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segunda-feira, abril 12, 2021

# Um quinto da população portuguesa é pobre. Um em cada três pobres tem emprego estável

https://observador.pt/2021/04/12/a-pobreza-em-portugal-quase-20-das-pessoas-sao-pobres-e-um-em-cada-tres-pobres-tem-emprego-estavel/

Estudo diz que "apenas" 13% dos pobres em Portugal não têm emprego — a
maioria trabalha e um em cada três ganha pelo menos o salário mínimo.
Divórcio, desemprego e doença são fatores de pobreza.

Agência Lusa / Observador

12 abr 2021, 07:40
A maior parte das pessoas em situação de pobreza em Portugal tem
empregos precários ou empregos estáveis e com contrato mas com baixo
salário, que não chega para o agregado familiar

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Em Portugal, mais de um em cada dez trabalhadores (11%) está em
situação de pobreza. E a maior parte dos pobres não o são por não
terem emprego ou por dependerem de apoios sociais que menorizem a
ausência de salário; estão em situação de pobreza porque auferem
salários baixos ou têm empregos precários.

As conclusões são do estudo "Pobreza em Portugal – Trajetos e
Quotidianos", promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e
coordenado pelo investigador e professor universitário Fernando Diogo,
que lecciona Sociologia na Universidade dos Açores.

O estudo, que juntou uma equipa de 11 investigadores, dá pistas sobre
quem são as pessoas em situação de pobreza em Portugal: 32,9% são
trabalhadores, 27,5% serão reformados, 26,6% são precários e 13% são
desempregados.

A percentagem de pessoas em situação de pobreza que trabalham (32,9%
com vínculos efetivos e trabalho regular, 26,6% com trabalhos
precários) permite perceber uma coisa: que a maioria das pessoas em
situação de pobreza em Portugal trabalha. E entre os que trabalham, a
maior parte (os tais 32,9%) tem vínculos laborais sem termo e aufere
pelo menos o salário mínimo.

Os dados do estudo resultam da observação dos últimos dados
disponíveis do Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (ICOR),
relativos a 2018, aliada à realização de uma análise qualitativa
baseada em "91 entrevistas aprofundadas por todo o país".

Segundo o coordenador da equipa de 11 pessoas, essa metodologia
inédita permitiu representar a "diversidade da pobreza em Portugal",
para perceber "como é que a pobreza se organiza" e porque "as pessoas
em situação de pobreza não são todas iguais".

Ordenados baixos não chegam e quase 50% dos desempregados estão em
situação de pobreza

A análise conclui assim que praticamente um terço dos pobres (quase
33%, ou seja, quase um em cada três) são trabalhadores. Juntando-lhes
os precários, percebe-se que mais de metade das pessoas em situação de
pobreza trabalha, o que significa que "ter um emprego seguro não é
suficiente para sair de uma situação de pobreza", ressalva o
documento.

Para Fernando Diogo, "foi uma surpresa" constatar que "a maior parte
dessas pessoas era efetiva" nas empresas há vários anos, uma vez que
os investigadores estavam à espera de encontrar sobretudo pessoas com
uma trajetória de emprego "em carrossel", em que se alterna entre
atividade laboral precária, períodos de desemprego e "zona difusa
entre trabalho e não trabalho".

Há uma parte dos pobres que são efetivos nos seus postos de trabalho,
muitos há mais de 10 e alguns há mais de 20 anos. Claro que com
ordenados baixos, que têm de dividir o seu ordenado com a família, com
uma família numerosa", enfatizou.

Os resultados apresentados mostram também que em 2018 quase metade dos
desempregados em Portugal estava em situação de pobreza, o que
significa que são o grupo onde a taxa é mais elevada e tem vindo a
aumentar.

Quase um quinto dos portugueses estão em situação de pobreza

Apesar das oscilações na variação da taxa de pobreza ao longo do
período observado, entre 2003 e 2019, "o valor está sempre próximo de
um quinto do total da população" e os últimos indicadores, de 2018,
são de 17,2%, o equivalente a 1,7 milhões de pessoas.

A taxa de pobreza infantil "é persistentemente mais elevada do que a
taxa global", frisou o coordenador do estudo, que alerta para duas
tipologias de famílias com taxas de pobreza acima da média global:
famílias monoparentais ou onde existem dois adultos com três ou mais
crianças.

"Cerca de um terço dos indivíduos de cada uma destas categorias está
em situação de pobreza, o que é um valor muito significativo. Há muito
poucas categorias que tenham valores deste género", acentuou Fernando
Diogo. "Os agregados onde existem crianças são aqueles em que a taxa e
pobreza é mais elevada", acrescentou.

O estudo destaca a "dimensão familiar" da pobreza, uma vez que muitos
entrevistados são pobres porque não têm rendimentos, eles são
irregulares ou são baixos e têm de os partilhar.

A pobreza herda-se: há uma "reprodução intergeracional da pobreza"

A análise confirmou ainda a "natureza estrutural" do fenómeno,
mantendo-se uma parte expressiva da população nessa situação ao longo
de anos e existindo um "processo de reprodução intergeracional da
pobreza", identificando-se pessoas que "cresceram num contexto mais ou
menos de privação, condicionando, à partida, as suas oportunidades na
vida".

A entrada precoce no mundo do trabalho e o abandono dos estudos são
alguns dos principais fatores.

As pessoas dos quatro perfis identificados têm em comum estarem, a
maior parte, em situação de pobreza "há muito tempo e terem herdado
essa situação dos pais", conclui a investigação, vertida em livro.

O estudo permite ainda estimar a probabilidade acrescida de pobreza de
determinados grupos ou categorias sociais, como os que têm como
principal fonte de rendimento do agregado transferências sociais do
Estado, à exceção das pensões, e os agregados com dois adultos e três
ou mais crianças.

Fernando Diogo menciona ainda os "três D da pobreza: desemprego,
doença e divórcio", fatores que produzem essa situação, impedem que as
pessoas saiam dela e a podem intensificar.

Segundo o coordenador do estudo, "a maior parte das pessoas não acha
que seja pobre" ou relativiza em comparação com situações de miséria.

"As pessoas não estão a viver situações fáceis e racionalizam, de
forma a conseguirem sobreviver à sua própria situação e minimizar o
impacto stressante da situação em que vivem", explica Fernando Diogo,
à agência Lusa.

Para o coordenador do estudo, a estruturação da pobreza em quatro
perfis é importante porque permite dar respostas a problemas
específicos.

"Há diferentes perfis de pobreza em Portugal que que acabam por
requerer diferentes abordagens. Se por um lado isto faz avançar o
conhecimento sobre a pobreza em Portugal, por outro permite uma
discussão sobre o assunto e permite a aplicação de políticas públicas
de combate à pobreza mais eficazes, porque mais próximas do alvo",
referiu Fernando Diogo.

A taxa de pobreza corresponde à percentagem de indivíduos com
rendimento inferior a 60% do rendimento mediano observado no país num
determinado ano e situava-se, em 2018, nos 501,2 euros mensais.

Pandemia traz mais "regressados à pobreza" do que "novos pobres"

As pessoas que vão cair em situação de pobreza devido à pandemia serão
quem saiu e regressa a essa condição e quem já se encontrava em
cenários de vulnerabilidade, e não "novos pobres", vaticina um estudo.

De acordo com o estudo "Pobreza em Portugal – Trajetos e Quotidianos",
faz "mais sentido falar de vulneráveis empobrecidos (e regressados à
pobreza) do que de novos pobres".

No caso da crise provocada pelos efeitos da covid-19, marcados por "um
elevado grau de incerteza", por depender "da intensidade e da sua
duração", o que está em causa é "um possível aumento da intensidade da
pobreza" e, para os mais vulneráveis, "um (re)ingresso nessa
situação", segundo o estudo.

"A maior parte das situações de pobreza em Portugal são pobreza
tradicional, porque persistente ao longo da vida dos indivíduos e
porque há uma tendência forte para se reproduzir entre gerações",
enfatizou, em declarações à agência Lusa, o coordenador da análise,
Fernando Diogo, professor de Sociologia na Universidade dos Açores.

Embora não desvalorize as consequências da atual crise na criação de
dificuldades em quem antes não as tinha, o investigador acredita que
"esse impacto vem acrescentar pouco ao que já existe" em relação à
população "com determinadas caraterísticas".

"O que está escrito sobre a pobreza em Portugal não vai ser muito
modificado pelo impacto da covid-19", antecipa Fernando Diogo, que
antevê "mais gente em situação de pobreza".

Segundo o académico, "muitas são pessoas que saíram da pobreza e
regressam à pobreza, muitas são pessoas que estão em situação de
vulnerabilidade, que pouco se distinguem dos pobres, a não ser por
rendimentos um pouco acima do limiar de pobreza", e qualquer fator que
afete a estabilidade ou a conjuntura os faz cair numa situação de
pobreza.

"Pessoas que verdadeiramente entram pela primeira vez em situação de
pobreza, apesar de tudo, continua a ser uma minoria. Claro que existe,
claro que está a aumentar agora com a crise, mas não é isso que é o
cerne da pobreza em Portugal", argumentou.

Os "vulneráveis empobrecidos" estão (também) na restauração e serviços

Fernando Diogo vincou que parte importante dos pobres em Portugal são
indivíduos que alternam entre a pobreza e a vulnerabilidade.

"Qualquer incidente de percurso, como o desemprego numa situação de
crise, os faz voltar à situação de pobreza, não sendo por isso
exatamente novos pobres, mas indivíduos com retorno à condição de
pobreza. O que está em causa, portanto, mais do que novos pobres, são
os vulneráveis empobrecidos, muitos regressados à situação de
pobreza", reforçou.

No estudo divulgado esta segunda-feira é referido que quem trabalha em
setores como o turismo, a restauração ou os serviços em geral está
particularmente vulnerável ao desemprego. Quem tem vínculos precários
ou informais também está mais suscetível de passar a viver num
contexto de pobreza.

"Contudo, a falência das empresas trará, potencialmente, para a
pobreza, mesmo os indivíduos com vínculos mais sólidos", com a
agravante de se um trabalhador ficar desempregado poder "levar todo o
seu agregado para a pobreza", dependendo da configuração do agregado
familiar, antecipa o estudo.

O documento alerta que "o tempo pode ter um efeito cumulativo no
desenvolvimento desta situação", já que à medida que os subsídios de
desemprego terminarem, os rendimentos das famílias diminuirão".

Quem está desempregado ou desocupado vai ver reduzidas as
possibilidades de "conseguir uma atividade remunerada, por precária e
informal que seja", enquanto trabalhadores precários ou informais
"mais facilmente podem ser dispensados" e "muitos não terão, sequer",
direito a apoios sociais.

Os 11 investigadores que participaram no estudo sublinham que "a
pandemia e suas consequências estão já a ter um efeito na pobreza em
Portugal, intensificando-a e aumentando o número de pessoas nessa
situação", com a certeza de que "não está a atingir todos por igual e
os mais pobres estão a ser mais afetados".

O que leva alguém a passar para o lado de lá da pobreza: os três D's

O desemprego, a doença e o divórcio são fatores que contribuem para a
entrada numa situação de pobreza ou que impedem que se saia dessa
condição, segundo o estudo "Pobreza em Portugal – Trajetos e
Quotidianos".

O documento divulgado esta segunda-feira, chama a esses três processos
de produção, reprodução ou intensificação dessa situação "os três D da
pobreza".

"Se nos debruçamos sobre os fatores que levam as pessoas entrar na
pobreza, são os mesmos que impedem que elas saiam", disse, em
declarações à agência Lusa, o coordenador do estudo, Fernando Diogo,
professor de Sociologia na Universidade dos Açores.

O académico realçou que esses três motivos individuais que "afetam
fortemente a vida" das pessoas "e constrangem as suas escolhas" devem
ser entendidos também "a nível contextual".

Fernando Diogo enfatizou a articulação com a organização do mercado de
trabalho, "onde se incluem as questões da precariedade, da
informalidade, dos baixos salários e da zona intermédia entre emprego
e desemprego"; dos apoios estatais, como são os casos dos apoios na
doença e no desemprego, e das questões mais conjunturais, como
períodos de crise.

"Claro que há sempre casos que saem disto, mas a esmagadora maioria
dos casos são explicáveis com a conjugação destes fatores, em
geometria variável e no respeito pela singularidade de cada perfil e
de cada percurso individual", vincou.

Doenças, nomeadamente crónicas ou incapacitantes, têm ligação estreita
com a pobreza

A equipa que desenvolveu o estudo, salientou o autor, ficou
surpreendida "com o peso da doença", mencionado por muitos dos 91
entrevistados, "para ajudar a explicar a situação de pobreza delas ao
longo do seu trajeto", especialmente entre os reformados, mas também
os desempregados.

Fernando Diogo sublinhou referir-se a doenças crónicas ou
incapacitantes, como deficiência.

"Os relatos vão no sentido de mostrar como a incidência da doença
afetou as suas vidas ao longo de toda a sua vida. A doença ajuda a
explicar porque é que estão na situação difícil em que estão",
salientou o coordenador, que se refere maioritariamente ao perfil dos
reformados, mas também aos desempregados, em particular de longa
duração.

Tal como a doença, dos próprios ou de familiares, é referida a morte
de pessoas do agregado como fator que dificultou a trajetória dos
entrevistados no âmbito do estudo ou que precipitou a entrada num
contexto de pobreza.

A doença ou a morte, realçou o investigador, não é um problema
individual, mas com impacto no círculo familiar, tal como acontece com
o desemprego.

Também o divórcio, ou a separação dos casais, segundo o estudo, "em
situações que já de si são de grande fragilidade, leva facilmente os
indivíduos para a pobreza, considerando a redução de rendimentos
causada pela separação e os seus efeitos em cascata, incluindo na
atividade laboral".

"Estes elementos estão presentes na trajetória de vida dos
entrevistados, agravando situações já de si difíceis ou condicionando
fortemente a vida dos indivíduos, reduzindo a sua margem de manobra e
tornando as suas possibilidades de saírem da situação de pobreza mais
remotas", acentuou o estudo hoje apresentado.

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