/* Commented Backslash Hack hides rule from IE5-Mac \*/

PENSANTES

Outros pensamentos, ideias e palavras que nos fazem pensar...

quarta-feira, outubro 25, 2017

# Os anos da troika. Portugal foi o único país a sair da crise com menos desigualdade

[Ver gráficos online]

http://observador.pt/especiais/os-anos-da-troika-portugal-foi-o-unico-pais-a-sair-da-crise-com-menos-desigualdade/

25 Outubro 2017 Edgar Caetano

Estudo académico olhou para os países do sul da Europa e, criticando a
política da austeridade, destaca Portugal como o único destes países
onde o "aperto do cinto" causou menos desigualdade.

Portugal era um país com muito maior desigualdade social antes da
crise e, entre os países "periféricos" do sul da Europa, foi aquele
que, tendo sido obrigado a apertar o cinto, conseguiu fazê-lo
protegendo, ao mesmo tempo, os elementos mais vulneráveis da
sociedade. Estas são as conclusões de um estudo académico recente,
feito por uma espanhola e um grego, que critica duramente a opção
europeia pela austeridade na resposta à crise mas defende que, nesse
contexto, Portugal surge como o caso em que foi possível mitigar mais
os efeitos dessa opção.

Sofia A. Perez e Manos Matsaganis não seguiram exatamente o critério
dos países onde a troika esteve presente. A Irlanda e Chipre não
figuram na análise mas, por outro lado, está a Itália — que não foi
alvo de resgate mas também aplicou austeridade para conter a pressão
dos mercados — e Espanha, que não pediu resgate público mas acabou, em
2012, por receber dinheiro dos fundos europeus para reestruturar a
banca. Os outros dois países analisados são Portugal e a Grécia.

O estudo, publicado na New Political Economy, constata que houve
"grandes diferenças na magnitude e na conceção dos planos de
austeridade" entre os vários países. Não tendo sido resgatada, Itália
teve, em vários momentos, uma espécie de austeridade "faça você
mesmo", por pressão do Banco Central Europeu (BCE), mas não fezmuita
coisa: "impôs um ajustamento muito menor do que Espanha". Em
contraste, destacam os autores, "Portugal conseguiu causar menos
desigualdade apesar de ter feito uma consolidação orçamental robusta".

Portugal é, também, uma exceção positiva quando os autores assinalam
que, nos países em crise, "mesmo quando as medidas de austeridade
foram concebidas para reduzir a desigualdade, os efeitos
macroeconómicos de segunda ordem acabaram por aumentar a desigualdade
(exceto em Portugal)". Por outras palavras, isto significa que os
governos procuraram atenuar o impacto direto das medidas sobre os
cidadãos mais vulneráveis, mas a recessão económica acabou por levar,
por exemplo, a perdas de postos de trabalho, pelo que o efeito global
acabou por ser mais desigualdade — a exceção, aqui, portanto, foi
Portugal, apontam os economistas.

Quanto é que a economia caiu nos vários países?

A recessão mais profunda entre os países analisados verificou-se,
claro, na Grécia. O produto interno bruto (PIB) desceu 26% entre 2008
e 2013. Em Espanha, a economia contraiu-se em 9% e em Portugal 8%, o
mesmo que em Itália.

O estudo de Sofia A. Perez e Manos Matsaganis pode ser encontrado neste link.

E como é que Portugal conseguiu evitar que esses "efeitos de segunda
ordem" estragassem (tanto) a proteção que se tentou fazer através das
medidas (de primeira ordem) de repartição de esforços? Uma palavra:
exportações. "Em Portugal, o choque negativo para a procura interna
foi mitigado por um aumento considerável nas exportações. Em
contraste, na Grécia a fraca prestação das exportações revelou
fragilidades estruturais adicionais no modelo económico do país",
assinalam Matsaganis e Perez.

Antes da crise, Portugal era (de longe) o país com mais desigualdade

O dado poderá ser surpreendente para muitas pessoas, mas entre os
quatro países analisados, Portugal era (de longe) o que sofria com
maior desigualdade entre rendimentos antes da crise — apesar de ter
vindo a cair nos anos anteriores. Hoje todos os países analisados,
incluindo Portugal, continuam a ser mais desiguais do que a média
europeia, mas Portugal registou a maior correção dos níveis de
desigualdade, nos anos da crise, como mostra o gráfico de Matsaganis e
Perez, feito a partir de dados do Eurostat para o chamado "Coeficiente
de Gini".

Espanha substituiu Portugal como o país mais desigual do Sul da Europa

Como se mede a desigualdade?

Os autores baseiam-se em dois indicadores, um bem conhecido inventado
pelo italiano Corrado Gini, e outro, muito usado pela Comissão
Europeia, o S80/S20.

Este último, mais sensível a alterações nas extremidades (os
rendimentos mais altos e os mais baixos), diz respeito a um rácio
entre o rendimento total do quintil (20%) da população com rendimentos
mais elevados e, por outro lado, o rendimento total do quintil
populacional com menores rendimentos.

Bem mais conhecido é o coeficiente de Gini, que é mais sensível a
variações nos rendimentos médios e varia entre zero pontos (ou 0%) e
um ponto, ou 100%. O índice Gini mede a dispersão relativa dos
rendimentos numa população, pelo que num país onde toda a gente
ganhava o mesmo o coeficiente seria de zero. Quanto mais desigual for
a distribuição de rendimentos maior será o valor.

"Em Espanha, mas também em certa medida, numa primeira fase, Itália, a
crise financeira provocou um aumento da desigualdade desde logo",
notam os autores. Em contraste, na Grécia e sobretudo em Portugal os
anos até 2008 e 2009 foram marcados por uma correção dos níveis de
desigualdade social, graças a medidas como o Rendimento Social de
Inserção(RSI) e o complemento solidário para os idosos. O problema é
que, ao mesmo tempo, aumentava também o endividamento público destes
países.

Quando a crise apertou, depois da reeleição de Sócrates e de a crise
europeia se agravar com o resgate à Grécia (início de 2010), a
austeridade foi aplicada desde logo pelos países devedores. Mas a
troika acabaria, mesmo assim, por aterrar em Lisboa em 2011 — e, até
2014, não houve um aumento da desigualdade, mostram os dados. Pelo
contrário: baixou ligeiramente.

Para suportar estas afirmações, os autores recorrem a dois indicadores
que são dos mais utilizados quando se quer medir o grau de
desigualdade numa dada sociedade: o famoso "Coeficiente de Gini",
criado no início do século passado pelo matemático italiano Corrado
Gini, e, também o rácio S80/S20 (já lá vamos). "O aumento da
desigualdade, seja medido pelo Coeficiente de Gini ou pelo rácio
S80/S20, foi maior em Espanha, neste período", conclui-se no estudo.

Descida da desigualdade interrompida ainda no tempo de Sócrates

A "progressividade" na distribuição dos sacrifícios (e a subida das
exportações) durante o período da troika ajudou a que, ao contrário
dos outros países analisados, a desigualdade não se tenha agravado em
Portugal no período da troika (2011-2014). Mas a maior correção já
vinha de trás: a desigualdade em Portugal em 2004 estava acima dos
0,38 pontos. Ainda com José Sócrates no governo, contudo, o movimento
de descida da desigualdade foi interrompido, na altura em que o
endividamento excessivo obrigou ao resgate da troika.

O período analisado neste estudo termina em final de 2014, altura em
que Portugal tinha um índice de Gini de 0,34, ao passo que Espanha se
aproximava dos 0,35 (era de pouco mais de 0,32 antes da crise
financeira, nível onde Itália ainda permanece). Neste momento,
Portugal tem um coeficiente de Gini calculado em 0,33 pontos(incluindo
impostos e os cruciais rendimentos de transferências sociais), segundo
o FMI, o que fica acima da média europeia, que ronda os 0,31 pontos.

A "progressividade" na distribuição dos sacrifícios (e a subida das
exportações) durante o período da troika ajudou a que, ao contrário
dos outros países analisados, a desigualdade não se tenha agravado em
Portugal no período da troika (2011-2014). Mas a maior correção já
vinha de trás: a desigualdade em Portugal em 2004 estava acima dos
0,38 pontos. Ainda com José Sócrates no governo, contudo, o movimento
de descida da desigualdade foi interrompido, na altura em que o
endividamento excessivo obrigou ao resgate da troika.

Outro indicador, o S80/S20. Portugal desceu para 3º mais desigual

O outro indicador usado pelos autores, o S80/S20, mostra que Portugal
terminou 2014 sensivelmente com o mesmo nível de desigualdade entre os
salários mais elevados e os mais baixos (ver caixa sobre metodologias
de cálculo). Porém, a desigualdade medida por este indicador baixou
subitamente nos primeiros anos da crise e, depois, escalou
gradualmente — durante o programa de assistência — até perto do ponto
de partida.

Elogio a Passos Coelho? Sim, mas não só

O estudo académico é muito crítico da opção europeia pela austeridade,
que associou cegamente os excedentes à virtude e a dívida ao vícioe,
depois, o próprio FMI veio admitir que os efeitos negativos da
austeridade foram maiores do que o previsto (os chamados
multiplicadores). Foi esta política, na opinião dos autores, que
tornou mais profunda e, sobretudo, mais prolongada a recessão após a
crise de 2008. Mas os autores também criticaram o tratamento diferente
dado aos diferentes países.

"Em países devedores mais pequenos, como Grécia e Portugal, a troika
basicamente ditou os termos dos programas de austeridade. Já Itália e
Espanha tiveram uma posição negocial melhor e mais margem de manobra
no momento de decidir sobre a resposta que queriam dar: [Itália e
Espanha] eram países demasiado grandes para resgatar, e caso um deles
tivesse entrado em incumprimento com a sua dívida pública isso teria
significado o fim da zona euro", defendem os autores.

A pesquisa dos autores conclui que a tendência para o aumento da
desigualdade no sul da Europa deveu-se, sobretudo, à descida dos
rendimentos mais baixos. Entre 2008 e 2013, os gregos com menores
rendimentos tiveram um declínio (real, ajustado à inflação) de 51%, os
espanhóis perderam 34%, os italianos 28% e — o mais baixo entre os
países analisados — os portugueses viram o rendimento descer 24%.
Quanto aos rendimentos mais elevados, estes caíram 39% na Grécia, e
17% em Portugal. Em Espanha as pessoas com maiores rendimentos
perderam 16% e em Itália 8%, dois países que, portanto, não ficam bem
na fotografia da desigualdade.

Mariano Rajoy não fica bem na fotografia: Espanha tornou-se um país
muito mais desigual nos anos da crise. (Foto: MIGUEL RIOPA/AFP/Getty
Images)

E porque é que Portugal fica um pouco melhor na fotografia do que os
outros países? Como salienta o estudo, os políticos nem podem ser
culpados por tudo o que acontece de mau nem podem ser aplaudidos por
tudo o que acontece de bom. É, também, esse o caso quando se fala de
desigualdade — apertar o cinto significa mexer nos impostos, nos
apoios sociais e nos salários dos funcionários públicos. Mas há,
depois, os já mencionados efeitos de segunda ordem sobre o que se
chama de procura agregada numa economia. E aí já estamos a falar,
também, de rendimentos de mercado, por exemplo ordenados no setor
privados ou lucros das empresas.

Estes efeitos podem ter intensidades diferentes ou, mesmo, ter efeitos
contraditórios, no que à desigualdade diz respeito. Além disso,
intervêm na formação (ou atenuação) das desigualdades fatores que um
governo pouco ou muito pouco consegue influenciar: designadamente as
exportações, que dependem mais dos ciclos económicos e da procura por
parte do exterior.

Esse fator foi crucial para que, apesar de ter havido políticas que
tenderiam a agravar a desigualdade (sobretudo como efeito de segunda
ordem, com a recessão), o impacto foi atenuado pelas recuperações das
exportações — que eram a principal aposta do governo PSD-CDS. Ainda
assim, os autores do estudo elogiam a componente "progressiva" da
distribuição dos sacrifícios, no plano concebido pela troika e pelo
governo de Passos Coelho.

Mas pode ter havido outros efeitos, que vão além de qualquer executivo
governamental momentâneo, e que ajuda a que em Portugal tenha sido
possível atravessar a crise produzindo menos desigualdade. Cada país
teve resultados diferentes, conforme fatores como até que ponto os
partidos políticos eram dominados por interesses específicos ou
setoriais e, por outro lado, até que ponto as sociedades veem
noprotesto uma forma válida de moldar as políticas, acreditam os
investigadores Sofia A. Perez e Manos Matsaganis (que o Observador
entrevistou em 2015 a propósito da crise grega).

É nestes fatores que Matsaganis e Perez encontram as maiores
diferenças entre os quatro países. Os autores assinalam que "em
Portugal os aspetos mais importantes do esforço de consolidação
orçamental foram decididos de forma cooperativa pelos principais
partidos políticos" e, por outro lado, citando outros trabalhos
académicos, Matsaganis e Perez admitem que em Portugal os partidos
sejam comparativamente menos dominados por interesses particulares, o
que permitiu ao governo distribuir de forma mais "progressiva" os
sacrifícios, sem que faltasse o apoio dos outros partidos (neste caso,
do PS).

Por outro lado, em Portugal, "as elites políticas (formadas na
transição mais radical do país para a democracia [o 25 de abril])
foram mais reativas aos protestos públicos". E é sobretudo aqui que
deixa de haver elogios ao governo de Passos Coelho. Quem sabe, por
exemplo, o que teria acontecido aos números da desigualdade caso
tivesse avançado, por exemplo, a revisão da Taxa Social Única (TSU),
que acabou por ser abandonada depois dos fortes protestos públicos?
Outra questão: o que teria acontecido à desigualdade se algumas
medidas de austeridade não tivessem sido bloqueadas pelo Tribunal
Constitucional? Teríamos chegado ao final de 2014 com mais ou com
menos desigualdade?

"Um aspeto-chave da aplicação da austeridade em Portugal foi que
medidas importantes foram abandonadas perante protestos públicos ou
foram bloqueadas pelo Tribunal Constitucional."
Sofia Perez e Manos Matsaganis

Estas são questões impossíveis de comprovar, mas os autores notam que
"um aspeto-chave da aplicação da austeridade em Portugal foi que
medidas importantes foram abandonadas perante protestos públicos ou
foram bloqueadas pelo Tribunal Constitucional". "É provável que estes
fatores tenham limitado o peso suportado pelos grupos com menores
rendimentos", defendem os autores, notando que, por exemplo, em
Espanha, as manifestações foram "ignoradas" pelos dirigentes políticos
na altura (o que poderá ter ajudado à ascensão de partidos como o
Podemos e o fim do bipartidarismo PP-PSOE em Espanha).

Apesar de Portugal surgir, várias vezes e por diferentes razões, como
uma exceção positiva, os autores apoiam-se nos dados sobre a
desigualdade para colocar em causa a opção pela austeridade (em
economês, pela opção pela desvalorização interna nos países
devedores). Mas o que os preocupa, mais do que o que aconteceu durante
os anos da crise, é que a quebra do investimento público que se
verificou (e ainda verifica) em vários países, terá efeitos de longo
prazo muito negativos para a desigualdade.

"Os custos sociais foram elevados em todos os países. Acreditamos que
a austeridade no sul da Europa poderá ter consequências negativas no
longo prazo, que ainda não são totalmente visíveis, tanto para a
proteção social como para o crescimento económico", receiam Sofia
Perez e Manos Matsaganis.

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.

terça-feira, outubro 24, 2017

# SNS britânico vai deixar de operar as pessoas que não percam peso ou não deixem de fumar

http://observador.pt/2017/10/19/sns-britanico-vai-deixar-de-operar-as-pessoas-que-nao-percam-peso-ou-nao-deixem-de-fumar/

19/10/2017, 11:43 INÁCIO ROSA/LUSA

O Serviço Nacional de Saúde da região britânica de Hertfordshire vai
exigir aos fumadores que deixem de fumar e aos obesos que percam peso
- para que possam ser operados.

Os fumadores só podem ser operados depois de estarem oito semanas sem fumar

O Serviço Nacional de Saúde britânico vai banir de todas as cirurgias,
indefinidamente, os pacientes que não percam peso ou não deixem de
fumar – na região de Hertfordshire, no sul de Inglaterra. As
restrições, que são as mais extremas alguma vez impostas pelos
serviços de saúde, estão já a ser amplamente criticadas pelo Royal
College of Surgeons.

Nos últimos anos, várias áreas da saúde introduziram entraves a estes
pacientes – o mais comum é o adiamento contínuo das cirurgias, até que
as pessoas percam peso ou deixem de fumar. Mas estas novas regras,
desenhadas por grupos de comissão clínica, indicam que os pacientes
obesos "não vão receber cirurgias não urgentes até que reduzam o
peso". O critério também abrange os fumadores, que não são operados a
não ser que não fumem há mais de oito semanas.

As comissões responsáveis por estas imposições afirmam que a ideia é
encorajar as pessoas "a ter mais responsabilidade no que toca à sua
própria saúde e bem-estar para que, sempre que possível, libertarem os
limitados recursos do SNS para tratamentos prioritários".

O vice-presidente da organização que agrega os cirurgiões britânicos
disse que é necessária uma "urgente reflexão" das políticas, que diz
serem "discriminatórias" e contrárias aos princípios fundamentais do
Serviço Nacional de Saúde. Ian Eardly considera que é errado limitar o
serviço do SNS a qualquer grupo de pacientes.

Isolar os pacientes desta maneira vai contra os princípios do SNS.
Isto vai contra a orientação clínica e deixa os pacientes a esperar
por longos períodos de tempo com dores e desconforto. Em alguns casos,
pode até levar a piores resultados depois da cirurgia. Não há
justificação para este tipo de políticas", defende o vice-presidente
do Royal College of Surgeons, em entrevista ao Telegraph.

O cirurgião mostra-se receoso de que as últimas regras sejam apenas "a
ponta do icebergue". E levanta o problema de muitos doentes serem
recusados à partida, sem sequer terem uma consulta com o especialista
que deveria tomar estas decisões.

O novo programa, que também prevê cortes em serviços defertilização in
vitro e na provisão de medicamentos,provocou críticas por parte do
Comité Farmacêutico Local, que garante que "aqueles que podem pagar os
serviços vão comprá-los e aqueles que não podem ficam sem eles". Os
grupos responsáveis responderam, num comunicado à comunicação social,
e explicaram que "esta política é desenhada para melhorar a segurança
dos pacientes, tanto durante como imediatamente depois de uma cirurgia
não urgente. Nenhuma poupança financeira é esperada como resultado
destas medidas. Contudo, esperamos melhorar a saúde a longo prazo dos
nossos pacientes através destas restrições a fumadores e do incentivo
à perda de peso".

Atualmente, os pacientes obesos já vêem as suas cirurgias adiadas por
nove meses ou mais, até que percam pelo menos "10% do peso". As novas
regras aumentam o número de quilos que os doentes mais pesados devem
perder – aqueles com um Índice de Massa Corporal superior a 30 têm de
perder 10% do peso em nove meses, enquanto que os que têm um IMC mais
alto do que 40 têm de perder 15% do peso atual. Ao fim dos nove meses,
os pacientes que não consigam atingir estas metas vão ser avaliados
por um painel clínico. A porta-voz do SNS confirmou que estes casos
podem esperar indefinidamente.

"Em circunstâncias excecionais, os clínicos vão aprovar a cirurgia
ainda que os critérios quanto ao tabaco e ao peso não sejam cumpridos.
As exceções acontecem quando esperar pela operação é mais perigoso
para os pacientes", explicou a porta-voz do Serviço Nacional de Saúde
britânico.

15% da população de Hertfordshire é fumadora, enquanto que 22% é
obesa. A administração do SNS responsável pela região garantiu que em
2021 a instituição ia atingir um défice de 550 mil libras se nada
fosse feito. A comissão que delineou as novas regras afirmou que as
decisões não foram tomadas de ânimo leve e que sentiram o apoio da
população quando as apresentaram numa sessão pública.

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.

segunda-feira, outubro 02, 2017

# “Quem limpa casas de banho pode vir a ganhar mais do que um professor”

http://observador.pt/especiais/entrevista-philippe-van-parijs/

29 Setembro 2017
Pedro Esteves

Philippe Van Parijs é um dos grandes defensores do Rendimento Básico
Incondicional e está em Lisboa para explicar o conceito. Em
entrevista, fala sobre as vantagens, as resistências e o que pode
mudar

O currículo assusta, no melhor dos sentidos. Philippe Van Parijs,
doutorado em Ciências Sociais e em Filosofia, é professor emérito e
tem publicados quase duas dezenas de livros sobre filosofia política e
económica, mas é particularmente conhecido como um dos fundadores da
BIEN (acrónimo de Basic Income Earth Network, um grupo de ativistas e
académicos formado no início dos anos 80), que luta por aquilo a que
se convencionou chamar de Rendimento Básico Incondicional (RBI), um
conceito que defende a universalidade de um rendimento mínimo
garantido, incondicionalmente, a cada cidadão.

O professor de 66 anos é um dos principais oradores do 7.º encontro
anual da Fundação Francisco Manuel dos Santos, que se realiza este
sábado, 30 de setembro, no Teatro Nacional de São Carlos, em Lisboa. A
especialidade de Philippe Van Parijs encaixa perfeitamente no tema da
conferência: "Em que pé está a igualdade? Impactos, desafios e
conflitos".

Para o filósofo belga, o RBI simplifica drasticamente o sistema de
benefícios sociais, mas é, sobretudo, uma ferramenta de liberdade e de
redistribuição de poder. Da liberdade de dizer "não" a um emprego
quando ele não serve, da liberdade de dizer "sim" à formação pessoal,
à assistência familiar e ao movimento cívico. É um chão que garante
que cada pessoa se livra da prisão do dinheiro.

O Rendimento Básico Incondicional é um tema controverso, que alimenta
acesas discussões pelo mundo inteiro, que tem muitos defensores e
oponentes em todos os espetros políticos — quer à esquerda quer à
direita, há quem o defenda e quem o considere um absurdo.

Philippe Van Parijs recebeu o Observador esta quinta-feira, no Bairro
Alto Hotel, em Lisboa. Explicou as ideias que defende, a importância
das utopias e porque é que o Rendimento Básico Incondicional, em
concreto, é um passo importante para promover a igualdade.

O que é o Rendimento Básico Incondicional (RBI)?
De uma forma simples, é uma maneira de garantir um rendimento
incondicional em três vertentes distintas, que os sistemas atuais de
rendimento mínimo não conseguem garantir. O que há em Portugal e em
muitos outros países na Europa é um sistema condicional, na medida em
que é dado apenas aos pobres, e tem em conta as condições dos
indivíduos e das famílias, ou como compensação pela ausência de
trabalho.

Pelo contrário, o RBI tem em conta apenas o indivíduo e é
incondicional porque não é preciso saber se a pessoa vive sozinha ou
acompanhada, é incondicional porque não interessa quanto cada um
ganha, se é rico ou pobre, "elegível" ou não, toda a gente recebe, e
finalmente porque não tem em conta se as pessoas têm ou não trabalho,
se podem ou querem trabalhar ou não.

Porque é que acha que este sistema é melhor do que o que temos atualmente?
Podemos justificar isso de várias formas, mas a mais óbvia é a
possibilidade que as pessoas têm de dizer "sim" ou "não" a uma
oportunidade. No sistema corrente, quem beneficia de um subsídio de
desemprego, por exemplo, perde o direito a ele quando começa a
trabalhar. A isto chamamos "a armadilha da pobreza" ou "a armadilha do
emprego". Ou seja, muitas pessoas optam por ficar com o subsídio,
porque aquilo que o trabalho paga não compensa financeiramente [em
relação ao subsídio] ou porque têm medo de perder o novo emprego e de
voltar a entrar na espiral burocrática que é pedir um subsídio.

Por isso, o RBI seria uma base na qual as pessoas poderiam confiar. Ao
mesmo tempo, dá a oportunidade às pessoas de dizerem "não" a certos
trabalhos. Se uma pessoa tem um trabalho horrível, onde já não aprende
nada, ou tem um chefe detestável, tem a possibilidade de desistir mais
facilmente, continuando a garantir um rendimento, o que não acontece
agora: se desistir voluntariamente do emprego, não tem direito a nada.
Ou seja, o RBI é uma excelente oportunidade de dizer "sim" quando o
trabalho é gratificante e de dizer "não" quando isso não acontece.

Usa muito a palavra "liberdade". Acha que o sistema atual nos deixa "presos"?
De certa maneira, sim. Estamos presos ao dinheiro que ganhamos,
precisamos dele para sobreviver. Costumo dar o exemplo dos estágios
profissionais que podemos fazer para progredir na vida e na profissão.
Muitos deles não são pagos ou são mal pagos, ora porque a entidade
patronal não os contempla ou financia de forma deficiente. Algumas
pessoas conseguem fazê-los porque os pais garantem um valor de base,
mas muitos não têm a possibilidade de investir naquilo que realmente
querem, por isso têm de se sujeitar a empregos de que não gostam ou
nos quais o desempenho não é bom. Daí que o RBI seja uma espécie de
investimento no capital humano, por permitir às pessoas que adquiram
as competências para desempenhar melhor a profissão de que gostam.

Esta liberdade de dizer "não" a um emprego também tem consequências
nas empresas. Se muita gente disser não a um emprego, o empregador vai
ter de pensar que, se quer reter os empregados, talvez tenha de mudar
alguma coisa. Por exemplo, melhorar as condições de trabalho, oferecer
mais formação, tornar os horários mais flexíveis ou até, se nada disso
for possível, pagar mais. Por isso, costumo dizer que, se o rendimento
básico for suficientemente elevado, as pessoas que limpam as casas de
banho nas universidades podem vir a ser mais bem pagas do que os
professores.

Por isso digo também que o RBI não é só acerca de rendimento, é
sobretudo uma redistribuição de poder das pessoas, não só na
possibilidade de dizer "não" mas também em dizer "sim". Não é só uma
questão de justiça, é também uma maneira de tornar a economia mais
eficiente.

Porque é que acha que esta ideia é tão difícil de implementar?
Há muitas razões. Uma delas é a má interpretação do conceito, que faz
com que muitas pessoas desliguem a ficha. Pensam que [por exemplo] 300
euros multiplicados pela população portuguesa resulta num valor
insustentável e abandonam logo a ideia. Ou, noutro exemplo, pensam:
"Gastar dinheiro dando-o aos ricos? Isso é um absurdo", ou ainda que
isso iria aumentar a inflação. Na prática, não é nada disto.

Introduzir o RBI permitiria abandonar a lista enorme de subsídios que
estão abaixo daquilo que recebem os pensionistas ou os desempregados,
o que simplificaria muito o sistema. Para aqueles que recebem mais do
que aquilo que seria o RBI, seriam compensados com essa diferença,
claro. Outro aspecto importante seriam as taxas aplicadas a quem ganha
mais. Quem tivesse a hipótese de trabalhar e de juntar um salário ao
RBI teria de pagar uma taxa a partir de determinado montante, que
serviria para financiar o RBI.

Há muita gente importante a refletir a sério sobre isto (professores,
economistas, prémios Nobel), ainda assim a implementação prática é
difícil, em parte, porque a opinião pública e a classe política
bloqueiam o pensamento. Ainda ontem estive a moderar um debate onde
participou Francisco Louçã [opositor do RBI]. A discussão foi curta,
mas foi interessante debater o assunto ali, com os críticos. Mas até
pessoas como ele, economistas inteligentes e sofisticados, ficam
bloqueados logo à partida com as tais questões iniciais do
financiamento, por exemplo.

Depois há outro tipo de opositores, que mesmo depois de removidos
todos os "bloqueios" [técnicos] dizem ter, até para minha surpresa,
devo dizer, uma objeção moral, que é o facto de se atribuir um
rendimento àqueles que escolhem não trabalhar.

Uma das críticas ao RBI é precisamente essa, a de que pode tornar as
pessoas "preguiçosas".
Há a objeção moral, que diz que é injusto dar dinheiro a quem não
trabalha, e há uma objeção mais económica, que tem a ver com o
incentivo, ou seja, que defende que a partir do momento em que se dá
dinheiro isso é mau para a economia. São ângulos diferentes.

Acha que isso pode estar relacionado com a cultura de cada país?
É curioso, mas um dos paradoxos disso está no seguinte: quando
perguntam às pessoas de diferentes países se deixariam de trabalhar se
tivessem um rendimento básico de 300 ou 500 euros, quase toda a gente
responde que não; "mas os outros sim", deixariam. Mas continuamos as
entrevistas e não paramos de nos perguntar: "Mas onde estão os
'outros'?" [risos]

O trabalho é importante para as pessoas se sentirem realizadas, é mais
do que dinheiro. As pessoas que se tornam "preguiçosas", para usar a
sua expressão, já existem no sistema atual, é uma forma de estar e de
viver, o RBI não vai mudar isso, é antes uma forma de dar às pessoas a
liberdade de fazer o que elas realmente desejam.

Contudo, também há maus argumentos para defender o Rendimento Básico
Incondicional. Estive envolvido no referendo da Suíça, que considerava
atribuir uma quantidade enorme de dinheiro por pessoa [2.250€ por
mês], o que equivalia a cerca de 39% do Produto Interno Bruto. O país
tem o dinheiro, claro, e na campanha ficou claro que as pessoas não
iriam deixar de trabalhar, mas que iriam escolher um part-time,
dedicar mais tempo à família e aos hobbies, etc. Mesmo considerando
que as pessoas trabalhariam com mais qualidade e até mais tarde na
vida, isto teria repercussões económicas.

Fazendo as contas, percebemos rapidamente que para sustentar o RBI na
Suíça seria preciso não 39% mas 45% do PIB, e isso tem de ser tomado
em conta. Nessa altura eu dizia aos suíços que, se vivesse lá, votaria
"sim" no referendo, mas se fosse um governante a quem dissessem que
tinha de implementar o RBI naquelas condições, eu pediria a demissão
nesse mesmo instante. É preciso simplificar o sistema e encontrar um
valor equilibrado, as coisas têm de ser feitas com calma.

Consegue prever quando é que o Rendimento Básico pode ser implementado?
É impossível prever quando e onde, porque é necessária uma espécie de
aliança entre diferentes atores para que isso aconteça, para que haja
um avanço efetivo em direção ao RBI.

Políticos, economistas…
Primeiro, são precisos visionários, pessoas que consigam "ver" uma
sociedade melhor, não apenas em sonhos, mas uma que funcione. Pessoas
que pensem na sustentabilidade económica e social e na ética. Pessoas
que sejam capazes de mobilizar a utopia, mas a utopia realista, algo
que não é possível agora mas que seja no futuro, uma alternativa à
utopia neoliberalista, totalmente submissa ao mercado, e uma
alternativa à velha utopia socialista, totalmente submissa ao Estado.
Precisamos de outra coisa, de pessoas que consigam mobilizar para uma
utopia melhor que o nacionalismo populista ou o jihadismo. É preciso
isso, visionários.

Depois, impulsionadores de mudança, pessoas indignadas com o atual
estado das coisas, pessoas com a capacidade e a força de mudar, mesmo
que não saibam bem como, mas que tenham essa garra. Precisamos também
de pensadores, aquilo a que os franceses chamam de bricoleur, pessoas
"do it yourself" que conseguem ver um pouco mais à frente e vão
abrindo caminho na direção certa.

E depois precisamos de políticos, claro, com a inteligência suficiente
para entender esta utopia realista e, a partir disso, serem capazes de
ouvir toda esta gente, até ao ponto de terem a coragem de tomar a
decisão de seguir este caminho. É assim que as utopias se realizam.
Imagine, quando Otto von Bismarck criou essa coisa completamente
utópica, a segurança social, pensões pagas pelo Estado, que ideias
malucas… depois desenvolveu-se como se viu.

O RBI também é uma ideia muito interessante de observar dentro dos
partidos políticos, porque quer à direita quer à esquerda, por toda a
Europa, há fortes opositores e entusiastas.

Porque isto não tem a ver com partidos, mas com a vida e com a
consciência das pessoas?
Porque isto não encaixa com facilidade nos paradigmas "Mercado vs.
Estado", nem na "direita ou esquerda". Ao início, até com bastante
surpresa, percebi que, por todo o mundo, há uma esquerda que se opõe à
exploração capitalista, porque dizem que é uma coisa terrível as
pessoas serem forçadas, para sobreviverem, a venderem o seu trabalho
para os capitalistas. Para eles, o RBI é fantástico, porque é uma
oportunidade libertadora. Depois, há a esquerda que está contra a
exploração capitalista porque acha inconcebível que existam pessoas
com rendimento sem trabalho, e para eles o RBI é um escândalo, porque
estende a todas as pessoas a hipótese de viverem como os capitalistas.

É uma coisa muito enraizada na cabeça das pessoas, até a um nível,
digamos, evolutivo da nossa espécie, a noção de que só é possível ter
um rendimento com trabalho. Ainda há pouco falei disto numa preleção
sobre o RBI no futuro do trabalho, onde defendi que o RBI não é uma
alternativa ao direito ao trabalho, é muito importante que toda a
gente tenha acesso a um emprego pago, nem o RBI é uma resposta ao
"agora já não podemos trabalhar por causa dos robôs", não é nada
disso.

Ao mesmo tempo, a RBI não quer dizer que perdemos o dever de
trabalhar. Mas o trabalho é uma definição algo ambígua, porque
significa emprego pago, mas também um esforço que é útil para a
comunidade. Ao longo da História, particularmente a partir da
Industrialização, estas duas coisas juntaram-se, como se o emprego
pago fosse a melhor maneira de contribuir para o bem de todos. E até
mesmo a ideia de que quanto melhor se é pago melhor se demonstra que
se é útil para a sociedade. Claro que isto é uma ideia estapafúrdia,
porque há muitas maneiras de ser útil para a sociedade sem ser através
de um emprego pago. É absurdo pensar que ter um emprego pago significa
que se é útil para a sociedade, há pessoas que são muito bem pagas
para convencer outras pessoas a comprar coisas de que não precisam.

Compreender estes processos demora tempo. É preciso pedagogia, ajudar
as pessoas a entender estas ideias, a natureza dos desafios da
globalização e da tecnologia, e de que forma a RBI encaixa nisso. Uma
das razões porque puxei este assunto é porque entre os defensores do
RBI há quem confunda as coisas: o RBI não é o fim do direito ao
trabalho nem é o fim do dever de trabalhar.

Mas se eu receber o RBI, respeita a minha decisão de deixar de trabalhar?
Claro. Mas eu diria que o que lhe dará reconhecimento, estima e a
admiração das pessoas e da sociedade não é apenas o dinheiro e os
benefícios associados. Por isso, insisto que deve ter o direito a
isso, sendo ao mesmo tempo útil para a sociedade das mais variadas
formas, talvez em algo diferente do que você faz no seu emprego.
Continue a trabalhar e a investir mais do seu tempo a criar o seu
filho ou filhos porque um deles pode ter algum problema e, em algum
momento, precisa de mais atenção. Ou reduza o seu tempo de trabalho
por haver algo extremamente importante que deve ser feito na
comunidade onde vive. Porque reduzir o tempo de trabalho será menos
dispendioso, já que o seu rendimento não será reduzido, pelo menos não
tanto quanto é atualmente.

Vê alguma desvantagem no Rendimento Básico?
Sim… [faz uma longa pausa]. Eu continuo a repetir neste movimento do
rendimento básico que é muito importante convidar críticos e ouvir
objeções, porque muitos dos argumentos usados são errados, por isso é
importante ouvir críticas. Às vezes, não há problema nenhum em
defender uma boa ideia com um mau argumento, mas se queremos encontrar
boas ideias, temos de nos concentrar nos bons argumentos e assim… bem,
há coisas que ainda me intrigam e que ainda não fui capaz de
esclarecer completamente. Estou a tentar formular uma delas… Às vezes,
há um paradoxo no movimento do RBI, porque algumas pessoas o defendem
porque é bom para o crescimento económico e outras porque é bom para o
empobrecimento, ou melhor, para atingir um estado estacionário. Quem
tem razão?

Parte dessa questão é fácil de responder porque há circunstâncias
especiais onde se mede o efeito direto das medidas. As experiências em
curso na Índia, por exemplo, estão a ter bons resultados, o aumento do
poder de compra tem um efeito multiplicador económico e social muito
interessante.

Por outro lado, há outro argumento que diz que não podemos continuar a
consumir e a produzir mais e mais porque isso é mau para o nosso
planeta. Há pessoas que dizem que o rendimento básico é necessário
neste contexto e consigo entender a intuição por detrás disso: se o
desemprego involuntário é um problema, como podemos resolver isso,
dado que esperamos mais crescimento da produtividade simplesmente
produzindo mais e mais? Porque pensamos que a produção deve crescer
mais rapidamente do que a produtividade. E se a produtividade é o
quanto se produz por hora de trabalho, se a produtividade aumenta, ou
resulta em desemprego ou é necessário produzir mais.

E por isso alguns defendem que o RBI é necessário como uma alternativa
estratégica ao aumento contínuo da produção para manter os níveis de
emprego. Assim, dá à população a oportunidade de trabalhar menos
horas. Estes argumentos encaixam muito bem numa perspetiva mais
ecológica ou de crescimento zero.

Mas o problema é que se quisermos proteger a Terra temos que usar
menos recursos naturais, o que torna necessário encarecer esses
recursos, como o petróleo, por exemplo. Assim, há alguma tensão entre
duas preocupações ecológicas: por um lado procura-se uma solução para
o desemprego que não passe pelo aumento da produção, mas ao mesmo
tempo é preciso ter recursos naturais que sejam mais caros, e portanto
acaba por ser necessário mais trabalho… É uma área em que é necessário
ainda pensar mais claramente. Esta ligação entre o rendimento básico e
as preocupações ambientais não é tão óbvia como parece. Explicamos
isso no nosso último livro, está traduzido para português.

Lembra-se do momento em que achou que o rendimento básico era uma
excelente ideia?
Sim, foi em dezembro de 1982, estava a lavar a loiça e a ver um
carvalho pela janela da minha cozinha. Nessa altura eu tinha dois
problemas. Primeiro, precisávamos de dar resposta à questão do
desemprego mas o crescimento não era o caminho certo. Isto foi antes
da descoberta das alterações climáticas e, então, porque não permitir
às pessoas trabalharem menos, tornando alguns dos empregos disponíveis
para as pessoas desempregadas? Parecia uma ideia inteligente para
conseguir resolver o desemprego sem implicar cada vez mais produção.

O outro problema (isto foi alguns anos antes da queda do muro de
Berlim) era que a esquerda percebeu que o socialismo, ou seja, a posse
dos meios de produção pelo Estado, não é a solução. Apesar de se poder
sempre sonhar com um mundo melhor, o socialismo não era brilhante em
termos de eficiência e havia também muitas desigualdades em termos
sociais. Era importante fazer algumas mudanças mas não podia ser só a
reparação do sistema de segurança social em vigor. Era preciso criar
uma alternativa diferente ao sistema que resolvesse de forma
pragmática o problema do desemprego, que vemos agora na Europa, e por
outro lado criar uma utopia, que voltasse de certa forma à utopia do
socialismo que foi abandonada por Marx.

Há quem considere que o crescimento neste momento é impossível.
Atualmente o grau de consciência desta necessidade é muito diferente,
mesmo de país para país. Tudo depende da conjuntura do país. É
necessário combinar uma visão a longo prazo com o oportunismo do curto
prazo. Sem esquecer que o rendimento básico é só uma das coisas que
pode ser alterada e deve ser combinada também com uma reforma do
sistema de ensino, para o ajustar ao século XXI.

É uma forma de promover a igualdade?
É uma forma de promover a igualdade mas não diz respeito apenas à
desigualdade de salário entre lares, é também uma questão de
desigualdade de poder, não só entre lares mas também dentro do próprio
lar. O que é muito importante para a sociedade e normalmente está
ausente das comparações de igualdade.

--

---
Recebeu esta mensagem porque está inscrito no grupo "Pensantes" dos Grupos do Google.

Para anular a subscrição deste grupo e parar de receber emails do mesmo, envie um email para pensantes1+unsubscribe@googlegroups.com.
Para mais opções, consulte https://groups.google.com/d/optout.