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PENSANTES

Outros pensamentos, ideias e palavras que nos fazem pensar...

sexta-feira, maio 27, 2016

# Partilha das tarefas domésticas é importante base para aumentar a natalidade

[Ver online - Tem gráfico]
http://observador.pt/opiniao/a-familia-tradicional-e-inimiga-da-natalidade/

A família tradicional é inimiga da natalidade

Luís Aguiar-Conraria 25/5/2016, 7:48372

Nos países desenvolvidos, tarefas domésticas partilhadas são
essenciais para a natalidade, pelo que, se não tivermos como ideal o
México ou a Turquia, as políticas devem promover a igualdade.

Há poucas semanas, o CDS anunciou um conjunto de medidas legislativas
que tinham como objectivo promover a natalidade em Portugal.
Actualmente, o Índice Sintético de Fecundidade (número médio de
crianças por mulher) em Portugal ronda os 1,3, quando, para assegurar
a reposição de gerações, deveria rondar os 2,1. Ou seja, este debate é
urgente e, portanto, a discussão é bem-vinda. Os parabéns são devidos
a Assunção Cristas.

Ontem tive a oportunidade de participar num debate promovido pela
Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS), em que tentámos responder
a esta pergunta: quem decide quantos filhos ter, o homem ou a mulher?
A resposta que eu dei é simples e parte de uma premissa simples. Para
se fazer um filho são necessários dois: um homem e uma mulher. Se
faltar a vontade de um, exceptuando acidentes de percurso, não há
bebé. Portanto, quer a mulher quer o homem têm poder de veto. Numa
relação a dois, se um quiser ter um filho e ou outro quiser três
filhos, o resultado final não será a média das vontades mas sim a
vontade mínima, ou seja, um.

Partindo desta premissa, torna-se óbvio que se queremos desenhar
políticas para aumentar a natalidade temos de saber se é o homem ou a
mulher quem, em regra, não deseja ter mais filhos e porquê. Só assim
podemos actuar sobre as causas. Matthias Doepke e Fabian Kindermann
(professores de Economia na Northwestern University e na Universität
Bonn) concluíram que, em regra, são as mulheres que não desejam mais
filhos. E o motivo é simples, porque a maioria do trabalho doméstico
recai sobre elas. Numa altura em que as mulheres têm cada vez mais
ambições profissionais, terem de ser elas a arcar com o trabalho que
os filhos dão tolhe-lhes a vontade.

O trabalho destes economistas não incluía Portugal. Mas uma das
conclusões de um estudo coordenado por Maria Filomena Mendes para a
FFMS concluía que, em Portugal, um dos determinantes mais importantes
na decisão de ter um segundo filho é, precisamente, o papel do pai na
educação e crescimento do primeiro filho. Quanto mais prestável for o
pai, mais vontade tem a mãe de ter uma segunda criança.

Fiz este gráfico usando dados da OCDE sobre a divisão de tarefas
domésticas. Como se pode ler, Portugal é o terceiro país mais
desequilibrado, com as mulheres a perderem quase quatro vezes mais
tempo do que os homens nestas tarefas. Não surpreendentemente,
Portugal é o país com o índice de fecundidade mais baixo. Diga-se que
Coreia, Japão — os únicos com desigualdade superior à nossa — e Itália
— semelhante à nossa — têm índices de fecundidade praticamente iguais
aos nossos. Já os países com natalidade mais elevada, como França ou a
Noruega, são muito mais igualitários.

Ou seja, nos países desenvolvidos, tarefas domésticas partilhadas são
essenciais para a natalidade, pelo que, se não tivermos como ideal o
México ou a Turquia — tão desiguais como nós, mas com fecundidade
bastante superior —, as políticas devem promover a igualdade. Petições
como a que há uns meses chegou à Assembleia da República, visando o
alargamento da licença de maternidade (sem o correspondente aumento
para a paternidade), são tiros nos pés. É evidente que há tarefas que
não podem ser partilhadas, como a gravidez ou o parto. E é
perfeitamente compreensível que seja a mulher a beneficiar da licença
de parentalidade nas primeiras semanas de pós-parto (até para a mãe
recuperar fisicamente). Mas, daí para a frente, quanto mais paritário
melhor.

Para muitos, a ideia de ter os homens a tomar conta das crianças é
assustadora, mas não há motivos para isso. Por exemplo, Ankita
Patnaik, na sua tese de doutoramento em Economia (Cornell University),
estudou os efeitos de uma reforma à licença de parentalidade que
ocorreu no Quebec, Canadá, em 2006. Essa política tinha como objectivo
explícito fazer com que os homens passassem mais tempo em casa com os
bebés. Para tal criaram um programa com o nome fofinho de "5 semanas
só para os papás" (5 'daddy-only' weeks). O Quebec tornou-se na única
região do Canadá na qual os pais beneficiavam de uma licença de
paternidade que era um direito individual e intransferível. Tornou-se
um laboratório perfeito para testar os efeitos destas políticas,
ficando as outras regiões servir de grupo de controlo. E quais foram
os resultados?

Os homens gostaram e passaram a querer estar mais tempo com as crias.
As crianças também gostam e também ganham: há vários estudos que
comprovam que a criança beneficia de um pai presente. Mas Ankita
Patnaik chegou a mais duas conclusões interessantes. Em primeiro
lugar, a longo prazo, os homens passaram a cooperar mais nas tarefas
domésticas, Em segundo, e como seria de esperar face aos resultados de
Doepke e Kindermann, descritos acima, a taxa de fecundidade aumentou.

Conclusão, se à emancipação laboral feminina corresponder uma
emancipação familiar masculina, todos ganham: as mulheres, os homens,
as crianças e a natalidade.

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quarta-feira, maio 25, 2016

# Economy for the common good

https://www.youtube.com/watch?v=dsO-b0_r-5Y

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# Frase do dia

«A santidade tem tão pouco a ver com a perfeição que é o seu oposto
absoluto. A perfeição é a irmã mais nova mimada da morte. A santidade
é o gosto forte pela vida tal como é – uma capacidade infantil de
alegrar-se com aquilo que é, sem pedir nada mais»

Christian Bobin

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segunda-feira, maio 23, 2016

# Não quero ser viral

21 Maio 2016987
Hugo Gonçalves
http://observador.pt/especiais/nao-quero-ser-viral/

Uma velhinha no jardim que ofereceu comida ao cão, uma fotografia
tirada com o telemóvel, um post "inocente" no facebook. Até que tudo
ficou fora de controlo, como conta aqui o Hugo Gonçalves.

Primeiro ato: partir a Internet

Devia ser apenas um desabafo e um pedido de ajuda no Facebook. O texto
que publiquei no meu perfil dizia: "Era para ser uma foto divertida: a
velhinha simpática que ofereceu sopa à minha cadela. Mas depois
sentei-me e perguntei-lhe o nome. (Ela disse:) 'Chamo-me Otília, tenho
81 anos, a minha filha pôs-me na rua e roubou-me 16 mil euros, era o
dinheiro que poupei ao longo de toda a vida. Vou buscar comida à Santa
Casa e durmo num quarto, mas o dono do apartamento trata-me mal. Tenho
de estar o dia todo na rua, só lá vou dormir. Trabalhei 40 anos numa
clínica veterinária em Campo de Ourique, gosto muito de animais. Agora
não tenho nada'. As lágrimas caíam e caíam. Não me pediu nada, dei-lhe
a mão durante toda a conversa, algum dinheiro no fim, talvez para
mitigar a súbita impotência, e perguntei se ela podia arranjar outro
quarto. 'Só posso gastar 150 euros por mês'. Estou a pedir ajuda no
meu bairro e combinei encontrar-me amanhã com ela, se souberem de
algum sítio onde ela possa ficar, um abrigo, um quarto, por favor
avisem".

Em poucas horas este encontro disseminou-se pelas redes sociais. Meio
milhão de visualizações do post com a fotografia da dona Otília,
dezenas de milhares de partilhas, centenas de mensagens, de pedidos de
amizade e de comentários – uma torrente de informação que chegava até
do estrangeiro e que, apesar das boas intenções, transformava um
encontro entre duas pessoas, num jardim, em algo hiperbolizado, fora
de controlo, tão diferente da minha experiência desse dia. Nos
comentários havia já quem desconfiasse da história, assegurando uma
burla, ou quem desejasse a punição da filha na praça pública –
enforcamento foi uma das sugestões. As mensagens não paravam de
chegar, ofertas de dinheiro, mobília, roupa, números de telefone de
instituições. A confusão e desinformação era tal que várias pessoas se
ofereceram para adotar a minha cadela julgando que estava abandonada.

Tudo porque eu cedera ao impulso contemporâneo de documentar mais um
momento no meu dia e colocá-lo na rede, invertendo assim as
prioridades do real e do virtual – primeiro puxara do telefone para
fazer uma foto da dona Otília a dar sopa à cadela, só depois é que me
sentei a seu lado e lhe perguntei o nome.

A dona Otília não chorava um choro transtornado. Era antes como se o
desfecho da sua história fosse a ordem natural das coisas que já não
têm conserto. Fiz-lhe várias perguntas: onde estava a dormir, se tinha
ido à polícia, como a poderia ajudar? Depois de combinarmos um
encontro para o dia seguinte, fui falar com algumas pessoas do bairro,
donas de estabelecimentos comerciais, de forma a conseguir refeições e
um quarto. Chegado a casa, foi difícil concentrar-me. Para resolver o
mal-estar, coloquei o tal post no Facebook como quem toma um
comprimido para a dor de cabeça. Depois, voltei ao trabalho e estive
várias horas desligado. Quando regressei, tornara-me viral.

As inúmeras solicitações via Internet levaram-me a ler e a responder a
centenas de mensagens, procurando ali informação que pudesse ser útil,
mas começaram também a causar-me uma sensação de asfixia, ansiedade e
invasão, que se agravou ao ser contactado para aparecer em programas
de TV e artigos de jornal ao lado da dona Otília – uma dessas
jornalistas dizia, como se preparasse um safari: "Onde é que ela está,
para irmos lá filmá-la?" A determinada altura, nos comentários, alguém
tinha oferecido uma casa e dezenas de pessoas celebravam, como um dado
adquirido, que a dona Otília já teria onde ficar, ainda que eu não
soubesse sequer se, no dia seguinte, iria encontrá-la.

Só por volta da meia-noite larguei as mensagens e os comentários,
apaguei todos os aparelhos de casa, tentei desconectar o cérebro. Sem
grande efeito. O fluxo da minha consciência parecia uma máquina de
pipocas, rebentando balões de ideias e imagens e tarefas a executar.
Se era tudo por uma boa causa, afinal, porque me sentia eu tão
desconfortável no olho do furacão viral?

Segundo ato: o cão de Pavlov

Tento ter uma relação parcimoniosa e higiénica com as redes sociais e
o uso da tecnologia – nem sempre consigo. Já escrevi coisas que não
devia no Facebook, já me desejaram morrer de cancro por causa de uma
crónica sobre Fátima, já me apeteceu desligar tudo e ficar numa bolha
de silêncio, imune a polémicas, trocas de argumentos e fotografias de
pratos de comida.

Para alguém que se diz libertário, tenho de reconhecer que me incomodo
demasiado se almoço numa mesa em que os comensais estão agarrados aos
telefones ou se vejo alguém a fotografar um cappuccinocomo se fosse
uma flor julgada extinta. Desespero com os zumbis nos passeios e a
atravessar a rua, de cabeça baixa e com os olhos vidrados nos seus
telefones. A lista de pequenos distúrbios é longa. Mas o que mais me
impressiona é ver os condutores de carros em andamento a enviar
mensagens de texto – por ser algo tão contraintuitivo à nossa
programação genética para a sobrevivência. Somos mamíferos cujo
cérebro está constantemente a produzir correlações e inferências sobre
o mundo em função de nos mantermos intactos – não vás para aquele lado
da savana que há leões –, mas hoje parece que não conseguimos perceber
que podemos matar-nos e matar alguém, desviando o olhar da estrada, só
para informar os amigos no Whatsapp de que vamos comer um temaki.

Não sou um Velho do Restelo relativamente à tecnologia da comunicação,
mas sei que, tal como o anel da trilogia de Tolkien, ela pode ser
usada para o bem e para o mal, exatamente como as drogas, que ajudaram
os Beatles a fazer o White Album, mas que mataram o meu tio.

Cada vez mais acredito que a necessidade de saber tudo, a toda a hora,
sobre qualquer assunto, ou de estar contactável em qualquer momento, é
uma forma de subjugação, uma urgência que, tantas vezes, não passa de
ansiedade de status e do permanente tagarelar do cérebro sempre
insatisfeito: responde ao email, atualiza o perfil, isto dá um bom
post, manda a foto, vê quantas estrelas tem o restaurante, abre o
Tinder, dispara um super like. Uma cabeça permanentemente ocupada com
informação é apenas um processador de dados – é preciso parar, não
fazer nada, para que as experiências se possam costurar no tecido
emocional, para que haja clarividência em vez de uma enxurrada de
factoides, fotografias ou notícias. O tempo que precisamos para
entender aquilo que vivemos não está em sintonia com a velocidade do
tempo em que vivemos. Há demasiadas coisas – uma amizade, um
casamento, escrever um bom livro – que não se compadecem com o
imediatismo e a tirania da satisfação imediata que tomou conta de nós
com o mesmo poder com que a campainha de Pavlov fazia salivar o cão da
experiência.

Foi um comediante que me ajudou a perceber algo mais, que me
incomodava, na história viral da dona Otília. Num dos seus
espetáculos, Anthony Jeselnik disse que aqueles que, em momentos de
catástrofe, escrevem no seu perfil "os meus pensamentos e orações
estão com as vítimas", não estão, de facto, a fazer nada. "Fucking
nothing. Less then nothing." E prossegue: "Não dão o seu tempo, a sua
compaixão, o seu dinheiro. Tudo o que estão a dizer é 'não se esqueçam
de mim hoje'".

A verdade é que, por causa do meu post, me senti um pouco como essas
pessoas – uma fraude. Mais ainda quando gente desconhecida começou a
escrever-me mensagens e a deixar comentários do género "beijos no
coração", "és um herói", "devia haver mais gente como tu". Dei-me
conta da distância que, em tão pouco tempo, se criara entre aquilo que
realmente estava a acontecer e o que sucedia no universo distorcido e
exagerado da Internet. A experiência já não era minha, nem autêntica,
passara a ser algo com vida própria. Eu apenas tinha falado com uma
mulher no jardim, uns quantos minutos, dizendo-lhe que voltaria no dia
seguinte. No entanto, para muitos que não me conheciam nem do
elétrico, eu estava a um passo da beatificação.

Há um risco em fazer das nossas vidas uma espécie de feed contínuo e
estilizadamente editado. Porque nessa projeção construímos um reality
show de nós mesmos e, confiantes de que somos pessoas informadas, cuja
opinião é indispensável e que temos de estar sempre presentes, criamos
a ilusão de uma relevância e de um envolvimento com o mundo e com os
outros que realmente não temos.

Também eu sou, tenho de admitir, parte fraca da realidade que crítico:
fiz a foto, escrevi o post no Facebook, partilhei um momento da minha
vida que poderia ser perfeitamente só meu. Mas, mesmo sendo parte
fraca, incomoda-me a ideia de ser condicionado e controlado por algo
exterior a mim. A tecnologia existe para nos servir e não o contrário.
Os smartphones não deveriam criar tantos stupid users. Além disso,
expus-me e, mais grave, expus uma pessoa sem autorização (a sua cara,
a sua história). Não me agradou receber pedidos de entrevistas e
ofertas de dinheiro para a dona Otília, em ser subitamente o porta-voz
oficial dos próximos capítulos da novela online. Mas as mensagens
continuavam a chegar, e todos queriam saber o que aconteceria depois.

E se, no dia seguinte, ela não aparecesse para o nosso encontro? Não
seria eu uma fraude ainda maior?

Terceiro ato: a vida como ela é

Desci a rua em direção ao jardim antes da hora combinada, tentando
perceber se alguma das silhuetas era a dona Otília. Passara parte da
manhã a fazer telefonemas, conversara com uma funcionária da Santa
Casa, convocara amigos para contribuírem para uma conta na farmácia e
outra no café que serve refeições. Tentava combater com pragmatismo a
suspeita de ser tão artificial como uma pastilha do gelado Epá. E,
para meu alívio, lá estava ela, noutro banco de jardim, comendo
novamente de uma caixa de plástico, pronta a oferecer fios de
esparguete à minha cadela.

No dia seguinte, a dona Otília, que tem um problema de equilíbrio e
usa uma bengala, caiu e fomos ao hospital. Como não tenho carro, falei
com a Sónia Buisel, da associação Bora Lá, que ajuda sem-abrigo, e que
nos levou ao São José. Além de uns hematomas e uma dor no pulso,
estava tudo bem. Almocei com a dona Otília no domingo de Páscoa e em
outras ocasiões. Contou-me dos seus tempos na Mouraria, quando
trabalhava na Sociedade Guilherme Cossoul e se dava com os artistas da
época, como o Raúl Solnado ou o Fernando Tordo. Mostrou-me fotos a
preto-e-branco de quando era nova, outras, a cores, das viagens a
Israel, onde gostou de tudo menos de ver os camelos ao sol, "que
tinham de carregar turistas o dia inteiro". Viajou com uma igreja
evangélica, que fazia pacotes turísticos baratos, e perguntei-lhe se
era religiosa. Suspendendo os talheres sobre o prato, respondeu:
"Quando tinha dezasseis anos fui confessar-me ao padre da aldeia, que
me perguntou se eu tinha namorado e se já fazia 'coisas'. Queria que
eu fosse com ele à sacristia para me explicar essas 'coisas'. Nunca
mais quis saber de padres".

Falei muitas vezes com ela ao telefone e encontrámo-nos no jardim com
frequência. Esse contacto e descoberta foram colmatando a falha
gigante que se criara entre a realidade e o mundo viral. Aquilo que eu
sentia era outra vez resultado de estar com uma pessoa frente a
frente, ouvindo as modulações na sua voz, abraçando-a na despedida.
Tristeza, compaixão, esperança, desalento, cansaço, riso, enfim, ir
reiterando a certeza de que a vida não se experimenta nem se resolve
com a mesma rapidez e facilidade com que se partilha um post nas redes
sociais.

Mas não havia maneira de arranjarmos um quarto, a mulher da Santa
Casa, que me ligara durante o furor da história na Internet, deixou de
atender e responder a mensagens, o dono do apartamento onde estava a
dona Otília revelava-se cada vez mais intolerante, gritava com ela,
não a deixava cozinhar ou ter comida no frigorífico, tinha estipulado
um só duche por semana. Houve momentos em que ela se mostrou
desesperada, que chorou, que fez birras ou se irritou comigo porque
não lhe atendi o telefone. Perdeu peso, dormia mal, os calmantes não
faziam efeito. Mais do que tudo sentia-se sem ninguém, uma solidão
denunciada nos telefonemas a meio do dia para saber como eu estava.
Nem sempre havia um botão de like. Nem tudo se alinhava com um emoji
sorridente. Houve vezes em que eu não podia atender, ou não me
apetecia. Senti a preguiça e o desconforto de ter uma pessoa a entrar
na minha vida, mais uma demanda, uma coisa a tratar. Houve vezes que
não sabia o lhe que dizer, não tinha uma solução, não me senti à
altura.

"Pode-se tirar aquilo da Internet?", disse-me ela, depois de uma amiga
lhe ter mostrado o post no Facebook.

Como é que eu lhe explicaria que, com dezenas de milhares de
partilhas, ela ficaria no ciberespaço para sempre?

"Mas quer que eu tire?"

"Não, quero que fique, porque me andam a ligar lá de cima (da parte da
filha) a ameaçar-me, querem que tire aquilo, mas eu quero que fique".

Por várias vezes dei-me conta de que, apesar da resiliência, ela tinha
vergonha de receber ajuda, tal como percebi que quem precisa de uma
mão não deixa de ter direito às suas vontades. A dona Otília não quis
ir para um lar porque perdia a liberdade de entrar e sair quando lhe
apetecesse. Não foi para uma casa no Ribatejo, com direito a empregada
e muitos cães – cortesia de uma senhora abastada e residente em Paris
–, porque há décadas que Lisboa é a sua morada e gosta de passear pela
cidade. Por causa dessas escolhas teve de continuar a viver num
esconso sem porta, no apartamento de um casal que gritava. Há, nessa
necessidade de manter vontades e princípios, mesmo em momentos em que
dependemos de outros, uma dignidade essencial para a preservação
daquilo que não se pode destruir em nós. E isso só me fez admirá-la.

Os fenómenos virais são breves e intensos, um desajustamento temporal,
uma histeria, uma sobredose de boas intenções ou de ódio, a emoção
reativa, uma espécie de praga de gafanhotos sempre em movimento, a
"Psicologia das multidões", de Gustave Le Bon, versão 4G, em que a
multidão nunca está junta, só precisa de um interface pessoal. Mas por
mais assombrosas que sejam milhares de partilhas de um post, suspeito
que nunca poderão substituir o que senti na primeira conversa que tive
com a dona Otília.

Um dos significados da palavra virtual? "Aquilo que não existe".

Tal como surgiu, o interesse pela dona Otília também desapareceu
depressa, não sem que várias pessoas (algumas através das redes
sociais) a tenham ajudado. Uma funcionária da Santa Casa procurou um
quarto. Um piloto da TAP pagou os medicamentos, uma escritora e uma
blogger a conta do café.

Em todos este tempo – quase dois meses – um ministro demitiu-se por
ameaçar bofetadas a cronistas no Facebook. Vi amigos brasileiros
bloquearem outros durante a polémica do impeachment presidencial. No
funeral do Nicolau Breyner havia quem fizesse selfies e as colocasse
nas redes sociais. E, entretanto, alheia a tudo isso, a dona Otília ia
tentando arranjar um quarto, passava as manhãs e as tardes na rua,
teve consultas médicas e experimentou feijoada brasileira pela
primeira vez – confessou-se desiludida, disse gostar mais da
transmontana. Tendo sido viral, a dona Otília não faz a mínima ideia
do que é ser viral.

Durante anos, seguramente armado em esperto, citei Tom Wolfe com o
propósito de exaltar a mística em redor dos escritores: "A realidade é
um bom sítio para visitar, mas eu não moraria lá". Hoje, no entanto,
entendo que se a ficção é um refúgio onde vamos para fazer sentido das
coisas, é na realidade que as vivemos. Não há volta a dar. Ter milhões
de seguidores no Twitter pode ser uma carreira ou até uma façanha. Mas
sei que não quero ser viral.

Esta manhã ligou-me a dona Otília. Eu não tinha respondido ainda à sua
chamada do dia anterior. Comecei a desculpar-me. Ela interrompeu-me.

"Era só para dizer que já estou no novo quarto, foi a doutora da Santa
Casa que me arranjou. Só posso ficar vinte dias, mas gostava muito que
viesse cá vê-lo, dar-me a sua opinião".

Não sou ingénuo para decretar um final feliz. A vida só permite
interlúdios. Mas esta, ao menos, é a vida real, insuficiente e plena.
A vida como ela é.

Hugo Gonçalves é escritor.

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quarta-feira, maio 04, 2016

# Carreiras com elevada probabilidade de desaparecer nos próximos 20 anos

[Ver online, tem tabela com empregos com maior probabilidade de obsolescência]

http://www.theguardian.com/sustainable-business/2016/may/03/young-australians-face-revolutionary-obstacles-to-score-job-security


Young Australians face revolutionary obstacles to score job security

Experts say more than half of young Australians are studying for
occupations that are likely to be wiped out in a global, automated
workplace

Studies show that young people take longer to find employment and are
being trained in the wrong skills.

Max Opray

Tuesday 3 May 2016 01.21 BST

Bianca Tuck has worked for only three months in her entire life.

Granted, she's only 20 years old, but the young Australian from
Brisbane is already despondent about her prospects after spending most
of her teenage years hunting for employment. She has not just missed
out on the disposable income a job would have provided, but also the
formative life experiences of entry-level work: development of skills
and self-confidence, exposure to professional environments, and even
the friendships forged with colleagues facing the same challenges.

"For the last three years I've been doing nothing, looking for work on
and off and got a few job interviews, but never hearing back," she
says.

Can this job initiative help young people with autism beat unemployment?

"It's been really demotivating, so I've just started studying aged
care in the hope of guaranteeing a job."

There's another reason behind that choice: "I lost my pop and didn't
like the care he got before he went."

The decision to study aged care might have been motivated by personal
circumstances, but luckily for Tuck she's selected one of the few
sectors predicted to offer plenty of opportunity to young people with
the right training – unlike many of her fellow millennials entering
the job market.

According to a recently completed three-part series of reports
undertaken by the Foundation for Young Australians (FYA), a
significant proportion of young people are ill-equipped for the
challenges of the 21st-century marketplace. The New Work Order series
found that employment is being fundamentally transformed by three
forces: automation, globalisation and collaboration.

Report: A smart move – future proofing Australia's workforce by
growing skills in science, technology, engineering and math (STEM)
(2015) by Price Waterhouse Coopers

The series found 60% of Australian students are studying or training
for occupations which will be mostly wiped out by automation in the
next 10 to 15 years, as ever more sophisticated robotics and computers
phase out the need for human workers.

FYA's chief executive, Jan Owen, says her organisation found that
young people take an average 4.7 years to find full-time work after
completing their education, and one in three young Australians are
unemployed or underemployed.

She puts much of that down to a combination of a diminishing number of
entry-level opportunities and of millennials being trained in the
wrong skills.

"Automation is affecting young people disproportionately as
entry-level jobs are becoming automated the fastest," she says.

Even those roles that won't be automated will be profoundly changed.

"For instance in retail, you might not need checkout people any more
but there might be a lot more customer service," she says.

"The skills will relate to how to produce and design and market what
you are selling, creating communities of customer bases."

And globalisation brings more challenges.

"Young Australians are going to need to compete in ways other
generations didn't need to, not just with the person sitting next to
you in class, but competing against 750 million young people in the
Asia-Pacific region who are educated, hungry and ambitious," she says.

New technology platforms are enabling more and more jobs to be
undertaken from remote locations including legal, IT, design,
architecture and business services.

Then there is what FYA calls "collaboration", referring to the move
towards self-employment, portfolio-based flexible working
arrangements, casual jobs and other non-traditional employment setups,
often without the security of insurance, paid leave and the minimum
wage.

The New Work Order series identified so-called "enterprise skills"
(typically generic and transferable) as key for young people starting
out, based on analysis of 4.2m job postings requiring zero to five
years of work experience from 2012 to 2015 in Australia, collected
from more than 6,000 sources. Over those three years, the proportion
of job advertisements that demand digital literacy has increased by
222%, critical thinking by 158%, creativity by 65%, presentation
skills by 25% and team work by 19%.

Compared with early-career jobs that do not list these skills, jobs
that sought enterprise skills paid significantly more, with
presentation skills netting an additional $8,853 a year, digital
literacy an additional $8,648, problem solving an additional $7,745,
financial literacy an additional $5,224 and creativity an additional
$3,129.

Young people are growing ever more depressed. Is modern life to blame?

Despite the lucrative rewards on offer, in recent international
testing by the Programme for International Student Assessment,
Australian 15-year-olds were found wanting in most enterprise skills.
Roughly one in three students had low problem-solving skills, one in
four had low digital literacy and three in 10 struggled with financial
literacy.

Owen says that might well have something to do with the lack of
understanding among teachers about what the in-demand skills are.

"It is not just young people themselves, but whether these things are
being taught," she says.

"We need to embed these enterprise skills. They need to be part of the
DNA of the next generation, put into the curriculum every which way
over and over.

"There are jobs in digital that literally didn't exist five to 10
years ago and will soon be obsolete.

"One thing that was interesting was we looked at all the traditional
jobs that nobody ever thought would need tech skills, and almost
everyone – veterinarians, accountants, caring industries – all
required them."

It is not all down to education. Owen says governments need to work
out how to set up and adapt superannuation and tax systems to better
suit the rising number of non-traditional work arrangements.

"What we absolutely don't want to see is young people disadvantaged by
creating their own path," she says.

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# Metade dos adolescentes é viciada em smartphones

http://observador.pt/2016/05/03/metade-dos-adolescentes-viciada-smartphones/

3/5/2016, 23:15

50% dos adolescentes são viciados nos smartphones e quase 60% dos pais
confessam que os filhos são demasiado agarrados à tecnologia, segundo
um estudo da Common Sense Media.

Metade dos adolescentes é viciada nos smartphones e quase 60% dos pais
confessam que os filhos são demasiados agarrados à tecnologia,segundo
um estudo da Common Sense Media. O estudo foi feito com base em mais
de 1.200 pais e jovens para tentar perceber o nível de dependência dos
telemóveis numa família e como os aparelhos influenciam as relações
entre pais e filhos.

Cerca de dois terços dos pais consideram que os filhos gastam
demasiado tempo com os telemóveis, e mais de metade dos filhos
concorda com esse dado, enquanto 56% dos pais confessaram usar o
telemóvel enquanto conduzem. O trabalho indica que 72% dos jovens
sentem necessidade de responder imediatamente a mensagens ou a
notificações vindas de umsmartphone.

No que toca às relações familiares, 85% dos pais sente que o uso dos
telefones não influenciou as relações que têm com os filhos, sendo que
89% dos filhos sentem o mesmo.

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