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PENSANTES

Outros pensamentos, ideias e palavras que nos fazem pensar...

quinta-feira, junho 30, 2005

#Os poetasnão morrem

Eugénio disse...

"( ... ) desde pequeno, de abundante só conheci o sol e a água...
aprendi que poucas coisas há absolutamente necessárias. São essas coisas
que os meus versos amam e exaltam. A terra e a água, a luz e o vento (...
)".

Um adeus?que foi ele que o escreveu:

Adeus

Já gastámos as palavras pela rua, meu amor,
e o que nos ficou não chega
para afastar o frio de quatro paredes.
Gastámos tudo menos o silêncio.
Gastámos os olhos com o sal das lágrimas,
gastámos as mãos à força de as apertarmos,
gastámos o relógio e as pedras das esquinas
em esperas inúteis.

Meto as mãos nas algibeiras e não encontro nada.
Antigamente tínhamos tanto para dar um ao outro;
era como se todas as coisas fossem minhas:
quanto mais te dava mais tinha para te dar.
Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes.
E eu acreditava.
Acreditava,
porque ao teu lado
todas as coisas eram possíveis.

Mas isso era no tempo dos segredos,
era no tempo em que o teu corpo era um aquário,
era no tempo em que os meus olhos
eram realmente peixes verdes.
Hoje são apenas os meus olhos.
É pouco mas é verdade,
uns olhos como todos os outros.

Já gastámos as palavras.
Quando agora digo: meu amor,
já não se passa absolutamente nada.
E no entanto, antes das palavras gastas,
tenho a certeza
de que todas as coisas estremeciam
só de murmurar o teu nome
no silêncio do meu coração.

Não temos já nada para dar.
Dentro de ti
não há nada que me peça água.
O passado é inútil como um trapo.
E já te disse: as palavras estão gastas.

Adeus.
Eugénio de Andrade

Sent by: Bruno Martinho

terça-feira, junho 28, 2005

#Pedaços de livros...


"Irrita-me a felicidade de todos estes homens que não sabem que são
infelizes. A sua vida humana é cheia de tudo quanto constituiria uma série
de angústias para uma sensibilidade verdadeira."

Bernardo Soares In "Livro do Desassossego"

"Podemos morrer se apenas amámos."

Bernardo Soares In "Livro do Desassossego"

"Precisar de dominar os outros é precisar dos outros"

Bernardo Soares In "Livro do Desassossego"

"Um homem que se encosta às circunstâncias pode cair (?)"

Gonçalo M. Tavares In "A máquina de Joseph Walser"

"O cepticismo é a castidade do intelecto e é vergonhoso abandoná-lo
demasiado cedo ou ao primeiro que apareça: há nobreza em conservá-lo serena

e orgulhosamente durante a longa juventude, até finalmente, na maturidade
do
instinto e do entendimento, ser possível trocá-lo em segurança por
fidelidade e felicidade."

George Santayana In "Scepticism and Animal faith, IX"

"I will tell you in another life when we're both cats"
Vanilla Sky

Sent by: Rita Silva

OPríncipe


O homem que eu amo
Veio de tanto eu pedir
Mas que eu parei de esperá-lo
Veio quando eu ao depená-lo
Do meu sonho ou receio
Permiti que em vez de ele ir e ser o fim
Ele no meio de mim fosse só o meio
Não o meio no sentido de jeito, de tacto ou de modo
O meio no sentido de enquanto, de durante, de presente
Quando eu parei de querer ter garantias
No departamento da intimidade
Quando eu parei de querer ressarcir aqui
O que eu perdi na antiguidade
O meu homem chegou
Cheio de saudade
Ocupando o seu lugar de meio
E a sua inteira metade.

Eloísa Lucinda

Sent by: Rita Silva

segunda-feira, junho 27, 2005

#Haverá saída? MST


Haverá saída?
Miguel Sousa Tavares

Várias vezes me tenho colocado esta pergunta, mas nunca tantas vezes como
agora: será Portugal viável? Haverá ainda, na consciência da maioria dos
portugueses, a noção de que um país se constrói com o esforço, a
iniciativa, o trabalho e, se necessário, o sacrifício de todos, na medida
das respectivas responsabilidades? De que um país não pode depender apenas
ou principalmente do Estado, do Governo, das iniciativas e dos dinheiros
públicos? Que a cidadania não é só direitos adquiridos e benesses
garantidas eternamente, sem relação com a produtividade, o crescimento, a
competitividade, a qualidade daquilo que se faz e se produz?
Tenho as maiores dúvidas. Como todos, oiço os portugueses a falar, todo o
tipo de portugueses, e constato que a esmagadora maioria não vai, nem quer
ir, além do inverso da célebre frase de Kennedy: limitam-se a perguntar o
que pode o país fazer por eles. Ouvindo-os, eles têm sempre razões de
queixa e matéria para reivindicarem do Estado e do Governo, seja ele qual
for, que episodicamente o represente. Mesmo aqueles que tinham mais
obrigação de estarem informados e reflectirem sobre a informação de que
dispõem reagem às más notícias como se elas fossem matéria abstracta,
insusceptível de descer ao concreto e poder afectá-los. Lêem que o Estado
português vive há vários anos acima das suas disponibilidades, gastando
mais do que tem e endividando-se para as gerações futuras, mas, ao mesmo
tempo que reconhecem que isso não pode continuar, recusam qualquer medida
de contenção de gastos públicos que mexa com os seus "direitos adquiridos".
Lêem (e sabem que é incontroverso) que as pessoas se reformam cada vez mais
cedo e vivem até mais tarde, consumindo simultaneamente maiores cuidados de
saúde, o que torna financeiramente insustentável o actual sistema de
pensões e reformas, mas, quando se pretende reformar o seu estatuto
particular, aqui d"El rei, que "descontei toda a vida para a Segurança
Social e não me podem agora mexer nas minhas expectativas!". Lêem que os
portugueses têm o maior índice europeu de consumo de medicamentos, mas
acham um roubo que o Governo diminua a sua comparticipação nos
medicamentos, que, além do mais, constitui uma forma de assegurar um
negócio florescente e de risco garantido a laboratórios e farmácias. Lêem
que os professores trabalham poucas horas em comparação com os seus colegas
europeus, ganhando proporcionalmente mais e reformando-se mais cedo, ao
mesmo tempo que a Educação consome recursos desproporcionados e com
resultados menos que medíocres. Mas, qualquer tentativa de mexer no que
está, dá logo direito a uma greve aos exames nacionais - com a compreensão,
aliás, de um juiz de Ponta Delgada, que deve achar que, de "irremediável"
só existe a morte, e, portanto, qualquer prejuízo desproporcionado que uma
greve possa causar, mesmo a centenas de milhares de alunos, nunca será
suficiente para pôr em causa o direito à greve, sem serviços mínimos.
Aliás, eles próprios, juízes, também sabem, e sabem que nós sabemos, que a
justiça é talvez a coisa que pior funciona em Portugal, mais lenta, mais
ineficaz, mais cara e mais afastada das necessidades dos cidadãos. Mas
aquilo com que unicamente os ouvimos preocuparem-se é com o seu estatuto,
as suas férias, a manutenção do seu regime de total desresponsabilização
profissional.
A desresponsabilização é, de facto, a grande reivindicação de quem se
habituou a trabalhar para o Estado ou a depender do Estado. Somos um país
onde muito pouca gente está disposta a abrir caminho por si, a assumir
responsabilidades e correr riscos, sem a cobertura do emprego público, do
favor público ou do dinheiro público. Ainda esta semana, Jorge Sampaio
chamava a atenção para a inexistência de financiamento ao capital de risco
por parte da banca, em comparação com a facilidade do financiamento ao
consumo, de risco praticamente nulo. Em Portugal, 63 por cento do capital
de risco é assumido pelo sector público; em Espanha é 9 por cento, o resto
é privado. A diferença é eloquente e explica muita coisa: em Portugal, a
formação de cartógrafos e navegadores, a construção dos navios, o pagamento
das tripulações, todo o financiamento das Descobertas e a comercialização
dos produtos foram de iniciativa pública; em Espanha, foram empresários
privados de Sevilha que ajudaram a financiar a primeira viagem de Colombo,
início da expansão ultramarina de Castela. Talvez tenha começado aí a
história da nossa progressiva demissão cívica, agravada, nos tempos
recentes, por três momentos decisivos: o salazarismo, o gonçalvismo e os
dinheiros europeus. O primeiro propôs-nos o Estado protector, inflexível na
defesa do nosso bem e em tornar-nos imunes às tentações libertárias vindas
de fora; o segundo propôs-nos o Estado suficiente, motor da história,
infinitamente justo e generoso, distribuindo a cada um em função das suas
necessidades e a ninguém em função do seu mérito; o terceiro propôs-nos o
Estado oportunidade, aberto a todos os espertos que quisessem fazer fortuna
rapidamente ou ganhar dinheiro fácil, bastando estender a mão e declarar-se
qualquer coisa: agricultor, empresário, formador, inovador, isolado no
interior ou ilhas, enfim, representante adequado dessa coisa enxovalhante a
que chamam "a especificidade portuguesa" - o direito de esmolar eternamente
à conta de sermos piores, mais atrasados e mais incompetentes do que os
outros.
Há cada vez mais gente que, olhando para o diagnóstico frio daquilo que
somos e do que valemos, vai insinuando a ideia de que o menos mau seria
sermos absorvidos pela Espanha. Nem adianta entrar em questões de
patriotismo para concluir que eles estão errados na sua última esperança:
seguramente que a Espanha não nos quereria para sermos em relação a ela o
que a Madeira autónoma é em relação a nós. A Espanha quer é que nós
continuemos a ser o que somos, como vizinho: um mercado escancarado e sem
competitividade para enfrentar a sua concorrência e uma espécie de
laboratório daquilo que deve ser evitado - como temos sido para eles, desde
1975. Agora, para nos pagar o fado ou a "especificidade", isso de certeza
que não querem. Resta-nos esperar que a União Europeia não se desagregue
nem se canse de nos aturar, porque, então sim, ficaremos face a face com
nós próprios e corremos o risco de concluir que nos tornámos um país
inviável.
Peço desculpa se isto soa a demasiado pessimismo negativista. Mas, nestes
dias em que todos só falam dos seus interesses e só olham para o seu
próprio umbigo, onde estão os sinais de esperança? Jornalista

Sent by: Ana Collaço

quinta-feira, junho 23, 2005

?Lágrima de Preta?

?Encontrei uma preta
que estava a chorar,
pedi-lhe uma lágrima
para a analisar.

Recolhi a lágrima
com todo o cuidado
num tubo de ensaio
bem esterilizado.

Olhei-a de um lado,
do outro e de frente:
tinha um ar de gota
muito transparente.

Mandei vir os ácidos,
as bases e os sais,
as drogas usadas
em casos que tais.

Ensaiei a frio,
experimentei ao lume,
de todas as vezes
deu-me o que é costume:

nem sinais de negro,
nem vestígios de ódio.
Água (quase tudo)
E cloreto de sódio.?

In ?Máquina de Fogo? (1961)
António Gedeão

Sent by: Rita Silva

Passamos...

Hoje passamos a nossa vida a passar, porque é fácil e confortável.
Passamos nos outros, os outros passam em nós, mas só passamos. Passamos nas

ruas e no mundo, mas só passamos. Até quando estamos em férias limitamo-nos

a passar e o próprio turismo de hoje reside no culto da passagem, rápida
para não deixar marcas ou qualquer coisa desagradável.
Somos um mero número num registo ou numa estatística, um nome ou uma cara
noutros casos, os outros são números, nomes ou caras e isso é conforto para

nós. Se somos incógnitos o mundo não nos incomoda e avalia-nos
imparcialmente, exigindo unicamente em troca a nossa indiferença, ou seja,
a
nossa alma.
Somos só transporte e usamos os outros como transporte e ainda tendemos a
achar que tal é coerência e justiça. Que direito temos nós em influir nos
outros?
Ao não conhecer o outro, e porque conhecer é mais que saber um nome ou uma
profissão, opiniões ou inclinações políticas, os problemas do mundo
desaparecem e só os nosso são reais. Conhecer o outro é saber o que lhe vai

na alma e isso, é um risco demasiado elevado que não nos arriscamos a
correr. Conhecer implica ganhar um afecto, um amor e, entregar o que vai na

nossa própria alma, essa mesma alma que há muito escolhemos trocar por um
número.
Quantas pessoas podemos dizer que conhecemos realmente? Quantos amigos?
Quantos familiares? Por quantos locais, escolas, trabalhos, passámos sem
deixar uma marca ou mesmo uma opinião?
Será que ao passarmos em tudo e por tudo e ao deixarmos passar tudo por
nós,
não estaremos a passar ao lado de nós próprios, dos nossos sentimentos, da
nossa vida, da nossa alma?
Somos corpo sem alma, sem espírito e trocamos diariamente os nossos afectos

com amigos, namorados, familiares ou mesmo a pessoa que sorri na rua, por
todo o tipo de objectos materiais. E porquê? Porque eles não pedem, não
pensam e não sentem?

Passam,
Pois passam
Se não passassem talvez fosse pior.
Passa o tempo, passa o Amor
Cambaleantes, aos tropeções,
Velozes e eficazes.
Acima de tudo passam,
Como gente no metro.
Passam para cá ou para lá,
Mas passam.
Passam e não ficam,
E todos somos transporte.
Passam os outros em nós,
Passamos nós nos outros.
Nada fica, apenas passa.

Anónimo

terça-feira, junho 21, 2005

#A obra de arte...

Vejo o quadro com todas as suas cores enquanto ainda o pintamos. Cada um
com a sua cor. Ninguém acredita que um dia ele ficará completo, lindo, a
obra de arte, a única.

O esboço está completo desde o início da eternidade, e no entanto, uns
nunca viram beleza e por isso não o reconhecem. Outros recusam o sonho, a
realidade do Homem, a plenitude. Outros pensam que podem pintar um quadro
só seu mas misturar as cores não é uma arte que esteja nas nossas mãos,
apenas fabricar o melhor pincel. Nem fabricar a tela podemos. Estará a
felicidade em sermos limitados?

A imensidade da tela explode o meu coração, agora fecho os olhos e sinto a
felicidade de ver as cores...

Também eu sou cor, também eu sou pincel, único, especial, irrepetível como
todas as cores e pincéis. A minha cor está definida, eu já vi o esboço, vou
pintar a vida, vou pintar o amor.

A única obra de arte.

Jorge Mayer

segunda-feira, junho 20, 2005

#Convocar a alma

"A alma é vasta" dizia Fernando Pessoa. E se nesse poema denunciava a
escravidão do "ter" e do "viver porque a vida dura", que diria do convite a
usar pulseiras coloridas (oferecidas por um jornal diário) para mostrar "o
que lhe vai na alma"? A campanha é simples: "o amor (e tudo de bom...) está
na moda" e, por isso, coleccione as pulseiras que correspondem aos estados
da sua alma e vá para a rua com os seus "pulsos felizes"! Não interessa
muito se tudo isso é verdade ou não, se fazemos alguma coisa para mudar o
que está mal, desde que andemos na moda e de "alma na montra" (que agora
são os nossos pulsos), tudo bem! Ou tudo mal porque tristes almas temos se
precisamos de andar a mostrá-las desta maneira!
"Convoquem a alma" é o título do mais recente livro do professor
Carvalho Rodrigues, cientista que nos habituámos a conhecer como "pai do
satélite português". Ainda não o pude ler mas fiquei encantado com o
título e já saboreio antecipadamente as linhas luminosas de um pensamento
que costuma interpelar-nos. Convocar a alma é como o convite a acordar de
uma letargia ou de uma rotina feita de coisas vazias. Apela a uma
interioridade que a pressa e a eficácia teimam em não conceder espaço.
Pede uma coragem de sermos autênticos e inteiros no meio da fragmentação
e do culto da aparência que fazem de nós fantasmas. Não está mesmo na
moda e não pode ser feita por decreto como o aumento dos impostos. A alma
não pode ser exigida nem imposta: precisa ser convocada! Como fazem
alguns poetas!
Queria encontrar a palavra límpida e luminosa para descrever toda a
força da poesia de Eugénio de Andrade. Uma palavra como as que ele nos
deixou, fruto de um amor que diz o essencial, numa simplicidade laboriosa
e purificada de quem procura a justiça em tudo. A justiça das coisas e
das pessoas revelada na beleza que pode ser cantada. É, para mim, o poeta
da alma, da "alma das coisas", mas também dessa identidade profunda que
cada pessoa é dentro de si: "Na orla do mar,/ no rumor do vento,/ onde
esteve a linha/ pura do teu rosto/ ou só pensamento/ (e mora, secreto,/
intenso, solar,/ todo o meu desejo)/ aí vou colher/ a rosa e a palma./
Onde a pedra é flor,/ onde o corpo é alma."
Pode alguém matar a alma? Que a deixamos bem maltratada com tantas
coisas, isso é verdade. Que inventamos novas formas de nos afastarmos do
essencial e a aprisionamos de muitas maneiras, também. Mas creio que o
amor de Deus é sempre mais forte. E aí estou com o Eugénio: "Nada podeis
contra o amor./ Contra a cor da folhagem,/ contra a carícia da espuma,/
contra a luz, nada podeis./ Podeis dar-nos a morte,/ a mais vil, isso
podeis/ -- e é tão pouco."

Vitor Gonçalves

sexta-feira, junho 17, 2005

#Change...

Nada perdura, senão a mudança.
Heraclito

Um navio pode dar à costa por força do mau tempo,
mas encalhar tem toda a mediocridade e azedume do erro humano.
Joseph Conrad

O conforto é altamente viciante...
Rita Silva

Change the world or you will sink in Prozac, Viagra and Valiums
Anónimo

Love is not in your bed, it's in your smile!
Anónimo

Life is not a game, it's growing up.
Anónimo

You can't see what really matters. It's invisible!!
Anónimo

quarta-feira, junho 15, 2005

#A felicidade

Não estamos predispostos a ser infelizes. E não há receitas para atingir a
felicidade...


(Embedded image moved to file: pic15890.gif)O que é que se passa no céu?
Todos temos uma ideia clara do que nos acontecerá se formos parar ao
inferno mais coisa menos coisa, ardemos lentamente sujeitos às maiores
torturas? Mas e no céu? Em que é que as almas ocupam o seu tempo? A jogar
às cartas, ouvir música e ver cinema? A conversar com as pessoas que
amaram? (e se forem várias, quem fica com quem?). E como se evita o
aborrecimento se não há um fim à vista? Se calhar o céu é céu precisamente
porque nos deixamos de preocupar com estas questões? mas não deixa de ser
algo aterradora a perspectiva de nem no céu conseguirmos identificar a
felicidade.

E, no entanto, há quem a pretenda realizar na terra. Um livro recente de
Richard Layard, um conhecido economista britânico, procura recolocar o
conceito de felicidade no centro das políticas públicas. Layard retoma a
tese utilitarista de Bentham, que entendia que o principal objectivo de
uma sociedade deve ser a maximização da felicidade de todos de forma
igual. Por outras palavras, uma política deve ser prosseguida quando ela
promove a felicidade do maior número. A dificuldade está em medir a
felicidade. Layard socorre-se dos mais recentes estudos sobre a felicidade
em disciplinas como a Neurologia, Psicologia e Sociologia para tentar
elaborar um critério operativo de felicidade. Desses estu- dos podemos
retirar algumas conclusões interessantes.

O que é a felicidade?

A primeira conclusão é que a felicidade pode ser medida ela tem
correspondência numa determinada actividade neurológica no cérebro.

A segunda conclusão é que a felicidade é profundamente relativa e
"invejosa". A nossa felicidade resulta de uma comparação com a situação
dos outros (assim, por exemplo, se todos ficamos mais ricos a nossa
felicidade individual não tende a aumentar!).

A terceira conclusão é que a felicidade "educa-se" aquilo que nos traz
felicidade muda com o conhecimento, educação e exposição a mundos
diferentes. As nossas preferências não são estáticas. É por isso que,
quanto maior o nosso conhecimento da arte, maior a felicidade que ela nos
pode transmitir.

A quarta conclusão é que a felicidade aprecia a estabilidade e a companhia
a permanência no mesmo emprego traz, aparentemente, mais felicidade que
mudanças frequentes para empregos melhores. No mesmo sentido, os estudos
realizados indicam que as pessoas casadas são em média mais felizes que as
solteiras, divorciadas ou separadas (por esta ordem decrescente de
felicidade?), incluindo, com alguma surpresa, na sua vida sexual (o que o
estudo não diz é se essa felicidade resulta de ter sexo dentro ou fora do
casamento?).

A quinta conclusão é que a felicidade vicia e habitua-se facilmente.
Assim, algo que nos dá grande felicidade inicial vai diminuindo a
felicidade que nos traz à medida que nos habituamos. Só que,
paradoxalmente, se voltamos a perder essa coisa, a infelicidade que isso
nos traz é muito superior à felicidade que nos trouxe quando não a
tínhamos. Isto explica a razão pela qual o dinheiro não traz (sempre?)
felicidade. A relação entre nível de vida e felicidade individual é
verdadeiramente relevante apenas ao nível do limiar da sobrevivência. A
partir daí a correlação entre aumento do rendimento e aumento de
felicidade vai diminuindo de forma notável vamo-nos habituando a gastar o
dinheiro que temos! Só que, se perdermos parte desse rendimento, seremos
mais infelizes do que antes de o termos? É a velha sabedoria popular de
que só damos valor ao que temos quando deixamos de o ter ou, expressa em
sentido económico, de que o valor de um bem é mais elevado quanto mais
raro for.

O Estado e a felicidade. Estas conclusões são, nalguns aspectos, algo
banais, mas podem ter consequências importantes se levadas a sério. Elas
colocam um desafio interessante na definição das prioridades das políticas
públicas ao questionar a sua subordinação ao objectivo de maximização da
riqueza associado ao crescimento económico e ao permitir introduzir outros
elementos a que as escolhas públicas devem atender (como a estabilidade).
Mas também servem para justificar algumas das políticas públicas actuais
as políticas redistributivas vêem a sua justificação reforçada pelo facto
de o mesmo dinheiro trazer mais felicidade a quem menos tem; os impostos e
outras medidas podem ser necessários, como refere Layard no seu livro,
para evitar que as pessoas trabalhem de mais (uma vez que após certo nível
elas deixam de retirar mais felicidade da remuneração acrescida que
recebem).

Há, no entanto, um problema delicado na utilização de um critério de
felicidade para orientar as políticas públicas. É que a felicidade é,
acima de tudo, função das preferências individuais de cada um. A
felicidade é menos um produto daquilo que nos acontece do que da forma
como concebemos o que nos acontece. É mais autonomamente determinada
(dependente da nossa concepção do sentido da vida) do que hetero-nomamente
condicionada (dependente das circunstâncias que afectam o sentido da nossa
vida).

É, neste ponto, que se coloca a questão filosófica da definição da
felicidade. Desde logo, a felicidade é profundamente individual. Nesse
caso, não devemos procurar fazer as pessoas felizes (seria a ditadura da
bondade!), mas, como diz a Declaração de Independência Norte-Americana,
garantir-lhes o direito à procura da felicidade.

A procura da felicidade. E há várias formas de procurar a felicidade. Há
os que procuram uma espécie de "felicidade moral", o que corresponde à
ideia aristotélica de uma vida vivida com um certo sentido (que pode ser,
como defendia São Tomás de Aquino, o conhecimento de Deus). A felicidade
intelectual mas não sensorial. A felicidade é assim distinguida do prazer,
o que, confesso, não me faz muito feliz! Curiosamente, um outro
utilitarista (Stuart Mill) aceita a ideia de prazer associada à felicidade
apenas não é o prazer que algo nos traz que determina a felicidade, mas,
antes, o prazer que isso pode trazer aos outros (uma forma de felicidade
que procuro incutir nos outros!). Em sentido bem diferente, há também a
felicidade epicurista ou hedonista em que o nosso prazer é a nossa
felicidade. Só que o prazer dissociado de um sentido da vida reduz-se a
uma mera satisfação ou contentamento. É um analgésico da felicidade:
alivia mas não cura.

Hoje em dia, a procura da felicidade parece dividida em dois mundos bem
opostos. Os que defendem uma felicidade modesta, segundo a qual apenas
devemos retirar felicidade das coisas que podemos ter! (não admira que
Santo Agostinho, o seu autor original, também defendesse que o único
verdadeiro amor é aquele que apenas depende da pessoa que nos ama). Ou os
que defendem uma felicidade pós-moderna, feita de "boas experiências" e da
procura incessante do prazer, liberto de outro sentido que não a sensação
momentânea que nos causa.

Enquanto, no primeiro caso, a felicidade amarra-nos ao que temos e somos,
no segundo, ela transforma liberdade em instabilidade e insegurança
permanentes. No entanto, se há coisa que os estudos recentes nos mostram é
que a felicidade necessita de estabilidade. O prazer é maior quanto maior
for a sua relação a um sentido da vida (a atribuição de sentido à nossa
vida, o que é diferente do sentido da vida em geral). É este último que
conduz o prazer à nossa felicidade.

É em relação com o sentido da nossa vida que podemos encontrar a
felicidade. A felicidade é, em larga medida, uma competência que podemos
melhorar. Não estamos predispostos a ser infelizes mas também não existem
receitas para atingir a felicidade. Acima de tudo e tal como dizia Thomas
Paine, é necessário para a felicidade do homem que ele seja
intelectualmente fiel a si próprio. E a si o que é que a/o faz
verdadeiramente feliz?


Miguel Poiares Maduro DN050615(miguel.maduro@curia.eu.int)
Sent by: Povo

Amanhã...

"O homem do amanhã é o homem do nunca"
Sent by: Bruno Martinho

"Só existem dois dias no ano em que nada pode ser feito. Um chama-se ontem
e o outro chama-se amanhã, portanto hoje é o dia certo para amar,
acreditar, fazer e principalmente viver."
Dalai Lama

PS - O site já se encontra revisto e com os arquivos dos pensantes
(www.opensante.blogspot.com)

quinta-feira, junho 02, 2005

#E se um spray pudesse aumentar aconfiança que temos nos outros?

Experiências com uma molécula natural
02.06.2005 - 13h24 Ana MachadoPÚBLICO
http://www.publico.clix.pt/shownews.asp?id=1224758&idCanal=13

E se lhe dissessem que é possível aumentar a confiança que as outras
pessoas têm em si, bastando para isso destapar uma garrafinha e soltar uma
espécie de perfume da confiança? Uma equipa da Universidade de Zurique, na
Suíça, e da Universidade de Claremont, na Califórnia, desenvolveu um spray
nasal à base de ocitocina, uma molécula com funções de hormona e de
neuromodulador, que se propõe fazer isso mesmo.

Os cientistas relatam hoje na revista científica britânica Nature que
propuseram a um grupo voluntários jogar um jogo de confiança entre
investidores e gestores desse investimento. Os voluntários que usaram o
spray nasal de ocitocina confiavam mais nos gestores do que os que não
foram sujeitos à ocitocina.

A ocitocina é mais conhecida pela sua função hormonal na contracção do
útero, durante o trabalho de parto, sendo por isso usada na indução do
parto, e durante a amamentação. Há ainda estudos que a relacionam com as
relações de amizade e enamoramento, o fortalecimento dos laços entre mãe e
filho e o comportamento sexual.

Mas ela também funciona, ao nível dos neurónios, como um péptido (uma
molécula com mais de dois aminoácidos), com função neuromoduladora,
produzida no hipotálamo, a grande região cerebral responsável pelo controlo
das emoções, e ao nível da amígdala, o reduto cerebral dos comportamentos
sociais.

Um factor de sucesso

A equipa liderada por Michael Kosfeld e Markus Heinrichs, da Universidade
de Zurique, baseou-se noutros estudos que identificavam a ocitocina como um
regulador neuronal do comportamento, tendo em conta as funções que
desempenha nas interacções sociais positivas. O objectivo dos
investigadores era ir ao encontro da origem neurológica de uma das emoções
mais importantes nas relações sociais: a confiança.

"A confiança é transversal às relações em sociedade. Estudos recentes
indicam que a confiança é crucial no sucesso político, social e económico.
Mas pouco se sabe sobre a origem biológica da confiança entre os humanos.
Tentámos mostrar que a ocitocina, um neuropéptido que tem uma importância
crucial nas relações sociais entre mamíferos não-humanos, aumenta a
confiança nas relações entre humanos", diz a equipa.

Os cientistas propuseram uma espécie de jogo de investimento a um grupo de
voluntários.

O grupo foi dividido em investidores e gestores desse investimento. Metade
dos participantes recebeu ocitocina sob a forma de um spray nasal. Os
investidores recebiam então unidades monetárias que deveriam passar para as
mãos do gestor do investimento, cuja identidade desconheciam. Cada
investimento era triplicado.

O objectivo do jogo era medir a confiança do investidor no seu gestor, no
sentido de avaliar quanto do investimento o gestor devolveria ao
investidor.

Os investidores que receberam ocitocina faziam investimentos mais altos e
tendiam a confiar mais nos seus parceiros. "A ocitocina aumentou a
confiança dos investidores. Os que receberam o spray nasal investiram mais
do que os investidores que apenas receberam placebos. Os indivíduos que
receberam a ocitocina ultrapassavam melhor que os outros o medo de serem
traídos", concluíram os cientistas.

Num comentário a acompanhar o artigo, o neurologista português António
Damásio, investigador da Universidade do Iowa, nos Estados Unidos, afirma
que o mais importante do estudo não é o facto destes voluntários terem
aumentado a sua capacidade de confiar após inalarem a ocitocina.

Sem perigo de abuso pelos políticos

O que o estudo vem provar é que a ocitocina, existindo naturalmente no
nosso cérebro, actua nas nossas relações sociais normalmente. E avança com
outra pista: "Os autores abrem a possibilidade de investigar certas
patologias em que a nossa confiança fica afectada, como no autismo, ou em
casos em que é anormalmente exagerada. Certas patologias que afectam a
amígdala, fazem com que os indivíduos em causa se aproximem de estranhos de
modo inesperado, por exemplo", diz o autor.

António Damásio, cuja área de investigação é a de apurar a base biológica
das emoções, aproveita ainda para sossegar quem pensa que este estudo pode
ser aproveitado para servir causas menos duvidosas: "Alguns podem ficar
preocupados com a possibilidade de alguns políticos começarem a pulverizar
multidões com ocitocina durante as campanhas eleitorais. Mas de facto o
mar-keting político já é sábio em activar os nossos mecanismos biológicos
no sentido de atrair a confiança alheia, através de estimulação natural da
produção destas hormonas. Para além de tudo isto, a equipa é responsável
por dar um grande passo rumo ao conhecimento dos mecanismos biológicos de
escolha."