e ministérios, que deve atuar como um catalisador dos
vários contributos, mas também as autoridades locais (responsáveis por
pensar em estratégias e espaços para enriquecer as suas comunidades),
os serviços públicos (que devem ter uma abordagem holística a pensar
no bem-estar das pessoas), as empresas(responsáveis por criar espaços
e momentos de convívio dentro e fora do local de trabalho, tanto para
os funcionários como para os clientes), o setor voluntário, os amigos,
famílias e grupos comunitários. O próprio governo explica que
colaborou com mais de 40 organizações para elaborar a sua estratégia —
desde instituições de caridade, empresas e instituições públicas.

Voltar ao índice

O primeiro compromisso: estudar e medir o problema

O pressuposto é simples: não é possível atuar sobre algo que não se
conhece bem. Por isso, o governo britânico assume, como preâmbulo de
medidas mais efetivas, o compromisso de recolher mais dados e medir a
solidão de forma mais consistente. Mas primeiro, há que definir bem o
conceito a ser tratado — até porque solidão não é o mesmo do que
isolamento. Confuso? Vai ver que não.

No documento que explica a estratégia de combate ao problema, o
governo assume a seguinte definição: "Solidão é um sentimento
subjetivo e indesejado de falta ou perda de companhia, que acontece
quando há uma incompatibilidade entre a quantidade e a qualidade de
relações sociais que temos e aquelas que queríamos ter". Trocado por
miúdos: se faz parte do grupo de pessoas que até gosta de estar
isolado e procura esse isolamento, não quer dizer que sofra de solidão
— para que isso acontecesse, tinha de desejar estar acompanhado e não
conseguir.

Para cumprir o compromisso de aprofundar o estudo do problema, o
executivo britânico recorreu ao seu instituto de estatísticas para
criar uma metodologia baseada em quatro perguntas: "Com que frequência
se sente sozinho?", "com que frequência sente falta de companhia?",
"com que frequência se sente excluído?" e "com que frequência se sente
isolado dos outros?". O governo vai incentivar a que também
instituições de solidariedade e outros fornecedores de serviços adotem
este pacote para estudar o fenómeno, comprometendo-se a organizar
mesas redondas, nos próximos meses, para discutir os resultados.

Voltar ao índice

Receitas médicas com atividades sociais, carteiros atentos a idosos e
mais apoio a cuidadores

Um dos eixos centrais do programa britânico prende-se com o papel
atribuído aos serviços públicos e às várias organizações — que, no
entender do governo, devem estar preparados para fazer a ligação entre
as pessoas que sofrem de solidão e a ajuda necessária para que possam
abandonar o problema.

Uma perspetiva que "constitui um ponto de viragem na forma como os
serviços públicos e organizações vão promover as relações sociais como
parte central do seu papel diário", pode ler-se no documento do
governo. "Vão desenvolver o conhecimento necessário para identificar a
solidão e pôr em ação mecanismos para ligar as pessoas ao apoio de que
precisam".

O conceito de prescrição social

Estamos habituados a recorrer aos médicos de família para sair de lá
com um papel onde está escrito o nome do medicamento que vai curar o
nosso mal de saúde. Mas, no caso da solidão, não é assim tão simples;
o problema não se cura com medicamentos — embora eles possam ser
prescritos em alguns casos, nomeadamente quando há outras patologias
associadas.

O governo britânico comprometeu-se a que, em 2023, todos os médicos de
família saibam direcionar os seus pacientes para focos de ajuda — que
podem incluir desde atividades variadas (como aulas de cozinha, grupos
de caminhadas ou cursos artísticos), como apoio para encontrar um
emprego ou até serviços de habitação.

Por isso mesmo, o governo britânico apoiou-se no conceito de
prescrição social. Parece um palavrão mas, na prática, quer dizer que
os vários serviços vão estar dotados do conhecimento necessário para
fazer um aconselhamento social.

Os médicos de família, por exemplo, vão desempenhar um papel fulcral
nesta estratégia. Os dados do governo britânico dão conta de que 76%
destes profissionais dizem receber nos seus consultórios 1 a 5
pacientes por dia com problemas de solidão. Para aproveitar essa
proximidade com o problema, o executivo comprometeu-se a que, em 2023,
todos os médicos de família saibam direcionar os seus pacientes para
focos de ajuda — que podem incluir desde atividades variadas (como
aulas de cozinha, grupos de caminhadas ou cursos artísticos), como
apoio para encontrar um emprego ou até serviços de habitação.

O governo acredita que, não só pode estar aqui uma das formas de
combater o problema, como pode ajudar a aliviar o peso sobre o serviço
nacional de saúde: o executivo estima que a prescrição social possa
reduzir em 28% as consultas de medicina geral e em 24% os atendimentos
em urgências.

Graças a uma parceria com o governo, os funcionários da Royal Mail vão
passar a conferir, durante as suas entregas, se as pessoas sofrem de
solidão (Foto: GETTY IMAGES)

O Reino Unido compromete-se, ainda, a incentivar outros agentes — como
farmacêuticos, assistentes sociais ou mesmo funcionários dos centros
de emprego — a fazer esta prescrição em 2019/20. E dá um exemplo
concreto de uma parceria alcançada com a empresa de correios Royal
Mail, e que vai acrescentar mais uma tarefa diária aos carteiros:
conferir, durante as suas entregas, se as pessoas mais velhas estão em
estado de solidão. Para o fazerem, vão recorrer a um conjunto de
perguntas pré-definidas, com as respostas a serem analisadas por
profissionais, quer do poder local, quer de associações de
voluntariado, para encaminhar os casos mais graves para a respetiva
ajuda. Os testes vão ser feitos em Liverpool, Whitby e New Malden.

Atuar em momentos de risco para a solidão

O governo britânico entende que existem certos eventos súbitos na vida
que podem desencadear um fenómeno de solidão. Seja a morte de um
parente próximo, a emigração, a mudança de casa ou de emprego, um
acidente que deixe a pessoa incapacitada, o nascimento de um filho ou
quando esse filho já é adulto e deixa a casa dos pais. Como tal,
entende que tem de atuar nesses momentos, ajudando as pessoas a
vencerem o problema, muitas vezes antes mesmo de ele se instalar.

Neste sentido, uma das medidas propostas é o reforço do serviço 'Tell
Us Once' — que permite que uma pessoa comunique uma morte apenas uma
vez e que essa informação seja partilhada com vários organismos
governamentais. O executivo acredita que este serviço pode ser
aplicado à solidão: se alguém reportar o óbito de alguém próximo, é
identificado o potencial de se instalar o problema e essa pessoa pode
ser reencaminhada para a ajuda necessária.

No Reino Unido, menos de metade dos adultos com deficiência está no
mercado de trabalho e o governo quer mudar esta realidade, encorajando
as empresas a ceder espaços de trabalho e dar formação a estas
pessoas.

Outro exemplo prende-se com o apoio dado aos cuidadores — aqueles que
tratam de pessoas incapacitadas. O governo britânico reservou uma
verba de mais de 500 mil euros para um programa totalmente direcionado
para estas pessoas, que possa criar espaços e serviços adaptados à sua
realidade, assim como investir em mais conhecimento sobre esta
realidade para desenvolver posteriores formas de ajuda.

Também as pessoas com deficiência não são esquecidas nesta estratégia
global de combate à solidão. O executivo inglês quer que os serviços
de saúde e as restantes organizações saibam fazer uma prescrição
social adequada a estes casos, não esquecendo, também, o papel do
emprego. No Reino Unido, menos de metade dos adultos com deficiência
está no mercado de trabalho e o governo quer mudar esta realidade,
encorajando as empresas a ceder espaços de trabalho e dar formação a
estas pessoas, fazendo com que se sintam menos excluídas. Em paralelo,
o governo vai criar cinco programas de teste até março de 2019, para
desenvolver oportunidades de voluntariado para pessoas com algum tipo
de incapacidade.

Voltar ao índice

Investimento em espaços comunitários, transportes e tecnologias digitais

Parece quase um lugar-comum, mas, para que as pessoas se relacionem, é
necessário que haja espaços onde esse encontro possa acontecer. É por
isso que um dos pontos centrais do programa britânico se centra no
reforço desses lugares vitais para o combate à solidão. O governo
inglês sublinha que, nos inquéritos feitos às pessoas para compreender
o fenómeno, havia três fatores recorrentes considerados fulcrais para
ultrapassar este mal: o acesso a espaços comunitários, uma boa rede de
transportes e um bom planeamento habitacional.

O reforço dos espaços de convívio é um dos pontos-chave da estratégia
britânica de combate à solidão (Foto: GETTY IMAGES)

Aproveitar os espaços existentes e criar novos

O Estado britânico vai dedicar uma verba de dois milhões de euros para
aumentar o número de espaços comunitários, seja criando novos (como
cafés, jardins ou espaços artísticos), ou reaproveitando os
existentes. Para esse efeito, o Ministério da Educação vai publicar,
no final de 2018, um guia para as escolas perceberem como podem
maximizar as suas instalações através da abertura da escola à
comunidade e da promoção de eventos para lá dos horários das aulas. O
programa governamental salienta até que, com isso, as instituições de
ensino podem gerar algum retorno financeiro, que pode ser usado a
favor das atividades educativas.

O executivo de Theresa May vai ainda partilhar boas práticas dos
centros de emprego que também já utilizam as suas instalações a favor
da comunidade. E dá até o exemplo do centro de Wakefield, que criou um
grupo de conversa para refugiados sírios — o que facilita a sua
integração e, como tal, reduz as possibilidades de se desenvolver o
fenómeno da solidão.

A cadeia de supermercados britânica Sainsbury's criou um conceito de
mesas de conversa, para fomentar a interação entre as pessoas (Foto:
GETTY IMAGES)

O apelo para que se aproveitem os espaços para fomentar as ligações
sociais estende-se, também, às empresas. O governo vai incentivar as
companhias a fazê-lo e exemplos bem-sucedidos não faltam: a cadeia de
supermercados Sainsbury's criou um conceito de mesas de conversa que
vão ser testadas em 20 lojas, para fomentar que as pessoas se
relacionem e, assim, se possa combater a solidão.

Uma rede de transportes que fomente a coesão social

É mais uma evidência: as pessoas dependem dos transportes para todas
as atividades da sua vida — nomeadamente para as interações sociais.
Sem surpresa, esta área não é esquecida no programa inglês para o
combate à solidão. No documento, o governo refere que já investiu
"biliões" na modernização e reforço destas infraestruturas,
sublinhando também o apoio de mais de 280 milhões de euros por ano
para estimular os serviços locais de autocarros e a compra de 400
novos mini-autocarros para o transporte comunitário.

O governo inglês refere que já investiu "biliões" na modernização e
reforço dos transportes, sublinhando o apoio de mais de 280 milhões de
euros por ano para estimular os serviços locais de autocarros e a
compra de 400 novos mini-autocarros para o transporte comunitário.

Mas há mais trabalho a fazer, garante o executivo. Uma das medidas
anunciadas prende-se com o financiamento, em 2019, de programas de
formação para condutores comunitários — que fazem o transporte de
pessoas idosas ou com deficiência. Como resultado, haverá mais
profissionais capacitados para fazer a ligação de quem mais necessita
com o mundo. Outra das iniciativas prende-se com a realização de
parcerias com empresas de transporte de passageiros que estejam a
desenvolver iniciativas para combater a solidão. E dá-se o exemplo da
empresa Go South Coast, que implementou um novo layoutnos seus
autocarros para tornar mais fáceis as interações entre os passageiros.

Juntar as pessoas através da habitação

O governo britânico parte do pressuposto que a habitação também pode
ser um elemento-chave na inclusão social — sublinhando a importância
de um planeamento cuidado, que equilibre os espaços públicos e
privados. Neste sentido, o programa prevê o financiamento de pesquisas
sobre o impacto da habitação comunitária, que combine casas privadas
com espaços comuns, no combate à solidão.

Além disso, o Estado vai também promover alguns eventos, como
conferências, seminários e mesas redondas, que juntem representantes
do setor imobiliário para debater o papel do design das casas no
bem-estar — e, por consequência, no combate à solidão. O Ministério da
Habitação compromete-se a publicar resultados no final da primavera de
2019.

O poder das ferramentas digitais no combate à solidão

Em pleno século XXI, não podemos pensar apenas em espaços físicos
quando falamos de infraestruturas. As ferramentas digitais também
devem ser usadas, de acordo com o programa, para aproximar as pessoas
— embora o governo reconheça que a tecnologia também tem o potencial
de gerar solidão.

O executivo inglês quer usar as ferramentas digitais para aproximar as
pessoas (Foto: GETTY IMAGES)

O executivo de Theresa May elenca os investimentos já em marcha nesta
área — nomeadamente os 10 milhões de euros gastos para garantir
conhecimentos básicos do meio digital a 800 mil pessoas ou a colocação
de wi-fi gratuito em todas as bibliotecas do país.

Mas, diz o governo, há mais a fazer. Desde logo a inclusão deste tema
como critério para a atribuição do fundo para a inovação e inclusão
digital, no valor de 450 mil euros, lançado em setembro deste ano — e
que visa aumentar a inclusão digital de idosos e pessoas com
deficiência. O Ministério para o Digital e Indústrias Criativas vai
ainda organizar mesas redondas com empresas de tecnologia para avaliar
o impacto do digital na solidão.

Voltar ao índice

Uma cultura que facilite a integração social

É talvez a parte de mais difícil execução em qualquer programa. A
cultura não se muda por decreto, é sabido, mas há medidas que podem
encorajar mudanças num tema ainda tão estigmatizado — o governo revela
que 30% dos britânicos reconhece sentir-se constrangido em assumir que
sente solidão, o que dificulta a busca de ajuda e superação do
problema. Ainda assim, o executivo criou aquilo que considera serem
"pequenos passos" para caminhar no sentido de uma cultura mais
inclusiva, que reconheça a importância das interações sociais e esteja
atenta a fenómenos de solidão.

O papel das empresas

As empresas desempenham um papel fundamental na solidão — estando até,
muitas vezes, na sua origem. Um estudo publicado em 2014, e citado no
programa, refere que 42% das pessoas não tinha qualquer colega de
trabalho que pudesse considerar um amigo. Mas o governo quer que as
companhias abandonem o lado do problema e passem para o da solução —
apoiando o bem-estar dos empregados, com impactos reais na sua
produtividade.

Neste sentido, foi criado um 'Compromisso dos empregadores'(Employer
Pledge, em inglês), que nada mais é do que o reconhecimento, por parte
das empresas, da importância do combate à solidão nas suas práticas
diárias — que podem incluir grupos de ajuda, apoio aos funcionários em
momentos mais delicados (como a paternidade, a reforma ou a perda de
alguém próximo) ou até a publicação de artigos informativos na
intranet das empresas. O programa revela que empresas de alto porte,
como a Sainsbury's, a Co-op ou a Cisco já aderiram a este compromisso.

O governo criou um acordo com algumas empresas para que incluam o
combate à solidão nas suas atividades diárias (Foto: GETTY IMAGES)

O papel das escolas

Uma mudança cultural nunca poderia deixar de incluir as escolas. É por
isso que a estratégia inglesa prevê a introdução, até setembro de
2020, dos temas relacionados com a solidão nos manuais escolares do
Reino Unido — tanto no ensino primário como secundário –, abordando a
importância das relações sociais, assim como os efeitos nocivos da sua
ausência.

Vão também ser criadas, em 2019, equipas de apoio à saúde mental. A
sua principal função passa por identificar os casos de solidão nos
jovens, facilitando o acesso à terapia, assim como ajudar na
prevenção, sempre que possível.

Voltar ao índice

Portugal pode aprender com o exemplo britânico?

Apresentados os traços gerais da estratégia britânica, a questão
sai-nos, inevitavelmente, boca fora: e em Portugal? Será que o
problema, por cá, justifica uma intervenção idêntica a nível
governamental? Adalberto Dias de Carvalho, coordenador do Observatório
da Solidão do ISCET (Instituto Superior de Ciências Empresariais e do
Turismo), não tem dúvidas de que o caso português "já merece a
existência de uma política concertada sobre a solidão".

"Temos todos os indicadores para acreditar que o fenómeno é muito
importante e muito alastrado no nosso país. Não tenho dúvidas de que é
um fenómeno endémico", sustenta. Uma estratégia é necessária, assegura
o investigador, mas, antes dela, é preciso que se reconheça o problema
— e, mais do que isso, que ele seja estudado.

"Temos todos os indicadores para acreditar que o fenómeno é muito
importante e muito alastrado no nosso país. Não tenho dúvidas de que é
um fenómeno endémico".
Adalberto Dias de Carvalho, coordenador do Observatório da Solidão

Adalberto Carvalho acredita que, em Portugal, "não existe consciência
da autonomia e da especificidade do fenómeno da solidão". Além disso,
a vida moderna potencia uma falta de atenção relativamente ao outro.
"As pessoas não têm tempo nem para olhar para os seus mais próximos.
Muitas das formas de prevenção e terapia para a solidão passam por
conversar, mas as pessoas não conversam. Almoça-se fora porque não há
tempo de ir a casa. Ao jantar, quem tem miúdos tem de ver como estão
os trabalhos de casa — esses terríveis trabalhos de casa que destroem
o tempo de convívio das crianças e das famílias. Quando não é assim,
vai-se para a televisão ou para o tablet", lamenta o especialista.

Tal como acontece com o programa britânico, que se compromete a
estudar e a medir o problema da solidão, em Portugal também era
necessário haver um estudo aprofundado. "O fenómeno não está
totalmente identificado. Não tenho dúvidas de que a solidão é muito
representativa em Portugal, mas está escondida; é preciso pô-la a
claro", explica Adalberto Carvalho.

Para fazê-lo, há que refletir sobre a questão metodológica. "Há uma
dimensão subjetiva muito forte nesta matéria, é quase um fenómeno de
intimidade. É evidente que isto não pode ser tratado como são as
doenças cardíacas ou pulmonares, que podem ser medidas de forma
objetiva", realça o professor. "Tem de se fazer um estudo a nível
nacional, mas não pode ser feito com métodos apenas quantitativos,
porque vai falsear os resultados", garante.

Tal como acontece com o programa britânico, que se compromete a
estudar e a medir o problema da solidão, em Portugal também era
necessário haver um estudo aprofundado. "O fenómeno não está
totalmente identificado. Não tenho dúvidas de que a solidão é muito
representativa em Portugal, mas está escondida; é preciso pô-la a
claro", explica Adalberto Carvalho.

A importância das escolas, dos hospitais e das prisões

Adalberto Carvalho considera que Portugal "poderia aprender com o
exemplo britânico, que é completamente inovador". "Temos de ter o
sentido de oportunidade de aproveitar o que está bem feito, como é o
caso do programa inglês", defende. Entre o rol de medidas adotadas no
Reino Unido, há uma em particular que o investigador gostaria de ver
implementada por cá: o envolvimento das escolas no fenómeno da
solidão. Até porque os estudos conduzidos pelo Observatório dão conta
de um dado curioso. "Encontrámos mais casos de solidão nos jovens do
que nos idosos. Só há uma diferença, os jovens saem mais depressa do
estado do solidão do que os idosos", explica o coordenador do
organismo.

"Existe muita solidão nos adolescentes", concretiza. "A adolescência é
a fase de transição entre a infância e a idade adulta, o que significa
que há conquistas, buscas, vivências de adulto que são novas e
procuradas, mas, ao mesmo tempo, está a perder-se algo do que estava
para trás, na infância e que dava segurança".

Estudos do Observatório da Solidão concluem que há mais fenómenos de
solidão nos jovens do que em idosos (Foto: GETTY IMAGES)

É por isso que, para o especialista, é tão fulcral o papel dos
estabelecimentos de ensino. "Se virmos as preocupações, as diretrizes,
os programas escolares, dificilmente encontramos algo relacionado com
este tema. É um assunto tabu. Mas as escolas portuguesas têm de se
preparar para estarem atentas ao fenómeno da solidão", sublinha
Adalberto Carvalho. Para isso, é preciso que tanto professores como
psicólogos sejam formados para identificar o problema — e também para
ajudar a preveni-lo e a resolvê-lo. "A deteção do fenómeno da solidão
pode perfeitamente ser feita na escola e o sítio privilegiado para o
fazer é no recreio. É preciso que pessoas treinadas observem o
comportamento das crianças, porque ali nota-se bem as que estão com as
outras e as que são rejeitadas e se encostam a um canto".

Adalberto Carvalho tem uma visão coincidente com a do governo
britânico também noutro ponto: na necessidade de dotar os médicos de
família (assim como outros profissionais de saúde) de instrumentos
para fazer a prescrição social dos pacientes afetados pela solidão.
"Os médicos lidam com estas questões diariamente. Há muitas pessoas
que vão aos consultórios sobretudo para falar. E o mesmo acontece nas
farmácias. Tem de haver formação por parte dos profissionais de saúde,
porque este assunto não é intuitivo", ressalta. O especialista deixa,
ainda assim, um alerta. "Para haver prescrição social em Portugal, as
consultas vão ter de aumentar a sua duração, porque tratar a solidão
não é só passar uma receita".

"A deteção do fenómeno da solidão pode perfeitamente ser feita na
escola e o sítio privilegiado para o fazer é no recreio. É preciso que
pessoas treinadas observem o comportamento das crianças, porque ali
nota-se bem as que estão com as outras e as que são rejeitadas e se
encostam a um canto".
Adalberto Dias de Carvalho, coordenador do Observatório da Solidão

Para o especialista, além das escolas e dos hospitais, também as
prisões — lugares de isolamento por excelência — devem estar
preparadas para lidar com o fenómeno. "Os presos também são seres
humanos e tem de haver pessoas capazes de compreendê-los e ajudá-los a
ultrapassar a solidão", remata.

O coordenador do Observatório da Solidão realça ainda a parceria
britânica com a empresa de correios Royal Mail para enfatizar o papel
das visitas domiciliárias, sobretudo aos mais idosos. "Em Portugal,
isso é assegurado, em certos meios rurais, pela GNR, que passa pelas
casas das pessoas para saber como estão, se tomaram os medicamentos… É
um trabalho importante, mas, uma vez mais, era útil uma formação
direcionada para o fenómeno da solidão", sublinha.

Os espaços de convívio — e os de discussão

Para o especialista, é preciso colocar as pessoas a falar e a pensar
sobre a solidão. Por isso, considera que uma estratégia em Portugal
deveria passar pela realização de colóquios e iniciativas de
sensibilização em vários pontos do país — onde se divulgasse
informação sobre o tema, mas também se auscultassem soluções para
ajudar a amenizar o problema. "Tem de haver uma sensibilização para o
assunto. Tem de se falar para quebrar o tabu e o esquecimento",
refere.

"O poder local tem de ser sensibilizado para a criação e funcionamento
de espaços de convívio, de partilha, de comunidade".
Adalberto Dias de Carvalho, coordenador do Observatório da Solidão

À semelhança do que acontece em Inglaterra, também em Portugal é
necessário o reforço dos espaços públicos como parte de uma estratégia
de combate à solidão. Pelo menos é o que pensa Adalberto Carvalho, que
direciona a questão para as autarquias. "Podia ser uma encomenda feita
à Associação Nacional de Municípios", atira. "O poder local tem de ser
sensibilizado para a criação e funcionamento de espaços de convívio,
de partilha, de comunidade". Mas o investigador deixa uma ressalva.
"Não basta construir infraestruturas, é preciso que os espaços
proporcionem uma interação social".

Para o especialista, as comunidades locais desempenham um papel de
protagonismo numa estratégia para Portugal. "Nas freguesias e nos
municípios é onde tudo deve começar, porque é onde a sociedade civil
está mais próxima e mais presente", defende, para concluir: "E se a
sociedade civil se capacitar, se motivar, se ela própria for
interveniente neste processo, aí sim a problemática da solidão vai
ganhar o estatuto de problema político".

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.

quinta-feira, novembro 15, 2018

# Holandês de 69 anos inicia batalha legal para mudar idade para os 49

https://observador.pt/2018/11/07/holandes-de-69-anos-inicia-batalha-legal-para-mudar-idade-para-os-49/
7/11/2018
, 23:22

Pensionista abre processo legal, alegando que a idade o prejudica para
arranjar emprego e ao usar o Tinder. "Pode-se mudar de nome e de
género. Porque não de idade?", questiona.

Um pensionista holandês de 69 anos iniciou uma ação legal pedindo para
que um tribunal o autorize a mudar a idade que tem no seu documento de
identificação, passando a ser identificado como tendo menos 20 anos.

Emile Ratelband, nascido a 11 de março de 1949, apresentou um pedido
no passado para que a sua data de nascimento fosse alterada
oficialmente para 11 de março de 1969, mas o órgão em causa recusou,
segundo conta o De Telegraaf. Na sequência dessa decisão, Ratelband
entrou agora com uma ação legal em tribunal contra o Governo holandês,
alegando que, se o Estado permite a qualquer cidadão que alterar o seu
nome ou o seu género, então também lhe deveria ser autorizada a
mudança de idade.

"Pode-se mudar de nome. Pode-se mudar de género. Porque não de idade?
Não há questão com tanta discriminação como com a idade", declarou
Ratelband ao jornal holandês, citado pelo britânico The Telegraph.
"Fiz exames e o que é que eles revelam? Que a minha idade biológica
corresponde aos 45 anos", garante o pensionista.

As motivações para a mudança prendem-se com as "discriminações" que
Ratelband diz sofrer devido à idade, tanto a nível profissional e
pessoal. "Com 69 anos, estou limitado. Com 49 posso comprar uma casa
nova, conduzir um carro diferente, arranjar mais trabalho", explica.
"Quando estou no Tinder e lá diz que tenho 69 anos, não recebo nenhuma
resposta. Com 49, com a cara que tenho, ficaria numa posição de luxo."

Em tribunal, o juiz disse compreender o argumento de Ratelband que
compara a mudança de idade à de género, já que em tempos tal teria
sido impensável. Contudo, explicou, o tribunal tem dificuldades em
dar-lhe razão, já que ao permitir alterações de idade abriria espaço a
vazios legais sobre o passado dos cidadãos. Sem a existência legal de
Ratelband entre 1949 e 1969, o que fazer a esses anos? "Quem é que os
seus pais tomavam conta nessa altura então? Quem era esse rapazinho?",
questionou o juiz.

O tribunal tomará uma decisão final sobre o caso dentro de um mês.

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.

segunda-feira, novembro 12, 2018

# RTP1- Afinidades com Tolentino Mendonça

https://www.rtp.pt/play/p5018/e373849/afinidades

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.